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Roberto Sadovski

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

'Espiral': o maior terror do legado de 'Jogos Mortais' é que o filme existe

Chris Rock (e uns pedaços de gente) em "Espiral - O Legado de Jogos Moetais" - Paris
Chris Rock (e uns pedaços de gente) em 'Espiral - O Legado de Jogos Moetais' Imagem: Paris

Colunista do UOL

18/06/2021 03h47

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Em uma das armadilhas montadas pelo assassino de "Espiral", a vítima precisa escolher entre ser eletrocutada e ter seus dedos arrancados de forma brutal (como se houvesse outra). Os gritos agonizantes e o som de ossos se partindo podiam ser o máximo do terror na primeira década do século 21. Hoje só causam um certo incômodo e a sensação de estar vendo um filme velho.

É lastimável que "Espiral - O Legado de Jogos Mortais", filme que mirava rejuvenescer a série iniciada de forma brilhante em 2004, e que aos poucos foi perdendo relevância e seguidores, tenha escolhido um caminho tão embolorado e, por vezes, constrangedor. Não existe nada no novo filme que seja surpreendente, inovador ou mesmo assustador.

A verdade é que o tal "sangue novo" é ilusório. Mesmo com a adição de Chris Rock e Samuel L. Jackson à fórmula, tentativa de injetar alguma credibilidade ao filme, a direção caiu nas mãos do mesmo Darren Lynn Bousman que comandou as partes dois, três e quatro da série. Não adianta acelerar quando o carro está em um lamaçal.

espiral porco - Paris - Paris
Não consigo legendar essa foto sem dar risada, é sério....
Imagem: Paris

O que sobrou para "Espiral" foi ser o mais óbvio filme de dupla policial possível, com o resultado resvalando na paródia. Exemplo básico: quando o policial "rebelde e solitário" Zeke Banks (Rock) peita sua superior, ele recebe um "agora você terá de ser parceiro do novato" sem a menor vergonha na cara. O novato é William Schenk (Max Minghella), que parece ser o "tira" certinho para equilibrar o veterano explosivo.

A dupla tem a tarefa de investigar novos crimes que remetem a Jigsaw, o assassino John Kramer (me pergunto se Tobin Bell ganhou algum cascalho com sua foto aparecendo por dois segundos), que em vez de simplesmente matar suas vítimas as prendia em mecanismos elaborados, que as torturavam física e mentalmente e sempre terminavam em um banho de sangue e vísceras.

Morto desde "Jogos Mortais III" (nos filmes posteriores ele surge em flashbacks ou como gatilho de armadilhas ainda ativas), Kramer é a clara inspiração para um novo assassino, desta vez alguém determinado a eliminar policiais e agentes públicos corruptos. Ou algo assim, já que a trama faz pouco sentido e a identidade do maníaco é facilmente adivinhada em menos de vinte minutos de filme.

De resto temos Chris Rock fazendo o máximo para convencer como ator dramático, no que ele fracassa absurdamente, dando a impressão que estamos vendo o mesmo personagem que ele interpretou em "Máquina Mortífera 4". Sam Jackson tem menos tempo para se constranger, já que ele serve basicamente como isca e mal tem meia dúzia de diálogos.

A função de "Espiral" como motor para reviver a série permanece um mistério. O filme não funciona como aventura policial, muito menos como suspense psicológico. É clara a vontade de espelhar o tom de "Se7en", mas no máximo eles chegam a um episódio capenga de "Law & Order".

Para os fãs, resta o torture porn, as mortes cruéis e sangrentas que, convenhamos, era o único chamariz da série desde que "Jogos Mortais" ganhou sua primeira continuação. O primeiro, dirigido por James Wan, ainda tinha um certo verniz de novidade. Os (sete) filmes seguintes, por sua vez, foram progressivamente piores. Ainda assim, o banho de sangue garantiu mais de US$ 1 bilhão aos cofres do estúdio. Algo me diz que o rastro de mortes (e filmes ruins) não vai parar em "Espiral".