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Pedro Antunes

Elton John não queria lançar um disco de lockdown, mas foi isso que ele fez

Elton John: como um garoto novamente - Gregg Kemp / Divulgação | Montagem: Pedro Antunes
Elton John: como um garoto novamente Imagem: Gregg Kemp / Divulgação | Montagem: Pedro Antunes

Colunista do UOL

18/10/2021 04h00

Elton John falava tão rápido que respondia a uma pergunta antes mesmo de dar boas-vindas a todos - e ter, de fato, alguma questão direcionada a ele.

Na tela do computador, em uma chamada de vídeo, o artista de 74 anos tinha olhinhos que brilhavam de excitação como um jovem que estava descobrindo o mundo. Talvez ele tenha, na verdade, descoberto a tão buscada fonte da juventude. Ainda que seja de forma metafórica.

"Tenho 74 anos e eu ainda estou aprendendo com outros músicos. Esse é o maior presente que você pode receber: nunca parar de aprender e melhorar como músico. Você não pode desligar e dizer que já fez de tudo. Para mim, isso é a morte. Estou mais animado com a música hoje do que eu já estive."

Talvez seja impossível saber quantas voltar ao redor do planeta deu Elton John ao longo das inúmeras turnês feitas por ele desde que estreou no mercado fonográfico há quase 50 anos. Mas 2020 surpreendeu o veterano.

E ele mal conseguia se conter para nos contar mais sobre isso.

Era 21 de setembro, 17h25 no Reino Unido (13h25, no Brasil) - um pouco depois, já que a coletiva teve um atraso de uns 10 minutos - e Elton falava diretamente do Metropolis Studios, em Londres, um estúdio que se vangloria de ser um dos melhores do mundo.

Falava com gente do mundo todo. Se você já usou o Zoom para alguma reunião a trabalho está familiarizado com a ferramenta de chamadas por vídeo. Mas, neste caso, só Elton e o apresentador estava na tela, ninguém teria o microfone ligado além deles.

O chat, portanto, bombava de perguntas, das bizarras às surpreendentemente inteligentes, das locais (o que acha de tal artista do país X) às filosóficas. Iriam escolher algumas e fazer ao longo dos magros 15 minutos de papo. Enviei quatro, mas [spoiler] não fui escolhido.

Era tanta vontade de contar a história do novo álbum que, no fim das contas, poucas foram as perguntas realmente escolhidas - e vieram de jornalistas russos e italianos.

O foco, principalmente, é que justamente graças a uma ferramenta como aquela, o Zoom, Elton John foi capaz de lançar um álbum quando ele não imaginava fazê-lo.

"Não pretendia fazer um disco durante o lockdown em 2020, foi um acidente", confessa ele. Os planos de Elton John incluíam uma turnê de despedida e uma aposentadoria tranquila.

Mas o culpado de tudo ter início foi o músico norte-americano Charlie Puth, quase vizinho de Elton em Los Angeles ("quatro portas de distância", ele diz), que o convidou para gravar "After All".

A partir daí nasceu "The Lockdown Sessions", um álbum em que Elton John reúne as músicas gravadas ao longo deste período de reclusão usado para conter o avanço do coronavírus.

O álbum, a ser lançado em 22 de outubro, terá canções criadas com artistas das mais distintas gerações, de Miley Cyrus e Lil Nas X a Eddie Vedder, Stevie Wonder e Stevie Nicks. Um disco criado via Zoom estava sendo detalhado igualmente via Zoom.

Quase todas as músicas são conhecidas e já foram lançadas, como "Cold Heart", a pérola com Dua Lipa que chegou recentemente ao topo das paradas do Reino Unido.

Abaixo, a tracklist do disco.

