Chris Hemsworth em 'Resgate': o futuro do 'filme médio' é o streaming
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É provável que, se "Resgate" —que chega sexta-feira, 24, à Netflix— fosse lançado nos cinemas, seria recebido como mais um filme de ação genérico, levantaria uns trocados e evaporaria cedo, abrindo espaço para o próximo candidato a blockbuster. Mesmo ancorado por um astro como Chris Hemsworth, é o tipo de produto que deixou de ser prioridade dos grandes estúdios por um motivo simples: não é mais lucrativo.
O streaming, por outro lado, é uma história diferente. O tal do "filme médio", que pode hoje ser definido como uma produção sem conexão com alguma propriedade intelectual badalada, encontrou em plataformas como Netflix e Amazon o canal perfeito não só para existir, mas também para alcançar o sucesso que dificilmente abraçariam em tela grande.
"Resgate" é justamente essa espécie salva da extinção pelo streaming. Um filme de ação com boas intenções, tematicamente redondinho, tecnicamente perfeito, planejado para causar reflexão, mas que joga para a plateia de verdade com cenas de ação coreografadas e executadas à perfeição. Tudo isso usando ao máximo o carisma de seu astro.
A máquina é azeitada porque os jogadores tem história. Embora seja a estreia de Sam Hargrave na direção de um longa, "Resgate" é um passo bem calculado para ele, veterano de quinze anos da indústria, lapidado em uma carreira como dublê e, mais recentemente, como diretor da segunda unidade dos dois últimos "Vingadores".
É uma "reunião de família" bacana. O roteiro de "Resgate" adapta a graphic novel independente "Ciudad", publicada em 2014 e escrita a seis mãos por Ande Parks e pelos irmãos Joe e Anthony Russo —diretores justamente de "Guerra Infinita" e "Ultimato". Joe rascunhou o roteiro há seis anos, e colocou Hargrave no projeto. Com a adição de Chris Hemsworth, o Thor, o pacote "Marvel" ficou completo.
A trama tem a intensidade do cinema de ação moderno, ambientada aqui em um bairro miserável de Mumbai, na Índia, com um protagonista atormentado por tragédias e segredos. Ou seja: não existe absolutamente nada de novo em "Resgate", mas essa falta de personalidade é compensada pela direção honesta em cenas de ação caprichadas —e que funcionam para alavancar, e não atrapalhar, a narrativa.
No papel do mercenário Tyler Rake, Hemsworth materializa a figura do guerreiro solitário guiado pela honra. Ele e sua equipe são contratados para resgatar o filho de um barão das drogas, levado por um rival para o coração violento de Mumbai. O plano não corre como esperado, e Rake decide tirar o adolescente de lá, mesmo que criminosos e polícia não hesitem em atirar para matar.
O texto não se aprofunda nem nos traumas do mercenário, muito menos nas entrelinhas sugeridas pela presença de crianças-soldado, recrutadas pelo tráfico como bucha de canhão na linha de frente. Ainda assim, a direção de Hargrave deixa claro que seu recorte é para sentir o momento, uma moldura enfeitada por sequências surpreendentes em sua intensidade e violência —a contagem de corpos rivaliza "Rambo II" ou "Comando Para Matar".
Talvez seja regra não escrita para dublês e diretores de segunda unidade que migram para o trabalho principal em um filme —que o digam "John Wick" e "Atômica". Os momentos mais tranquilos em "Resgate" são respiros para Hargrave caprichar em mais uma cena de alto impacto. Trabalhando com poucos cortes, ele entrecorta com habilidade tiroteios, cenas de luta e perseguições em alta velocidade.
O resultado fica léguas além do que Michael Bay fez recentemente com seu "Esquadrão 6", um filme tão histérico quanto confuso. Em "Resgate", a ação traz clareza em sua narrativa, mesmo quando ela é totalmente cinética. A presença de Hemsworth, provavelmente o astro mais genuíno revelado pela Marvel, é o gel que mantém o foco na trama.
Seria bacana conferir um filme como "Resgate" no cinema. Mas a essa altura parece papo de quem fica olhando para o passado. Sam Hargrave entendeu o escopo de seu trabalho e o fez caber sem prejuízos na tela mais modesta da nossa sala. Com o futuro da exibição sendo reconfigurado pela pandemia, arrisco que o cinema será lugar ou de espetáculos derivados de uma marca poderosa, ou do cinema independente e introspectivo que não precisa de um grande circuito para existir.
O "filme médio", por sua vez, será mais e mais a direção das plataformas de streaming, que precisam de volume sem abdicar de qualidade. "Resgate" não é um espetáculo grandioso —e nem precisa ser. Com a estratégia da Netflix em vender seus produtos, é um filme que já nasce vitorioso. Que ele seja entretenimento de primeira é um bônus que poderia se tornar regra.
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