Ricky Hiraoka

Ricky Hiraoka

Siga nas redes
Só para assinantesAssine UOL
Opinião

Despretensioso, Ilha da Tentação diverte com o pavor do homem de ser corno

Os ouvintes fieis do podcast Não Inviabilize conhecem a máxima de Deia Freitas, idealizadora do projeto: "Ninguém tem dó de corno". Essa sabedoria popular, de alguma maneira, norteia a curiosidade sádica do espectador que deu play em Ilha da Tentação, da Amazon Prime Video, que disponibilizou na última semana os quatro primeiros episódios do reality show.

Para quem não sabe do que estou falando, vale a explicação: Ilha da Tentação nada mais é do que um Teste de Fidelidade com orçamento turbinado e regras mais interessantes.

O formato, que já ganhou uma adaptação obscura no Brasil, apresentado por Babi Xavier e veiculado no SBT em 2002, reúne num cenário paradisíaco quatro casais que desejam colocar o relacionamento à prova e que topam o desafio de se separar momentaneamente.

Por alguns dias, as mulheres passam a morar num local com oito solteiros para lá de fogosos e os homens se mudam para uma casa onde convivem com oito solteiras sedentas por diversão. Antes de se separarem, cada casal define as ações que caracterizam uma traição para eles (pode ser beijo na boca, sexo, body shot, carícias íntimas, etc). Toda vez que uma das partes infringir uma regra estabelecida, um alarme soa na casa onde a outra metade do casal está alocada.

Durante esse período em que estão longe um do outro, os comprometidos e as comprometidas têm encontros românticos periódicos com um dos oito pretendentes com quem estão convivendo, além de realizar dinâmicas e brincadeiras cujo objetivo é um só: atiçar a libido dos participantes. E de tempos em tempos, os apresentadores Flávia Alessandra e Otaviano Costa conversam em separado com os componentes do casal e mostram o que o parceiro e a parceira estão fazendo ao lado dos solteiros e das solteiras.

Num formato que se propõe a testar a monogamia de casais, sabe-se que, em algum momento, haverá traição. A graça aqui é saber o contexto em que a infidelidade vai acontecer e quem protagonizará a pulada de cerca. Entre os participantes que formam os casais, três deles se destacam nessa corrida contra o chifre: Cordeiro, um personal trainer assumidamente infiel, e o casal Gabriel e Luana, que, apesar de estarem juntos há 11 anos, optaram por adotar a abstinência sexual há alguns meses. Luana, inclusive, já confidenciou a um de seus paqueras que sente mais falta de sexo que o companheiro, Gabriel.

Menos explícito que reality shows que exploram a pegação, como De Férias com o Ex, Ilha da Tentação acerta ao apostar numa narrativa em que os homens comprometidos, por mais que estejam se divertindo com as solteiras, se martirizam e se mostram apavorados pela possibilidade de serem corneados. Não há como não acompanhar com um sorriso nos lábios todo o pavor masculino, que é motivado mais por uma questão de ego ferido do que necessariamente por sentir que as namoradas possam nutrir sentimentos por outro cara. "Será que eu não tenho cabelo cheiroso?", tortura-se o personal trainer Cordeiro após ver a cena da namorada fazendo cafuné em um dos solteiros.

Embora seja totalmente despretensioso, Ilha da Tentação funciona quase como um estudo antropológico da fragilidade masculina, que não foi educada para expressar seus sentimentos. É tragicômico ver como os homens que estão testando a fidelidade de suas parceiras gerenciam as próprias emoções e é quase impossível não relacionar a inabilidade de um desses participantes com alguém que você conhece na vida real. Mas não são apenas os comprometidos que servem entretenimento. Os esforços que os solteiros fazem para chamar a atenção das mulheres que namoram extrapolam o ridículo. Eles soltam mil clichês, exibem os músculos, entoam cantadas manjadas como se fosse poemas elaborados para conseguir o mínimo de atenção (ou seria tempo de tela?) das comprometidas.

Se olhando de fora, Ilha da Tentação nos diverte diante das agruras dos homens, quando exercitamos a empatia, a história muda de figura. Ao nos colocarmos no lugar das mulheres do reality show, é inevitável não sentir pena. O que a mulher hetero fez para merecer um nível tão baixo de homem? Talvez a próxima leva de episódios de Ilha da Tentação nos traga alguma luz para responder essa dúvida.

Opinião

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

Deixe seu comentário

Só para assinantes