  1. "Cold Heart (PNAU Remix)", Elton John & Dua Lipa
  2. "Always Love You", Elton John, Young Thug & Nicki Minaj
  3. "Learn To Fly", Surfaces feat. Elton John
  4. "After All", Elton John & Charlie Puth
  5. "Chosen Family", Rina Sawayama & Elton John
  6. "The Pink Phanton", Gorillaz feat. Elton John
  7. "It's a Sin (Global Reach Mix), Elton John & Years & Years
  8. "Nothing Else Matters" (Miley Cyrus feat. WATT, Elton John, Yo-Yo Ma, Robert Trujillo & Chad Smith)
  9. "Orbit", Elton John & SG Lewis
  10. "Simple Things", Elton John & Brandi Carlile
  11. "Beauty in the Bones", Jimmie Allen & Elton John
  12. "One of Me", Lil Nas X feat. Elton John
  13. "E-Ticket", Elton John & Eddie Vedde
  14. "Finish Line", Elton John & Stevie Wonder
  15. "Stolen Car", Elton John & Stevie Nicks
  16. "I'm Not Gonna Miss You", Glen Campbell & Elton John

Para participar da entrevista, era necessário assinar um documento e concordar em só veicular o conteúdo da entrevista a partir do dia 18 de outubro. Portanto, cá está o conteúdo completo da entrevista com Elton John está abaixo, dividido por tópicos.

No papo, Elton John falou sobre o novo álbum, como ele se abastece de novidades musicais, de música queer e o que o inspira a fazer música até hoje.

'Foi um acidente'

"Eu não planejava fazer um disco durante o lockdown. Foi um acidente. E começou em março de 2020, quando encontrei com Charlie Pluth em Los Angeles, em um restaurante e descobri que ele morava a quatro portas de distância. Falou para eu ir lá e eu fui. E o resultado é uma das faixas que está no disco. No fim das contas, isso foi fantástico. Porque no dia seguinte, eu fui à casa do meu publisher musical, a três portas da minha, para trabalhar na música do Surfaces. Foi a primeira ve que fiz uma música por Zoom. Eles estavam no Texas e eu fiquei no piano.

Depois, quando voltei para a Inglaterra, Damon Albarn [também líder do Blur] me chamou para tocar com [a outra banda dele] o Gorillaz. A Rina Sawayama me chamou para tocar piano em "Chosing Family", depois acabei cantando também. Fiz a música do Metallica com a Miley Cyrus, com Ollie Alexander [do Years & Years], fiz a música do Glen Campbell, Lil Nas X.

De repente, percebi que tinha a jornada de um disco. Neste ano, levamos a Dua Lipa para jantar em Los Angeles e mostrei a música 'Cold Heart'. Ficamos amigos. E pedimos para ela ouvir a faixa na beira da piscina e depois que nos ligasse. Ela fez isso e ligou dizendo que queria fazer.

Sabe, isso foi seguindo. Voltei para Los Angeles, fiz a música com Brandi Carlile, com Stevie Wonder, com Stevie Nicks, com Eddie Vedder, terminei com o SG Lewis a faixa que havíamos começado, "Orbit". E "voilà", do nada, tinha um disco. Tudo culpa do Charlie Puth.

'Muitas amizades surgiram no processo'

Fiz uma versão de "It's a Sin" com Ollie Alexander [do Years & Years], no Brit Awards [de 2021]. É a música de uma série fantástica que trata da aids no Reino Unido nos anos 80 e eu amei. Os vocais que entraram nesta música do álbum são os mesmos daquela noite no Brits. Só refiz o piano e adicionei uma orquestra. É uma ótima música, uma das melhores dos Pet Shop Boys. No fim das contas, me tornei amigo desses artistas. Ollie, Brandi, Charlie Puth, Lil Nas X. Muitas amizades surgiram desse processo Amei fazer isso.

