Ricky Hiraoka

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Reportagem

Gustavo Reiz ignora flop de remakes e quer novo Roque Santeiro para TV

Gustavo Reiz possui uma trajetória pouco convencional na TV. Aos 42 anos, ele é um dos profissionais mais jovens a ser autor titular de uma novela e é um dos poucos nomes da teledramaturgia que escreveu para as três maiores emissoras abertas do Brasil. Poucos sabem, mas Gustavo é ator de formação e teve sua primeira chance como roteirista quando foi participar de um teste de elenco para o SBT no início dos anos 2000.

"O David Grimberg [na época, diretor de teledramaturgia da emissora], descobriu que eu tinha escrito a peça 'Confissões e Confidências Masculinas', que já tinha rodado mais de 80 cidades, e me indicou para participar de uma oficina de roteiro que o SBT estava promovendo", conta. "No fim, eu fui um dos três roteiristas escolhidos para participar da equipe de 'Os Ricos Também Choram', que foi baseada numa novela mexicana de grande sucesso nos anos 1980".

Recém-saído da Globo, onde assinou "Fuzuê", Gustavo Reiz falou com a coluna sobre sua carreira, seus planos para o futuro e revelou um sonho: "Adoraria fazer o remake de 'Roque Santeiro'". A seguir, os melhores trechos da conversa com o autor.

Recentemente, foi divulgado que a Globo não renovaria seu contrato e isso teve bastante repercussão na imprensa...

Talvez as pessoas tivessem expectativas que eu fosse emplacar mais um projeto na Globo logo após "Fuzuê", como acontecia na Record, onde passei 13 anos emendando várias produções. Estamos vivendo um momento diferente e muito interessante do mercado, em que não há mais contratos longos e os talentos estão circulando muito entre as várias plataformas e canais. O trabalho do autor é parte de uma engrenagem, de um produto que precisa de um grande diretor, de um grande produtor. Quando eu escrevo uma novela, estou plenamente consciente que funciono dentro de uma engrenagem e de um momento específico da empresa. Se meu trabalho não faz mais sentido para a empresa ou se a empresa não me supre artisticamente, naturalmente a vida nos leva para outro lugar. Foi assim que saí da Record e fui para a Globo.

Como você avalia sua passagem pela Globo? Ficou alguma frustração? Algo por fazer?

Eu fico muito orgulhoso e muito feliz pela minha passagem na Globo. Sempre tenho muito pé no chão. O que me norteia é minha paixão, independentemente do projeto, da história, da emissora. Quando ainda estava na Record e estava envolvido no projeto de "Gênesis", meu contrato com a emissora estava para acabar e eu tive a liberdade de mandar duas sinopses para a Globo avaliar. Uma sinopse era uma história de época para o horário das seis e a outra era a sinopse de "Fuzuê", que escrevi como uma comédia com base em todas as novelas que me inspiravam como espectador. Na época, Silvio de Abreu, que era o diretor de dramaturgia da Globo, leu a sinopse de "Fuzuê" e aprovou. Então, fazer "Fuzuê" na Globo foi a realização de um sonho.

Luna (Giovanna Cordeiro) e Preciosa (Marina Ruy Barbosa) : mocinha e vilã de "Fuzuê"
Luna (Giovanna Cordeiro) e Preciosa (Marina Ruy Barbosa) : mocinha e vilã de "Fuzuê" Imagem: Reprodução Vídeo/TV Globo

A demora na estreia de "Fuzuê" por conta da pandemia pode ter atrapalhado o desempenho da novela?

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Eu estreei "Fuzuê" com quase 100 capítulos escritos, o que fez a novela se tornar uma obra semiaberta. A ideia era começar com 60 capítulos escritos, mas, com a pandemia, eu não parei de escrever. A novela dialoga muito com a realidade. A gente tem mundo pré-pandemia e pós-pandemia e as diferenças são gigantes. Algumas ideias que estavam estabelecidas pré-pandemia sofreram modificações. "Fuzuê" já tinha intenção de ser uma novela escapista, para as pessoas não pensarem em tristeza, mas como ela já não foi exibida logo na sequência da pandemia, essa proposta talvez não fizesse mais sentido para parte do público. Apesar disso, Fuzuê foi uma das novelas que mais vendeu no horário das sete nos últimos tempos. Tivemos mais de 13 contratos na novela.

