Página Cinco

Página Cinco

Siga nas redes
Só para assinantesAssine UOL
Opinião

'Avalovara': nova vida para um dos grandes livros da literatura brasileira

A história de um escritor jovem com trajetória marcada pela relação com um trio de mulheres: Cecília, Anneliese Roos e uma terceira denominada apenas por um símbolo que lembra alguém com os braços para cima.

Abel é o nome desse sujeito, que almeja dominar a criação artística, se entender com o amor e alcançar o autoconhecimento. Sua história se divide entre o Recife, onde nasceu, São Paulo e Europa. E não está contada de forma convencional, longe disso.

É a partir da figura de uma espiral sob um quadrado que abriga um palíndromo ("Sator arepo tenet opera rotas") que se estrutura o romance protagonizado por Abel.

Pelas páginas de "Avalovara", tido como o principal livro do pernambucano Osman Lins, a forma e as camadas interpretativas não escancaradas pelo texto são aspectos fundamentais.

"Avalovara" foi publicado originalmente em 1973. Com o centenário de nascimento de Osman, celebrado no dia 5 de julho, pipocaram bons leitores recordando a qualidade do romance, um dos mais importantes da literatura brasileira na segunda metade do século passado.

O autor pode até ser lembrado com mais frequência por trabalhos como "Lisbela e o Prisioneiro", levado para o cinema, mas é "Avalovara" que faz de Osman um artista cultuado.

Numa brincadeira cruzando datas que poderiam aproximar Osman e Franz Kafka (o brasileiro nasceu no mesmo ano em que o autor de "A Metamorfose" se foi), o escritor e crítico literário Braulio Tavares nos dá uma ideia de como Lins era obsessivo na hora de pensar os romances da fase mais experimental de sua carreira.

Osman, o "profeta da ordem estrutural", é um escritor "para quem um romance deveria ter a mesma complexidade de simetrias e equilíbrios que encontramos numa catedral gótica, num vitral, num bordado, num relógio de pêndulo, num observatório astronômico", considera Braulio num artigo publicado no Mundo Fantasmo.

Outro leitor que estimo e que recentemente escreveu sobre a obra-prima de Osman foi Pedro Fernandes, professor e doutor em estudos da linguagem.

Continua após a publicidade

Num artigo para o Letras In.Verso e Re.Verso, o crítico sublinhou que "um romance não é apenas o que conta. É também como se conta" para colocar "Avalovara" dentre os "pontos mais elevados" de nossa literatura, um romance que se lê pela metade caso o leitor não se atente à forma, a como ele está construído.

Cruzar com muita gente boa falando bem de Osman e ressaltando as virtudes literárias de sua obra só me faz pensar que preciso dar um jeito de ler "Avalovara" o quanto antes.

Não que seja tarefa fácil. E nem digo isso pelo tempo escasso para tantas leituras ou pelos desafios que o texto carrega. É tarefa árdua encontrar um volume do romance em sebos ou livrarias.

Achar um que caiba no bolso, digo. Há tempos sem novas edições, raros exemplares do livro são vendidos por algumas centenas de reais na Estante Virtual. Mas o clássico que teve a Companhia das Letras como última casa está para ganhar uma nova chance entre os leitores.

A Pinard, que vem fazendo um trabalho admirável de garimpar grandes livros um tanto esquecidos ou pouco valorizados entre os brasileiros, trabalha numa nova edição de "Avalovara".

A aposta é num financiamento coletivo para fazer com que um dos livros mais relevantes de nossa literatura nas últimas décadas possa, enfim, voltar a circular.

Continua após a publicidade

Assine a Newsletter da Página Cinco no Substack.

Você pode me acompanhar também pelas redes sociais: Bluesky, Instagram, YouTube e Spotify.

Opinião

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL

Deixe seu comentário

Só para assinantes