Você tem ideia de quantas pessoas são necessárias para um livro existir?
Ainda repasso o que aconteceu neste ano. Semana passada revi alguns pontos do mercado editorial e do meio literário. Sigo na mesma praia, mas agora resgato um bom momento pessoal.
Tive a alegria de ver "A Biblioteca no Fim do Túnel - Um Leitor em Seu Tempo" aparecer entre os dez finalistas do Prêmio Jabuti. O livro que lancei em 2023 pela Arquipélago concorreu na categoria Crônicas, vencida por Rosa Freire D'Aguiar com "Sempre Paris" (Companhia das Letras), que também levou o Livro do Ano.
Quem olha para uma obra qualquer e vê na capa o nome do autor talvez não faça ideia da quantidade de gente que, de alguma forma, está envolvida nesse trabalho. Começo indo para longe, bem longe.
Muitas pessoas foram responsáveis por colocar esse autor no rumo dos livros e da literatura. O meu caso chega a ser um clichê: pai leitor, mãe leitora e professores que me fizeram valorizar o brilho de grandes histórias, independentemente das bobagens que eu respondia nas provas.
Nesse plano mais longínquo, ainda distante do livro em si, há as referências óbvias, nem tão óbvias, inimagináveis e as jamais assumidas que forjam nosso pensamento, nossas ideias. Penso aqui nos incontáveis autores que cruzam nossas vidas, nas muitas pessoas com quem conversamos sobre livros.
Vou além. Nas muitas pessoas com quem conversamos sobre qualquer outro assunto. Tudo pode, de algum modo, nos influenciar, seja por inspiração ou contraposição. Saber o que não queremos da vida é fundamental.
Um ou outro pode até jurar originalidade plena, mas mente. Todo mundo que escreve sempre carrega consigo aquilo que leu, viu, consumiu, discutiu, pensou, sublimou? Viveu. É um diálogo eterno e permanente, faça isso de forma consciente e explícita ou não.
Olhando para a trajetória de "A Biblioteca no Fim do Túnel", a coisa começa a ficar mais próxima quando penso na Bel, mulher que admiro pela inteligência, pelo rigor intelectual e pela retidão moral. É uma pessoa bela em todas as acepções da palavra.
Esposa e parceira de vida, é com a Bel que formo um lar tranquilo, acolhedor e seguro. Fernando, o cão, e Belinha, sempre, também têm papel nesse sentido. Sem essa casa e essa família o trabalho seria outro.
"A Biblioteca no Fim do Túnel" é uma reunião de textos que escrevi ao longo de dez anos. Editores, curadores, coordenadores e afins que me contrataram nesse período e possibilitaram que eu crescesse profissionalmente e me mantivesse financeiramente têm seu quinhão. Não trabalho sentado em herança, todo mês preciso me preocupar com as contas.
Daí chego ao livro propriamente dito. Uma vez escrito, só falta todo o demais. E é muita coisa, muita gente, pode acreditar.
Um editor —Tito Montenegro— topa publicar. No dia a dia, a preparadora —a Débora Sander— trabalha com afinco no texto. No meio do caminho, uma designer —Paula Hentges— elabora o projeto gráfico enquanto uma artista —Luísa Fantinel— cria a ilustração que dá cara ao livro.
Outra profissional —Thaís Leidens— começa a pensar em ações para divulgar a novidade. Em algum momento a revisão terá que ser feita (Alec Lisboa). E a editora só pode apostar na obra porque é uma empresa e tem alguém para cuidar da parte administrativa (Miréia Almeida).
Ficou decidido que seriam convidadas pessoas para escrever a orelha —Maria Esther Maciel— e o posfácio —Diego Assis—, outros que estão no time que admiro e agradeço. Sem eles, "A Biblioteca no Fim do Túnel" não existiria. Não da forma como chegou às livrarias, ao menos.
Certamente deixo alguém de fora e já antecipo o pedido de desculpas. A relação, no entanto, ainda não acabou. Tem o pessoal da gráfica, da distribuidora, das livrarias?
E até aqui pensei no livro fechado, sem cumprir o seu destino, sem passar pela etapa fundamental para existir de verdade, extrapole a mera materialidade física. Há ainda o elo mais importante de toda essa cadeia: o leitor.
Um livro fechado, sem leitor, não é absolutamente nada. Por outro lado, se desdobra sempre que alcança outra pessoa, ganha novas possibilidades de diálogos, interpretações e finalidades a cada novo leitor. O que faz um autor são seus leitores, como escrevi outro dia.
Diga o que disser até o mais recluso dos escritores, o mais confiante de sua originalidade e independência no mundo, ninguém faz nada sozinho.
Um livro sempre é um trabalho coletivo.
Outra versão desse texto foi publicada na newsletter da coluna Página Cinco no começo de novembro.
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