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OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Quem foi o homem que eternizou o Brasil como 'país do futuro'?

O escritor Stefan Zweig. - Arquivo
O escritor Stefan Zweig. Imagem: Arquivo

Colunista do UOL

23/02/2022 04h00

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Logo após o carnaval de 1942, no dia 23 de fevereiro, Stefan Zweig e Lotte, sua esposa, foram encontrados mortos na casa onde moravam em Petrópolis, na serra fluminense. Copos com resquícios de uma substância tóxica e mensagens endereçadas aos amigos confirmavam o que Stefan registrou num carta: deixavam a vida por vontade própria. Uma mistura de desolação pessoal com descrença na humanidade seria o motivo do suicídio. Judeu austríaco, as perseguições e assassinatos nazistas fizeram com que Zweig, escritor já consagrado, deixasse a Europa e viesse para o Brasil, terra por onde já havia perambulado em outras duas oportunidades.

Intelectual com uma obra vastíssima, coisa de mais de cinquenta volumes, Zweig criou ficções, dedicou-se a estudos biográficos, escreveu longos ensaios e pensou a literatura de gigantes como Tolstói, Balzac e Dostoiévski. Sobre este, aliás, a Nova Fronteira lançou há pouco "Dostoiévski: Vida e Obra", mais um recorte da produção de Zweig que pipoca em nossas livrarias. Outra casa que há pouco também investiu num título do autor é a Fósforo, responsável por "O Livro do Xadrez", novela simpática, talvez esquemática demais, nada imprescindível, escrita pelo austríaco pouco antes de sua morte.

Interessante notar que nem sempre as atenções de Zweig se concentraram em figuras históricas de óbvio destaque. Exemplo disso é "Joseph Fouché - Retrato de um Homem Político" (Zahar), biografia com forte pegada ensaística sobre uma figura que, ao longo da carreira, soube avaliar muito bem para onde os ventos sopravam para, mesmo à sombra, conquistar espaço na política e manter uma dose considerável de poder em suas mãos.

Francês que viveu entre 1759 e 1820, Fouché passou por monarquias, governos revolucionários e pela era napoleônica. Napoleão, aliás, que o apelidou de "o traidor perfeito". O "carniceiro de Lyon" foi outra alcunha nada lisonjeira que o biografado ganhou ainda em vida. Se tivesse que indicar um livro de Zweig para alguém, seria "Joseph Fouché", como um leitor mais ligeiro já pode ter percebido.

Curioso: há anos a produção do autor vem sendo retrabalhada por diversas editoras e, ainda assim, ninguém parece dar muita bola para o seu título mais lembrado pelos leitores brasileiros. Durante o processo para deixar a Europa em guerra e vir para o cá, o escritor lançou um ensaio no qual mostrava deslumbramento pelo Brasil. Há quem defina o trabalho como uma "ode" ao país, outros o apontam como uma mera propaganda para agradar a ditadura de Getúlio Vargas.

Zweig batizou aquele livro de "Brasil, Um País do Futuro". No entanto, meandros da produção editorial fizeram com que chegasse em nosso mercado com um título levemente diferente: "Brasil, País do Futuro". A obra consagraria o epíteto com toque de maldição que nos acompanha até hoje. Seguimos nos questionando se um dia esse tal futuro próspero pintará e se manterá por mais de década.

Por falar no Brasil atual, o que pensaria Zweig ao ver, décadas depois de seu livro, reaparecer brasileiro defendendo a existência de partido nazista enquanto a Petrópolis que escolheu para os últimos meses da vida se desfaz sob água, lama e descaso?

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