Mercado editorial: para onde caminha um setor que fatura cada vez menos?
Na semana passada, entre os dias de uma boa edição d'A Feira do Livro, chegou mais uma notícia desanimadora para esse nosso mundo. Segundo a série histórica da Pesquisa Produção e Vendas do Setor Editorial Brasileiro, feita pela Nielsen BookData a pedido da Câmara Brasileira do Livro e do Sindicato Nacional dos Editores de Livros, desde 2006 o setor teve um encolhimento de 43% no faturamento real das vendas ao mercado.
Eventos como o que acabamos de ter em São Paulo nascem, alguns se mantêm firmes e dão um ânimo ao reunir gente pra caramba que realmente se importa com os livros. Quem esteve no Pacaembu por esses dias voltou para casa com a sensação de que, poxa, ainda podemos viver num lugar em que espaços públicos são bem aproveitados com bons papos, literatura e clima de camaradagem.
Espasmos de bons momento recebidos com festa excessiva alimentam a falsa impressão de que esse grupo poderia aumentar. Penso nos crescimentos episódicos da pandemia, nos picos de vendas impulsionados por eventos específicos (como bienais) ou nos números expressivos que sucedem períodos de pindaíbas severas.
É quando olhamos para o que aconteceu com o setor ao longo de quase duas décadas que compreendemos como o buraco do mercado editorial não para de aumentar. Só de 2022 para 2023, o faturamento do meio encolheu 5% em termos reais se observadas as vendas ao mercado.
Reparando nas minúcias da pesquisa, um detalhe representa bem as transformações do país nessas quase duas décadas. Os setores de Obras Gerais e Didáticos mínguam. O faturamento de livros científicos, técnicos e profissionais desaba. Os Religiosos, por sua vez, crescem e mostram resiliência.
Já deve ter gente por aí pensando em mudar de ramo, orientar seu corpo editorial para de dedicar a versões da Bíblia feitas para crentes de diferentes vertentes do catolicismo. Hagiografias e livros de lideranças religiosas que misturem autoajuda com trololó de coach também podem ser uma boa.
Os números da pesquisa convergem com o que ouço de editores, sobretudo aqueles à frente de pequenas editoras, em conversas informais. Desalento com o presente e preocupação ou desânimo com o futuro são sentimentos recorrentes. Se as coisas seguirem como estão, a tendência é que o mercado se concentre cada vez mais nas mãos de alguns poucos já muito poderosos.
Dá pra mudar? Enquanto há vida há chance, mas é um trabalho difícil e que leva tempo. Passa, não tem jeito, pela formação de leitores. Cairia bem apostar em discursos que falem mais sobre o prazer do que a respeito da relevância da leitura. Pessoas fazem as coisas porque gostam, não porque são importantes.
Também é uma boa cobrar programas de governo que extrapolem a compra e se preocupem, de fato, com a mediação de leitura e a circulação dos livros. Pensar no aprimoramento constante daqueles que já leem talvez seja a melhor forma de garantir que jamais abandonarão a prática. Almejar leitores plurais e nunca dogmáticos é fundamental. Não se enganar considerando leitor quem só lê uma página ou outra a cada três meses.
São caminhos para que, quem sabe um dia, encontros como A Feira do Livro, como a Bienal que em breve virá, sejam festas lastreadas por um meio editorial saudável.
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