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'Venom: Tempo de Carnificina' é comédia sobre dois amigos que amam se odiar
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"Venom: Tempo de Carnificina" é muito, mas muito melhor que seu antecessor. O que, convenhamos, não quer dizer lá muita coisa. Ao contrário de seu antecessor, uma bagunça de tom e narrativa, o novo filme sabe exatamente o que quer ser e como chegar lá. Mesmo que esse "lá" não seja exatamente o que entusiastas do anti-herói da Marvel esperam de uma versão de seu ídolo em cinema.
Melhor, então, puxar o band-aid sem cerimônia. Se a produção de 2018 flertava com a comédia por conta da interpretação bizarramente alucinada de Tom Hardy, "Tempo de Carnificina" assume de vez sua vocação para as risadas. Vou além: é uma comédia romântica em que o casal de protagonistas vive às turras, experimentam uma separação traumática e, finalmente, descobrem que não podem viver um sem o outro.
O casal em questão é, por óbvio, o jornalista eternamente fracassado Eddie Brock e Venom, simbionte alienígena com apetite para nacos de carne humana. O humor na aventura anterior surgia ao acaso, mas aqui a coisa é explícita. Eddie e Venom dividem o apartamento (com o segundo também habitando o corpo do primeiro), e a convivência não raro termina em comédia pastelão. É como "Um Estranho Casal", com Jack Lemmon e Walter Matthau, só que entupidos de efeitos digitais.
Cada sequência é construída em cia de comédia física. Venom tenta preparar um café da manhã para seu hospedeiro e destrói parte de seu lar. A TV bonitona, orgulho do jornalista, voa pela janela na primeira briga. Eles tem galinhas no apartamento, supostamente para conter o apetite do simbionte, que é incapaz de devorar os bichos por considerá-los "parte da família". Separado de Eddie, Venom vai curtir uma boate e dança até desfalecer. Não existe uma linha em "Tempo de Carnificina" que não mire em gargalhadas.
O que é, honestamente, ótimo! Ocupando a cadeira de diretor, Andy Serkis (sim, o Gollum) traz a energia maníaca que faltava a Ruben Fleischer, seu antecessor. Ele não tem tempo para gordura, amarrando o filme em pouco mais de uma hora e meia de absoluto caos. Imagine "O Máskara", com Jim Carrey e a máscara de Loki travando diálogos absurdos antes de entrar em ação. É esse o espírito.
Woody Harrelson amplia a ponta que fez ao final de "Venom" como o assassino em série Cletus Kasady. Existe um fiapinho de trama em que Eddie Brock investiga os crimes de Cletus, ajudando a encontrar os corpos que colocaram o sujeito no corredor da morte. Como o roteiro pede um supervilão, Kasady morde Brock, parte do simbionte funde-se a seu DNA e voilá, ele se torna o Carnificina.
Eu entendo o uso do personagem, já que ele rivaliza Venom em popularidade entre os fãs dos gibis dos anos 1990. Mas não deixa de ser preguiça ter basicamente o mesmo antagonista em dois filmes seguidos: assim como Riot, criatura assumida por Riz Ahmed no filme de 2018, Carnificina é outro simbionte, maior e mais letal do que Venom. Quando os dois saem no braço, é uma batalha digital levemente confusa.
UMA DR EM FORMA DE AVENTURA JUVENIL
Para complicar ainda mais a trama, Cletus tem uma namoradinha, a igualmente psicopata Grito, encarcerada no Instituto Ravencroft (uma espécie de Asilo Arkham da Marvel) e com o poder de emitir gritos (duh) supersônicos e destruidores. Interpretada por Naomie Harris, ela forma com Woody Harrelson um casal na mesma vibe de Mickey e Mallory de "Assassinos por Natureza".
Esse festival de coadjuvantes, que inclui uma Michelle Williams na função de mocinha em perigo, só desviam a atenção do que realmente importa em "Venom: Tempo de Carnificina": as tretas do casal Eddie Brock e Venom. Em uma DR compactada na metragem do longa, Tom Hardy mostra que entendeu exatamente o que faz seu anti herói funcionar. Quando ele se diverte, a gente racha o bico do lado de cá.
Até porque, apesar de sua popularidade, Venom é uma página em branco. Sua função narrativa nos gibis, a de ser o "anti Homem-Aranha", esgotou-se no comecinho dos anos 1990 com o arco de histórias assinado por David Michelinie e Erik Larsen. De lá para cá, a editora trouxe o Carnificina em cena, seguido de uma dúzia de outros simbiontes alienígenas, tirou Brock de cena, fazendo de Venom ora parte de outro vilão (o Escorpião), ora de um aliado do Aranha (Flash Thompson, seu amigo de infância), e criando um deus sombrio do planeta dos simbiontes capaz de ameaçar toda a vida na Terra.
A boa notícia é que no cinema não há toda essa confusão. Existe, claro, a intenção da Sony em apertar as mãos da Marvel para inserir Venom em seu universo cinematográfico. Por ora, é conversa para alimentar a imaginação dos nerds com a pia cheia de louça suja. A graça dessa versão do herói é que seus realizadores, Tom Hardy em especial, sabem exatamente que a coisa toda é boba, e não se desculpam ao abraçar a galhofa. Às vezes é melhor brincar sozinho no parquinho.
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