Qual o desafio de fazer novela numa época em que todo mundo consome conteúdo rápido nas redes sociais e também tem o costume de ver TV com o celular na mão?

Como autor, nosso desafio é saber como essa história longa, que é a novela, vai dialogar com essas pílulas de redes sociais. Os criadores têm que atentar que a novela tem que dialogar com as redes sociais de alguma maneira. Quem vê um não abre mão do outro. O desafio é achar as melhores formas de agregar e fisgar esse público das redes sociais. Se ficar na ideia de que é preciso fazer a novela uma obra de consumo rápido, vai haver um ruído, pois novela não é um formato para se para aprofundar. Trabalhar a expectativa do público é parte da novela.

Como você enxerga a teledramaturgia atual?

De modo geral, vejo uma boa vontade da Globo de querer novas histórias e existe um trabalho de renovação com autores com os colaboradores tendo oportunidade de apresentar projetos autorais. Eu adoraria que o SBT voltasse a fazer novelas como fazia antigamente, como "Éramos Seis" e "Fascinação". A própria Record, que faz novelas bíblicas aclamadas no mundo inteiro, poderia ampliar mais o leque de produções. Está rolando uma onda de remakes e não sou contra isso. Existe uma geração que não acompanhou as histórias e se elas são potentes, por que não refazer? Uma boa história merece ser contada independentemente se ela já foi contada. Eu adoraria fazer [o remake] de "Roque Santeiro". Por mais que essa novela seja uma entidade, a história de "Roque Santeiro" dialoga com a sociedade atual e os temas continuam vivos.

Muito se fala numa crise das novelas brasileiras. Nesse cenário, vemos as novelas turcas fazendo muito sucesso mundo afora. O que podemos aprender com os turcos?

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As novelas turcas apostam num melodrama profundo com pouquíssimos personagens, tramas mais simples, que envolvem o público sem grande pirotecnia. Isso talvez possa nos indicar algum caminho, mas a novela turca é uma construção diferente da nossa teledramaturgia. A novela turca não é uma novela apressada. Não é uma narrativa corrida. Me dá impressão que estamos vendo uma novela de época num mundo atual. Na TV aberta, eu não sei se uma proposta parecida com as novelas turcas funcionaria bem. Eu atribuo muito o sucesso das novelas turcas à plataforma em que elas são exibidas. O espectador do streaming escolheu acompanhar uma narrativa mais lenta. O espectador da TV aberta pede um pouco mais de dinamismo.

E o fenômeno dos doramas? Tem algo a nos ensinar?

O dorama dialoga bem com o público juvenil, que atualmente não tem mais tanto espaço na TV. Os doramas possuem um arco dramático simples, mas há elementos muito criativos e os temas são profundos, além de apostar fortemente no romance sem medo de ser piegas. Também acho que dorama é um fenômeno de streaming e que, dificilmente, uma TV aberta ousaria tanto fazendo um projetos com características de um dorama.

Desde que você saiu da Globo, o que você tem feito?

Eu escrevo muito. A primeira coisa que fiz quando acabei a novela, foi escrever uma peça. De lá para cá, escrevi três peças para serem encenadas até ano que vem. Já tenho uma novela que está sendo avaliada na Globo, é uma comédia. Quero escrever novelas que possam gerar impacto positivo no público, que saiam do eixo Rio São Paulo e tenham muita diversidade. Quero levar boas mensagens para os espectadores.

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Texto que relata acontecimentos, baseado em fatos e dados observados ou verificados diretamente pelo jornalista ou obtidos pelo acesso a fontes jornalísticas reconhecidas e confiáveis.

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