Natal: reinaugurar a sua vida e começar novo caderno
Minha tradição natalina: voltar aos versos de João Cabral de Melo Neto, mais especificamente ao poema "Cartão de Natal". Poxa, Rodrigo, mas todo ano a mesma coisa?
Claro que não, minha amiga, meu amigo. Não que os versos se alterem. Nós que mudamos de um ano para o outro. E se mudamos, nosso olhar para um poema também pode mudar.
Eu, por exemplo, sempre me fixei na parte final "e possa enfim o ferro/ comer a ferrugem, /o sim comer o não". Na leitura de 2024 foi diferente. O que mais me tocou deste vez foi o início: pensar nos homens, diante da tradição, reinaugurando suas vidas e começando novo caderno.
João Cabral de Melo Neto publicou "Cartão de Natal" no livro "Museu de Tudo", de 1975. A versão que trago aqui está em "Poesia Completa", volumaço organizado pelo crítico literário Antonio Carlos Secchin e Edneia R. Ribeiro. Saiu em 2020 pela Alfaguara e reúne a obra do autor de "Morte e Vida Severina".
Boas festas a todos!
E fiquem com os versos de Melo Neto:
Cartão de Natal
Pois que reinaugurando essa criança
pensam os homens
reinaugurar a sua vida
e começar novo caderno,
fresco como o pão do dia;
pois que nestes dias a aventura
parece em ponto de voo, e parece
que vão enfim poder
explodir suas sementes:
que desta vez não perca esse caderno
sua atração núbil para o dente;
que o entusiasmo conserve vivas
suas molas,
e possa enfim o ferro
comer a ferrugem,
o sim comer o não.
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