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Roberto Bolaño: um autor fundamental para esses tempos de assombrações
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Na 103ª edição do podcast da Página Cinco:
- Papo com Schneider Carpeggiani sobre a obra do autor chileno Roberto Bolaño.
- "Memória de Mim", de Teresa Cárdenas (Figura de Linguagem), e "Atalho", de Carlos Canhameiro (Mireveja), nos lançamentos.
Destaques do papo com Schneider:
Assombrados pela ditadura
A minha geração não estava lá durante as ditaduras militares da América Latina, uma coisa que une a todos nós. Mas temos as memórias dos nossos pais, das pessoas que viveram aquilo. E nós somos assombrados pelas memórias dessa ditadura militar. Sempre escutávamos falar daquilo, mas não sabíamos direito o que tinha acontecido. Vivíamos num território fantasma. Bolaño, como autor, ajudou a liberar e a melhor fazer a gente lidar com esse território assombrado que as ditaduras da América Latina deixaram pra gente.
Bolaño e o boom
Ele não negava a geração do boom, mas negociava com ele. Havia uma relação de interesse, mas também de patricídio em relação ao cânone. Quando me deparei, pensei: aqui estou vendo alguém que está fazendo algo de fato novo, que está dando frescor para a literatura latino-americana e fazendo compreender o que é viver num país que teve uma ditadura durante décadas, que é uma assombração.
Política dos afetos
Roberto Bolaño me ajudou a ler a própria literatura brasileira, sobretudo dos anos 80 e 90, que eu achava - e muita gente também acha - que não tinha muito a ver com a ditadura. Ele me despertou para uma outra perspectiva. Me fez pensar a ideia de política também numa política dos afetos. Lendo Roberto Bolaño, compreendi melhor a forma como, por exemplo, Caio Fernando Abreu ou Ana Cristina Cesar trataram as ditaduras nas obras deles.
Bolañista
Quem lê Bolaño se coloca até, tem uma expressão que acho maravilhosa, como bolañista. Já vi na Espanha pessoas colocando bottons: "Yo soy un bolañista". Bolaño passa uma relação da vida com a literatura que acaba atraindo leitores muito jovens.
Biografia bolaniana
Houve uma preparação durante a carreira inteira dele para se criar um mito. Ele não apenas escreveu uma das grandes obras do final do século 20, mas também criou uma das grandes personas do final do século 20. Ele mentia muito nas entrevistas. Ninguém sabe muito bem o que aconteceu com ele no final dos anos 70. A biografia dele é uma obra bolaniana...
Ele criou essa mítica de um homem que se sabia enfermo, que de alguma forma teria sobrevivido e se exilado da ditadura de Pinochet e que estava preparando uma grande obra porque sabia que a morte era iminente. Ele criou um personagem. E é curioso porque esse alter ego dele que está em alguns livros, que é o Arturo Belano, é quase Arthur Rimbaud, que é justamente uma das primeiras grandes imagens e ideias que a gente tem do jovem rebelde. Ou seja, tudo foi muito construído.
Túmulos vazios e "2666"
Mais do que nos outros, nesse livro há muitos personagens que aparecem e simplesmente somem, desaparecem... E a gente mora no continente que nas últimas décadas muita gente simplesmente desapareceu. O túmulo vazio é um dos signos de ser latino-americano.
Fascínio pela dúvida
Um traço que percebo dessa literatura contemporânea, e Bolaño fazia isso muito bem, é que ela pegou a ideia do crime e tirou aquele caráter funcional que o romance policial clássico tinha. Você lê Edgar Allan Poe para saber quem matou. Você lia para saber as coisas. Nessa literatura contemporânea, não importa saber quem matou, mas saber se o crime aconteceu mesmo... O fascínio pela dúvida tomou o lugar do desejo de descobrir quem é o assassino.
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