Livros para conhecer melhor a Palestina
Em "Detalhe Menor" (Todavia, tradução de Safa Jubran), a palestina Adania Shibli constrói um romance dividido em duas partes. Na primeira, militares israelenses capturam, barbarizam e matam uma garota árabe enquanto cumpriam missões para demarcar a fronteira com o Egito no final dos anos 1940. Na segunda metade, uma pesquisadora decide, décadas depois, investigar aquele crime. Cruzará, então, territórios nos quais é vista como constante ameaça.
Escrevi sobre "Detalhe Menor" aqui. O livro, uma representação literária das ameaças que há décadas amedrontam palestinos, esteve em evidência após a Feira de Frankfurt cancelar uma homenagem que faria à autora. Desconvidaram por conta dos massacres que acontecem há mais de mês no Oriente Médio. O gesto fez com que muitos leitores voltassem suas atenções para o romance de Adania.
O catálogo da editora Tabla também merece ser olhado com calma por quem está interessado no assunto. São eles que publicam Mahmud Darwich e Ghassan Kanafani. Autor de obras como "Da Presença da Ausência" e "Memória Para o Esquecimento", Darwich é apresentado como o poeta nacional da Palestina (sempre olho com desconfiança para essas pechas).
Kanafani, por sua vez, foi jornalista e ativista político, um dos fundadores da Frente Popular para a Libertação da Palestina. Deixou títulos como "Homens ao Sol" e "Retorno a Haifa" antes de ser morto em 1972 pelo serviço secreto de Israel.
Um recorte mais contemporâneo da produção literária daquela região do mundo está em "Gaza, Terra da Poesia", também da Tabla, antologia que reúne 17 poetas com menos de 30 anos nascidos em Gaza, epicentro dos horrores que temos visto nas últimas semanas. A importância histórica da poesia por um lado e, por outro, a forte presença de reflexões e denúncias sobre os conflitos com Israel são pontos recorrentes quando lemos a respeito da literatura produzida na Palestina.
Vale também observarmos o que é feito por autores profundamente ligados ao lugar, ainda que não necessariamente sejam nascidos ou vivam na Palestina - a diáspora se transformou numa das marcas daquele povo, lembremos. O libanês Elias Khoury, por exemplo, registra costumes e retrata situações dramáticas vividas pelos palestinos em obras como "Porta do Sol" (Record) e "Meu Nome é Adam" (também da Tabla).
A estadunidense Etaf Rum, por sua vez, é filha de imigrantes palestinos. O seu "Eu Não Quero Contar Uma História", romance sobre diversas formas de opressão contra mulheres, acaba de chegar ao Brasil pela Primavera Editorial. Etaf busca em Darwich, o tal poeta nacional, a epígrafe de seu livro: "Todos os caminhos levam a você, mesmo aqueles que eu tomei para te esquecer".
Buscar pelo caminho outrora esquecido é o que Lina Meruane faz em "Tornar-se Palestina" (Relicário), sobre o qual escrevi há alguns anos. A família de Lina, uma das escritoras mais importantes do Chile, tem raízes palestinas.
É por conta desse passado que a autora decide viajar para a Faixa de Gaza. Por meio do relato pessoal de Lina aliado a experiências vividas por pessoas que cruzam seu caminho que o leitor tem uma ideia de como é sobreviver (e tentar viver) numa área acossada, isolada do resto do mundo, cheia de opressões e arbitrariedades. Um território comumente apontado como uma prisão a céu aberto.
Movimento semelhante fez o maltês Joe Sacco, referência no jornalismo em quadrinhos. Publicada em 1993, "Palestina" (Veneta) ainda é uma HQ capaz de informar e, ao mesmo tempo, impressionar o leitor. Já em "Notas Sobre Gaza" (Quadrinhos na Cia), Sacco resgata dois episódios da década de 1950 que, como no caso de Adania Shibli e o seu "Detalhe Menor", ajudam a compreender a série de violências que seguem a se desdobrar e ganham novos episódios enquanto escrevo esta coluna.
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