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Frustrações, ardil e desprezo marcam peça teatral de Gabriel García Márquez
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"Nada se parece tanto com o inferno como um casamento feliz!"
É com ares de "Anna Karenina", de Tolstói, que se inicia "Diatribe de Amor Contra um Homem Sentado", a única peça de teatro escrita pelo colombiano Gabriel García Márquez. Publicado originalmente em 1987, o texto foi encenado pela primeira vez em 1988, em Buenos Aires, chegou aos palcos da Colômbia uma década depois e rendeu uma turnê por 12 cidades espanholas em 2004.
Até então inédita no Brasil, a peça acaba de ganhar uma edição em livro publicada pela Record, com tradução de Ivone Benedetti. Ambientada numa sufocante cidade do Caribe, com trinta e cinco graus à sombra e noventa por centro de umidade relativa do ar, nela acompanhamos o monólogo de Graciela, que está na iminência de completar 25 anos de casada.
A série de frustrações, reclamações, lamentos e desforras disparada pela mulher é dirigida ao seu marido, um homem calado, prostrado numa poltrona e que sequer se digna a tirar os olhos do jornal do dia anterior. É um "manequim", como diz o texto.
"Enquanto isso você se nega a responder, se nega a discutir os problemas como gente decente, se nega a olhar na minha cara", queixa-se Graciela na véspera da festa de bodas de prata, programada para ter uma opulência que contrastaria com a miséria da intimidade de ambos. De fato, não é apenas a mulher, mas também o leitor que se sente incomodado com a mudez do sujeito.
Ponderando o óbvio - que temos acesso ao esgoto matrimonial apenas pela visão, pela experiência, pelas fantasias de Graciela -, encontramos um casal em ruínas. O amor e a felicidade ficaram no passado, o que rende à peça flertes com o clichê da idealização de uma vida humilde.
Longe de ser um Gabo indispensável, "Diatribe de Amor Contra um Homem Sentado" tem seus bons momentos, resvala em questões sociais e cresce do meio para o final, quando Graciela decide mostrar para o marido que também tem o seu ardil, que nem sempre esteve esperando mansamente pelo homem que há tempos lhe despreza. Ao cabo, o silêncio do sujeito apenas comprova esse desprezo.
No ano em que o Nobel de Literatura recebido por Gabo completa 40 anos, a Record promete publicar outras duas novidades relacionadas ao autor de "Cem Anos de Solidão", ambas entrelaçando o colombiano a outro Nobel deste canto do mundo. "Duas Solidões: Um Diálogo Sobre o Romance na América Latina" trará uma conversa sobre literatura latino-americana que rolou entre García Márquez e Mario Vargas Llosa em 1967. Já "García Márquez: História de um Deicídio", de 1971, é uma versão da tese de doutorado de Vargas Llosa sobre a obra de Gabo.
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