'Foi como fechar um ciclo'

Para tocar no disco de outra pessoa, você precisa entregar o que eles querem, o que mandam você fazer. No começo, eu era um músico de estúdio antes de me tornar Elton John. Quando fiz as músicas de Lil Nas X e Glen Campbell, eu estava exatamente no estúdio 2 de Abbey Road, no mesmo lugar em que, 54 anos atrás, eu estava gravando a música 'He Ain't Heavy, He's My Brother', do The Hollies. Eu sinto que encerrei um ciclo aqui. Estou amando o que estou fazendo, e é ótimo tocar músicas de outros álbuns.

'Gosto de oferecer a mão para um novo artista, como fizeram comigo'

Tenho há 6 anos um programa de rádio na Apple Music. E cultivei muitas amizades com a geração de jovens músicos e isso realmente me enche de energia. Adoro ouvir algo novo de Billie Eilish ou da Lorde. A Billie realmente me surpreendeu. Se eu gosto de um álbum de um artista novo, convido para o meu show. Ou eu ligo para eles, estejam na Austrália ou na Europa. Não importa. Pra mim, é importante oferecer uma mão e elogiar a autenticidade do que eles estão fazendo.

Quando eu fui para os Estados Unidos pela primeira vez, Neil Diamond, Beach Boys, Leon Russel, The Band, George Harrison, todos esses falaram comigo e fizeram isso por mim. Leon me levou para uma turnê. Me fizeram me sentir realmente feliz e gostaram da minha música. Tento fazer o mesmo com os jovens agora.

Futuro de Billie Eilish

Posso ajudar a dar exposição para algum artista, mas Billie Eilish cultivou o crescimento sozinha, da estreia ao que ela é hoje. É incrível ver uma pequena flor se transformando em uma árvore gigantesca.

'Às vezes posso ser Elton John demais'

"Eu nunca tinha gravado por Zoom e isso foi diferente. Mas a pessoa que está trabalhando com você precisa saber exatamente o que ela quer e falar que ela está pensando. Assim, fica tudo muito fácil. Se a pessoa é vaga e não sabe o que está fazendo. Por vezes, quando estou tocando, eu posso ser Elton John demais? E eles precisam falar para que diminua: 'Você está trabalhando no meu disco, não no seu' [risos]. É realmente interessante ver o que eles fazem e o que eu faria. Acabo tocando algo diferente. Na música do Metallica, me pediram para que eu começasse no piano e terminasse com ele também. Na versão original, são só guitarras. Era outra forma de olhar as coisas. Gosto quando alguém aponta a direção. É divertido. Nunca pensei em fazer um disco de lockdown, mas foi uma diversão.

'Admiro as pessoas que sabem o que estão fazendo'

Amo o trabalho de Rina Sawayama. Fiz uma entrevista no meu programa de rádio, fizemos fotos juntos para uma entrevista no New York Times. Quando fomos gravar "Chosen Family", ela me pediu para tocar piano, a princípio. Ela me dirigiu, depois me pediu para cantar. Admiro as pessoas que sabem o que estão fazendo. Ela tem um talento incrível. Todos estes artistas são incríveis. Eles sabem o que querem, têm ideias bem específicas. E é incrível ter isso desde cedo.

'Tenho 74 anos e sigo aprendendo com jovens músicos'

Damon Albarn é um jovem músico que está há algum tempo na ativa. E tem um espírito livre, assim como eu. Aprendi muito com ele, com Stevie Nicks, com Stevie Wonder. De Sam Lewis a Lil Nas X. Tenho 74 anos e eu ainda estou aprendendo com outros músicos. Esse é o maior presente que você pode receber: nunca parar de aprender e melhorar como músico. Você não pode desligar e dizer que já fez de tudo. Para mim, isso éa morte. Estou mais animado com a música hoje do que eu já estive.

'Na minha idade, ter uma nova excitação com a música mantém você seguindo em frente'

Amo o trabalho da Stevie Nicks há muito tempo, é uma das melhores vozes do rock and roll. Aliás, o Fleetwood Mac era uma banda realmente sortuda por ter duas das melhores vozes do gênero, Stevie e a Christine McVie. A Stevie estava na minha lista de desejos e foi ótimo trabalhar com pessoas que você conhece, mas com quem você nunca trabalhou antes. Na minha idade, ter uma nova excitação com a música é realmente importante. Isso mantém você seguindo em frente.

