Marco Pigossi: 'Gringos não sabem que o Brasil é o país que mais mata LGBT'
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De passagem pelo Brasil, o ator Marco Pigossi, atualmente radicado em Los Angeles, aproveitou para lançar o primeiro filme norte-americano em que atua como protagonista: o romance "Maré Alta", produzido por ele e escrito e dirigido pelo cineasta italiano Marco Calvani, que também é marido do astro brasileiro.
Produzir os próprios trabalhos era algo que estava na mente de Pigossi desde o início da carreira. "Em 2008, fiz "Queridos Amigos", uma minissérie com Fernanda Montenegro e ela me aconselhou a também ser produtor, pois só assim conseguiria contar as histórias que fariam sentido para mim", lembra.
Pigossi, que gravou recentemente outros dois longas, o thriller "Quarto do Pânico" e o terror "Privadas de Suas Vidas", conta que a ideia de "Maré Alta" surgiu de uma conversa que teve quando estava conhecendo Marco Calvani, que já estava desenvolvendo um projeto sobre um imigrante gay nos Estados Unidos.
"Tinha feito uma declaração para a imprensa sobre meu processo de me entender como homem gay e queria falar sobre isso como ator, um personagem que falasse dessa situação, porque o cinema tem o poder de criar um senso empático. Esse era um lugar que queria explorar como ator apesar de já ter feito um personagem homossexual em 2009, o Cássio de "Caras & Bocas". Eram outros tempos. [O gay] podia existir quando era divertido, mas quando trazia as questões humanas e sociais não tinha muito espaço."

"Maré Alta" narra a saga do brasileiro Lourenço (Marco Pigossi) cujo visto nos Estados Unidos está prestes a expirar e ele não sabe o que fazer para legalizar sua situação para continuar por lá, onde se sente livre para viver a própria sexualidade. Além das complicações burocráticas da vida de imigrante, Lourenço ainda vive uma desilusão amorosa e está em busca de seu lugar no mundo.
"Existe uma grande beleza e uma grande profundidade no processo de se pertencer. 'Maré Alta' passeia por questões universais que são comuns à comunidade LGBTQIPNA+, como a sexualização dos corpos pretos, [a dificuldade de estabelecer] intimidade no momento em que as relações são líquidas online, e há um cardápio de corpos onde a gente só cuida do externo e não entra no interno", avalia.
Em determinado momento do filme, o personagem de Pigossi é vítima da mão boba de um advogado que pode ajuda-lo a regularizar sua permanência nos Estados Unidos. Na vida real, o ator garante que nunca vivenciou uma situação de assédio nos bastidores da televisão. "Eu peguei uma época em que já não se passavam mais dos limites. Trabalhei com muitos diretores gays e nunca tive que passar por uma situação desconfortável nesse sentido", garante.
"Ou tive muita sorte ou soube sair antes de deixar uma coisa assim acontecer", continua ele. "Os homens gays que encontrei na minha trajetória foram muito importantes. Jorge Fernando, por exemplo, me acolheu muito depois que fiz um personagem gay em 'Caras e Bocas' (2009). Ele queria provar que eu tinha talento para fazer outros tipos de personagens."
Morando há alguns anos nos Estados Unidos, Pigossi conta que os americanos se surpreendem quando ele diz que é brasileiro e que fica mais chocado quando descobrem como a homofobia é disseminada no Brasil. "O gringo não tem ideia que o Brasil é o país que mais mata LGBT."
Sem planos de voltar para o Brasil ou retornar às novelas, Pigossi afirma que está vivendo uma paixão pelo cinema independente. Atualmente, ele produz um documentário sobre refugiados LGBTQIPNA+ no Brasil. "É muito louco pensar que o país que mais comete crimes de ódio contra nossa comunidade é também o lugar que tem uma legislação superavançada para acolher imigrantes LGBTQIPNA+ que sofrem algum tipo de perseguição em seus locais de origem."