Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.
Piadas recicladas e o 'pior país para se viver': as memórias de José Simão
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"Mário de Andrade dizia que é preciso exclamar para que a vida não nos canse. Então, viva o ponto de exclamação!
Não é só o que eu escrevo. Mas como escrevo!
E como escrevo! Passei minha vida escrevendo!
Sobrou pra mim!
É o destino!"
Está aí uma das principais chaves para o leitor sacar se gostará ou não de "Definitivamente, Simão!", livro de memórias afetivas e esparsas do jornalista e humorista José Simão. O estilo frenético e efusivo que o colunista apresenta em seus textos na Folha de São Paulo e participações na rádio Band News FM é o mesmo empregado ao longo de todo o volume lançado pela Objetiva. Com frases brevíssimas, diretas e uso adoidado das exclamações, Simão enfileira bordões e tiradas muitas vezes recicladas, numa busca pela graça que acaba por se tornar forçada, cansativa, repetitiva.
"Este livro é a minha História do Brasil! Sou apaixonado pelo Brasil. O Brasil me emociona. O Brasil está presente em todos os capítulos", escreve o autor. De fato, um tanto da história brasileira das últimas décadas está presente no emaranhado de suas lembranças. Muito da cena cultural do país aparece em "Definitivamente, Simão!" entre novelas, reality shows e acenos a autores como Clarice Lispector e Jorge Amado.
Ao repassar aventuras sexuais ("Uma noite a polícia me pegou transando num automóvel e levou o meu relógio! Polícia gosta de roubar!") e escrever sobre a sua homossexualidade, Simão chega a um dos momentos mais tocantes da obra. Após a morte de Antonio Salomão, então seu companheiro, sequer conseguiu ser reconhecido como um familiar do finado no hospital. "'O senhor é parente?'/ 'Não!'/ Naquele tempo nem se falava em casamento homoafetivo!/ 'Então não pode ter acesso, só parente.'/ Eu não era nada. A gente não era nada porque a sociedade da época decidiu que a gente não era nada!".
Outra morte marcante que cruza a trajetória de Simão é a do jornalista Ricardo Boechat, seu antigo companheiro de rádio. "Quando o Boechat morreu, eu chorei por dez dias. De saudades da voz dele!/ Aliás, as pessoas não morrem, ficam encantadas. Guimarães Rosa", registra o autor que diz ter se tornado conhecido do grande público graças ao trabalho com o microfone em mãos. "A Folha me trouxe prestígio. A rádio me trouxe popularidade".
A cobertura de Copas do Mundo e passeios por lugares como Egito, Turquia, Jordânia, a cafona Dubai, Portugal, Itália e China rendem bons momentos num ponto em que o livro passa a ter um tom quase que de narrativa de viagem.
E há, claro, muitas doses de política nas memórias de José Simão. Criado numa família de esquerda, o jornalista viu seu pai, médico próximo a sindicatos, ser preso durante a ditadura civil-militar instaurada em 1964. Já o primo Eder Sader deixou o Brasil e foi viver na Argentina, onde terminou assassinado pelos trogloditas fardados do país vizinho, vítima dos macabros voos da morte.
"O ano em que o fascismo saiu do armário gritando contra a corrupção vestido de camisa verde amarela da seleção da CBF", escreve a respeito de protestos em 2015. A série de governantes esculhambados por Simão é grande, mas é a nossa derrocada nos últimos anos e a consequente eleição do atual presidente, responsável por transformar "o Brasil no pior país para se viver", que rendem as maiores bordoadas da obra. O autor é eloquente ao tratar de Jair Bolsonaro:
"Bolsonaro!
A desgraça!
O genocida!
O coisa-ruim!
O cão!
O insepulto!
O miliciano psicopata!
O Brasil passou a ser o pior país para se viver. Essa façanha ele conseguiu!
Quando um povo tá fudido e perdido se agarra ao primeiro salvador que aparece.
Quando o Rio estava perdido e fudido, aplaudiu o surgimento das milícias. A dinâmica é a mesma!
A família Bolsonaro é paranoica, sexualmente mal resolvida e sofre de complexo de inferioridade!"
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