'Atualmente, estou mais interessado em tocar com os jovens'

Já me perguntaram a respeito de quem eu gostaria de trabalhar, mas tenho sorte o bastante para ter tocado com Bob Dylan, John Lennon, George Harrison, Leonard Cohen, Stevie Wonder, Ray Charles. Atualmente, estou mais interessado nos jovens. Conheço os melhores e trabalhei com a maior parte deles. Ainda quero fazer algo com Billie Eilish, mas prefiro dela ainda fazer o seu próprio caminho ainda.

'Quando pequeno, ouvia todo tipo de música em casa'

Nunca imaginei que faria uma faixa com Young Thug e Nicki Minaj, E eu fiz. Ou músicas com Lil Nas X. Até mesmo com Glen Campbell. A música com os Gorillaz é uma das minhas favoritas do disco. Eu amo todos os tipos de música porque ouvia todos os tipos de discos em casa quando pequeno, de Tom Jones a The Hollies.

'Amo ver esses artistas trabalhando. Eu não saberia por onde começar'

Me anima ver Young Thug fazendo um freestyle na cabine de gravação. Ele chegou, sentou e fez aquilo. Fiquei surpreendido. É importante ver essas pessoas trabalhando, porque elas fazem um tipo de música diferente de mim. Eu não saberia por onde começar. O Sam Lewis [SG Lewis], da música eletrônica, é exatamente a mesma coisa. Por isso quis trabalhar com eles. Dei a ele a minha primeira ideia e ele devolveu uma versão ainda muito parecia com o meu trabalho. Pedi pra ele destruir aquilo e fazer uma música dele.

'Nós [músicos queer] somos muitos e vão conseguir nos derrubar

Há muitos artistas queer talentosos por aí. Eles tem conseguido lançar discos. E eu acho que Lil Nas X está destruindo algumas barreiras. Inclusive entre a comunidade do hip-hop e a comunidade negra também. Temos inúmeros jovens artistas gays por aí. Um dos meus amigos, Oliver Sims, que é do The XX, acabou de gravar um álbum fantástico. Jake Wesley Rogers vai se tornar uma estrela enorme - se ainda não ouviu ele, faça isso. Tem o Perfume Genius, o Troye Sivan. A Arlo Parks. A St. Vincnt. Somos muitos e não fomos machucar ninguém. Existem pessoas queer criativas por aí e não vamos conseguir derrubar a gente porque isso é impossível.

'Nunca perco a chance de ir a uma loja de discos aonde quer que eu esteja'

Eu ainda compro meus CDs. Faço uma lista de álbuns que quero comprar. CDs, vinil. A Apple sempre me manda a lisa de lançamentos. São muitos por semana. Então, não falta opção. Minha família sempre comprou discos. Nunca perco a chance de ir a uma loja e comprar algo. Devo ter até discos repetidos. É tão excitante. Aonde quer que eu esteja, sempre vou a uma loja de discos. É a mesma animação que sentia quando tinha 4 ou 5 anos de idade.

'Esta foi uma das mais difíceis do disco'

'I'm Not Gonna Miss You' foi a última música que Glen Campbell fez. Eu comentei essa música e a família dele agradeceu por isso, por mencionar a faixa. Quando decidiram recriar o álbum, mwe chamaram para fazer exatamente esta música. Fiquei honrado é uma composição linda e de quebrar o coração sobre demência. E foi uma das mais difíceis do disco. Eu tinha que ficar com a mesma voz que ele. Sempre fui um grande fã de Glen, como guitarrista, como músico, como cantor. Ele poderia cantar qualquer música. Foi uma honra para mim, ma eu tinha que fazer justiça ao talento dele."

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