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Com 'Um Príncipe em Nova York 2', Eddie Murphy volta a ser obsoleto
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Quem não aprende com a história está fadado a repeti-la. Em 2006, depois de uma sequência de filmes de quinta categoria, Eddie Murphy recuperou seu lugar no holofote com um papel corajoso e surpreendente no drama "Dreamgirls".
Era o que ele precisava para recuperar o respeito do púbico e de seus pares. Foi indicado ao Oscar! O que ele fez com a boa vontade? Jogou tudo no mato ao emendar "Dreamgirls" com o repugnante "Norbit". Tanto esforço, no fim, para nada. Auto sabotagem nível master.
Eis que em 2019, depois de intercalar projetos fajutos com o bom e velho ócio, o astro voltou em grande estilo com o fabuloso "Meu Nome É Dolemite". Mais uma vez, público, crítica e indústria reconheceram seu talento superlativo. E mais uma vez Murphy escolheu uma bomba para enterrar os louros recém-recebidos: "Um Príncipe em Nova York 2".
É bom ressaltar que o filme de Craig Brewer, diretor justamente de "Dolemite", nunca desce ao pântano de "Norbit". Ainda tenta ser simpático, engraçado e relevante como um passo acertado na trajetória de Murphy. O verbo a ser sublinhado aqui, porém, é "tentar".
Afinal, não há nenhuma evidência de esforço por parte dos envolvidos. "Um Príncipe em Nova York 2" é a definição perfeita de "filme preguiçoso". Continuação da comédia lançada em 1988, quando Eddie Murphy era rei, o novo filme é um pastiche, uma cópia xerox desprovida de humor e carisma - e a ausência de carisma em um trabalho de Eddie Murphy devia ser crime inafiançável!
"Um Príncipe em Nova York" tinha, claro, o pedigree de John Landis no comando. Revelado com o absurdo "The Kentucky Fried Movie", o diretor ajudou a redesenhar o panorama da comédia americana nos anos 1980 em filmes como "Clube dos Cafajestes", "Os Irmãos Cara de Pau" e "Trocando as Bolas", sua primeira parceria com um Eddie Murphy ainda pré mega estrelato.
Quando Murphy assumiu o papel do príncipe Akeem, herdeiro do trono do reino africano Zamunda, ele já era um astro consolidado. Mas não pisou no freio. Em sua jornada em busca do "amor verdadeiro", Akeem e seu companheiro Semmi (Arsenio Hall) trocam a opulência do palácio africano pela aventura em descobrir a América, trabalhando como faxineiro em um fast food do Queens, subúrbio de Nova York.
O barato de "Um Príncipe em Nova York" era justamente brincar com a ideia do peixe fora d'água. A ingenuidade otimista que Murphy imprimiu em Akeem eram o contraponto perfeito para o cinismo dos Estados Unidos prestes a se despedir da era Reagan. A visão do estrangeiro mostrava, enfim, que ainda havia espaço para um conto de fadas moderno.
"Um Príncipe em Nova York 2" tenta (olha aí de novo) a todo custo recuperar essa fagulha. Para isso, traz praticamente todo o elenco de volta em uma trama que espelha o original, injetando uma leve inversão do olhar de um forasteiro em uma nova terra.
No caso ele é Lavelle Junson (Jermaine Fowler), filho ilegítimo de Akeem, concebido durante sua aventura pregressa em Nova York, e também herdeiro do trono de Zamunda. Obrigado a escolher seu sucessor, para honrar a lei que diz que só homens podem usar a coroa, Akeem retorna a Nova York em busca do filho que sequer sabia que existia e o traz para a África, revelando sua herança real.
Não existe, infelizmente, nenhum desenvolvimento para nenhum dos novos personagens. Leslie Jones, como mãe de Lavelle, resume-se ao estereótipo da mulher gritalhona e inconveniente. Tracy Morgan inexiste como o tio "malandro" do jovem herdeiro. O próprio Jermaine Fowler, comediante de stand-up que traçou sua carreira na TV ianque, é um vácuo de carisma.
A trama troca Nova York pelas intrigas palacianas em Zamunda, onde Lavelle vai descobrir o que e ser um príncipe. No filme de 1988 havia a identificação de um lugar real - a cidade de Nova York - na visão de um elemento estranho. Zamunda, por sua vez, é um lugar fantasioso, executado com pouca imaginação. Tudo é resolvido sem conflitos e com velocidade. Não sobra nada para uma conexão com quem está do lado de cá.
Sem um protagonista envolvente ou uma ambientação interessante (o filme parece mais pobre e menos inventivo que seu predecessor), resta ao capitão do time segurar a trama na raça. Mas Eddie parece menos preocupado em ser engraçado e mais em repetir as mesmas cenas do filme anterior - inclusive assumindo, ao lado de Arsenio Hall, os mesmos múltiplos personagens que vimos antes. É uma decepção total.
Se existe um único motivo para dar uma espiada em "Um Príncipe em Nova York 2", seu nome é Wesley Snipes. Sua carreira no novo século resumiu-se a uma dúzia de produções lançadas direto em vídeo, intercaladas com seus três anos preso por fraudar impostos. No papel de um inimigo político de Akeem, ele injeta ânimo no filme sempre que surge em cena.
Depois de "Um Príncipe em Nova York 2", Eddie Murphy contempla voltar a filmes que fizeram barulho nos anos 1980. Ou com ele (a eternamente adiada continuação de "Um Tira da Pesada") ou sem ele (um novo "Irmãos Gêmeos", com Arnold Schwarzenegger e Danny DeVito, parece nunca sair do papel). No novo século, ele decidiu dar um pause em sua carreira depois de uma sequência infinita de bombas. A julgar por "Um Príncipe em Nova York 2", Murphy pode ampliar o hiato sem nenhum problema.
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