Como ter mais diversidade LGBTQIPNA+ na TV?
Junho é o mês do Orgulho LGBTQIPNA+ e a diversidade na televisão ainda caminha a passos lentos. Desde que Mateus Solano e Thiago Fragoso protagonizaram o primeiro beijo entre dois homens em "Amor à Vida" (2013), muitos avanços ocorreram, mas, com certa frequência, surgem rumores sobre o descarte de tramas românticas de personagens LGBTQIPNA+ para não afrontar a parcela mais conservadora da audiência, como foi o caso do casal Mara (Renata Gaspar) e Menah (Camilla Damião), de "Terra e Paixão", que só voltou a ter destaque após um desabafo público de Renata Gaspar sobre a invisibilidade de sua personagem no folhetim.
Para pensar maneiras de como tornar a diversidade mais efetiva na TV, falamos com profissionais LGBTQIPNA+ que dividiram suas reflexões e suas experiências sobre esse assunto.
Leonardo Miggiorin, ator
"Eu entrei na TV em 1999, aos 16 anos, e recebi uma diretriz de que ninguém poderia saber da minha sexualidade ou não teria mais oportunidades. Hoje, um adolescente que começa a trabalhar na TV tem a possibilidade de experimentar sua identidade, tem sua singularidade acolhida.
As minorias, com a internet, ganharam voz e isso modificou o mercado. Não é porque as empresas são generosas ou boazinhas que a diversidade aumentou. As empresas visam o lucro e a audiência. Virou interessante acolher e abrir portas para pessoas que não eram aceitas.
Eu vejo que a TV vem fazendo um serviço em relação aos temas de diversidade e combate ao preconceito. A TV permite que as pessoas tenham acesso a esse tipo de conteúdo sobre diversidade. Mas isso não pode ficar só na esfera da teledramaturgia, do entretenimento, do jornalismo.
Para a diversidade se tornar uma realidade, o que a gente precisa de educação, porque isso, sim, vai mudar a forma de receber esse tipo de conteúdo. Isso tem que seguir como uma política pública para dentro das escolas.
Continuo achando que o preconceito existe, pois os personagens destinados a essa diversidade, ainda são estereotipados. O preconceito no ambiente de trabalho é velado.
Você não sabe porque não é mais chamado para uma novela, mas, muitas vezes, é por conta do preconceito. Não consigo afirmar que não fui escolhido para um trabalho por conta da minha sexualidade, mas, de uma forma ou de outra, já não faço novelas há algum tempo."
Pedro Carvalho, ator
"É importante retratar a violência contra os LGBTQIPNA+ e todos os passos significativos que temos dado para garantir todos os direitos civis que os héteros têm, mas nossas histórias não podem girar apenas em torno desses temas.
Para ter mais diversidade na TV, é preciso ver casais homoafetivos, pessoas trans, pessoas não binárias, drag queens representadas na TV vivendo todo tipo de conflito e não apenas enfrentando preconceito e dificuldades."
Alice Marcone, atriz
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Quero receber"Tal qual a branquitude, a cisgeneridade e a heterossexualidade contaram todos os tipos de histórias, nós podemos contar todos os tipos de história e não só aquelas relacionadas a transgeneridade.
Na atuação, a gente tem a ideia de perfil como uma coisa muito determinante na possibilidade de uma atriz trabalhar. No meu caso, só vou ser testada para fazer personagens trans.
É como se um corpo trans não pudesse viver nenhuma outra história além de ser trans. É como se a gente não fosse humano, fosse apenas trans. Então, não sou chamada para ser uma dona de casa, uma vilã, uma bruxa.
Uma personagem trans pode viver qualquer conflito, mas o entendimento disso na discussão da representatividade e a aplicação disso na realidade do mercado ainda está muito distante. A gente precisa superar o identitarismo, superar essa redução da nossa existência em torno da nossa identidade de gênero.
Quando a gente bate na tecla do trans fake, que não se deveria chamar atores cis para fazer personagens trans, eu estou pontuando principalmente uma desigualdade de mercado. Pessoas trans não chamadas para fazer quaisquer personagens. Pessoas cis, sim. É essa desigualdade que a gente precisa superar."
Rafa Chalub, ator
"Uma das coisas mais importantes é que essa diversidade não seja só performática, que ela não esteja apenas na frente na TV e que não seja feita na intenção de apenas agradar, porque se não fizer as pessoas vão cancelar (as emissoras).
Essa representatividade precisa ser genuína e precisa ser feita por pessoas que entendem do assunto. Não adianta só contratar atores, atrizes que vão estar em frente das câmeras. Tem que contratar profissionais para produção, criação, direção e em todas as categorias possíveis, que vão agregar ao produto final e, naturalmente, a gente consegue ter essa diversidade mais forte."
Letticia Munniz, atriz e influencer
"No streaming, o caminho da diversidade está pavimentado, mas, na TV aberta, a gente enfrenta o desafio de quem vai consumir esse conteúdo, que é um público mais velho, com outra mentalidade.
Essas pessoas desejam ver diversidade LGBTQIPNA+? Isso vai repelir a audiência? A gente sabe que sim. O desafio é humanizar as histórias LGBTQIPNA+ e o grande acerto de "Terra e Paixão", com o romance de Ramiro e Kelvinho, foi a maneira que eles entregaram essa história.
Precisa existir uma estratégia para contar essas narrativas. Mas, para além disso, precisa de quantidade de LGBTQIPNA+ e que quantidade não seja apenas cota."
Bia Crespo, roteirista
" Os roteiristas e diretores fazem o que podem para aumentar a diversidade. A gente cria muitos projetos com protagonismo LGBTQIPNA+, a gente insere tramas com esses personagens em outros projetos, mas o que vem lá de cima (da direção dos canais e dos streamings) é uma orientação para cortar, diminuir, tirar, mudar.
Há uma barreira de quem toma as decisões para que essas histórias cheguem ao público. O que está faltando em nosso mercado de TV são executivos LGBTQIPNA+ que queiram bancar isso. Faltam pessoas LGBTQIPNA+ em cargo de poder."
Bruno Gadiol, ator
"Eu, como ator, achei que só ia fazer personagem gay depois que me assumi, mas, desde então, tenho feito mais heterossexuais. Estou feliz de ser visto no mercado como um ator e não um ator gay. Quando a gente pensa em cada letrinha, a representatividade cai cada vez mais. Bissexuais não têm muita representatividade.
Quando a gente pensa em transexuais, a gente vê em casos esporádicos na TV. Uma das maneiras de aumentar a diversidade é através de quem escreve. Tem que escrever personagens LGBTQIPNA+, mas eles precisam ser representados por atores que pertencem à comunidade."
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