Texto baseado no relato de acontecimentos, mas contextualizado a partir do conhecimento do jornalista sobre o tema; pode incluir interpretações do jornalista sobre os fatos.
"A algum de vocês que me teme: Tenha medo" - As lutas de June Jordan
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"Eu não caminharei mais suavemente para trás/ a algum de vocês que me teme: Tenha medo./ Eu pretendo dar razões para seus ataques nervosos/ e tiques no rosto/ Eu não caminharei educadamente nas calçadas, não mais [...]/ Eu pretendo florescer sangrento em uma tarde/ cercado pelos meus camaradas cantando/ vingança terrível e impiedosa/ acelerando/ ritmos [...]/ Eu devo me tornar a ação do meu destino".
Dedicado ao também poeta Agostinho Neto, revolucionário e primeiro presidente angolano, "Devo Me Tornar uma Ameaça aos Meus Inimigos" nos dá uma ideia da solidariedade e da resiliência com disposição à luta que encontramos nos versos de June Jordan. Nascida em Nova York em 1936, filha de jamaicanos, me parece que a poeta ainda está para ser descoberta pelos leitores brasileiros, apesar de "Poema Sobre os Meus Direitos", um de seus maiores momentos, já ter circulado por um lugar ou outro.
Tanto "Poema Sobre os Meus Direitos" quanto "Devo Me Tornar uma Ameaça aos Meus Inimigos" integram "Somente Nossos Corações Vão Debater Bravamente", antologia organizada pelo escritor Christoph Keller e publicada no Brasil pela Figura de Linguagem (a tradução é de Fernanda Bastos). Pequena joia, o volume bilíngue reúne 30 poemas pescados de diferentes momentos da carreira de June. O mais antigo é de 1971, enquanto o mais recente é de 2001, um ano antes da morte da escritora.
Nos versos de June, com frequência colocada ao lado de gigantes como Toni Morrison e Audre Lorde, encontramos muito das causas defendidas pela escritora em sua vida. A revolta com o racismo e a batalha pela universalização dos direitos humanos estão entranhadas em sua poesia. Feminista e bissexual, também foi voz potente pelo espaço para a comunidade LGBTQI+, pela liberdade sexual e pelos direitos das mulheres.
Chama a atenção em "Somente Nossos Corações Vão Debater Bravamente" a forma como June estende o seu olhar companheiro a comunidades e povos massacrados em diferentes cantos do planeta. Conflitos na África do Sul, Guatemala, Palestina ("eu nasci uma mulher negra/ e agora/ eu me tornei uma palestina") e Iraque ganham atenção, como nesse trecho de "O Bombardeio de Bagdá":
"nós bombardeamos o Iraque nós bombardeamos Bagdá/ nós bombardeamos o Museu Nacional/ nós bombardeamos escolas nós bombardeamos com/ ataque aéreo/ abrigos nós bombardeamos água nós bombardeamos/ eletricidade nós bombardeamos hospitais nós/ bombardeamos ruas nós bombardeamos rodovias/ nós bombardeamos tudo que se move/ nós bombardeamos tudo que não se move nós/ bombardeamos Bagdá/ uma cidade de 5,5 milhões de seres humanos"
Os versos de June Jordan anseiam por mudanças drásticas, falam sobre revolução e valorizam o inconformismo. Lamentam atrocidades, mas também se indignam e não recusam o necessário enfrentamento. "nós somos aqueles por quem nós estávamos esperando", escreve em certo momento. Em outro, versa: "Sou uma mulher à procura de sua selvageria/ mesmo que tenha sido domada".
Afinal, a quem interessa uma pessoa domada?
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