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Como 'Ghostbusters - Mais Além' se transformou em um negócio de família
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Jason Reitman não queria saber de caçar fantasmas. Filho do diretor Ivan Reitman, ele cresceu no set dos filmes de seu pai, como "Recrutas da Pesada", "Irmãos Gêmeos" e, claro, "Os Caça-Fantasmas". Cinema estava no DNA. O flerte com a escola de medicina logo abriu espaço para que ele se estabelecesse como um cineasta de voz própria.
Já em sua estréia, o drama cômico (comédia dramática?) "Obrigado por Fumar", Jason desenvolveu um estilo quase confessional e um trabalho delicado com seus atores. Essa sensibilidade ficou aparente em "Juno" e, principalmente, no excepcional "Amor Sem Escalar", que transcendeu uma história sobre a voracidade do capitalismo para um conto sobre solidão. Fantasmas? Nem sinal.
Era inevitável, porém, que Jason Reitman ouvisse a mesma pergunta, repetidamente, sempre que lançava um novo trabalho: Ele teria fantasmas em sua filmografia? "Olha para meus filmes", disse em 2008 para o apresentador Howard Stern. "Meu 'Caça-Fantasmas' seria um porre, com um monte de gente falando sobre fantasmas!" O assunto parecia encerrado.
Paralelamente, Ivan Reitman tentava materializar um terceiro filme da série desde o começo dos anos 1990. A empreitada, por sua vez, nunca saia do papel. Ora o roteiro não trazia o encanto do original de 1984. Ora as agendas não batiam. Ora Bill Murray, o inquieto Peter Venkman, retirava-se do projeto, deixando os amigos na mão.
Seu parceiro, Dan Aykroyd, terminou como guardião das chamas da série. Criador de "Os Caça-Fantasmas" no começo dos anos 1980, ideia que ele lapidou com o ator e roteirista Harold Ramis, materializada por Ivan Reitman como um dos raros filmes em que absolutamente tudo funciona, Aykroyd repetia, em qualquer oportunidade, que a série voltaria eventualmente aos cinemas.
A tempestade perfeita que possibilitou a existência de "Os Caça-Fantasmas" em 1984 combinou não só os talentos dos maiores comediantes de sua geração, mas também foi o resultado de uma ação entre amigos. Murray, Aykroyd, Ramis e Reitman dividiam projetos desde o começo de sua carreira, e esse clima familiar, com as rusgas e os afagos que um relacionamento assim traz, ajudou a fazer do filme um fenômeno.
A demora em tirar um novo "Caça-Fantasmas" do papel passou a incomodar os executivos da Sony, donos da marca. Por décadas a criação de Aykroyd sobreviveu como propriedade intelectual fora do cinema. Foram diversos desenhos animados, histórias em quadrinhos, linhas de brinquedos e videogames. Em 2016, a paciência esgotou e a marca foi entregue ao diretor Paul Feig. Não deu muito certo.
O pensamento na época era usar o conceito dos caça-fantasmas e construir uma história em torno dele, sem necessariamente usar os personagens dos dois primeiros filmes. Kristen Wiig e Melissa McCarthy encabeçaram uma nova equipe 100 por cento feminina. Os fãs mais tóxicos e radicais pilharam o projeto desde o primeiro dia, e por fim a coisa naufragou artística e comercialmente.
Jason Reitman, por sua vez, finalmente achou que era o momento de caçar fantasmas. "Peço desculpas pela demora", disse em um bate papo comigo há algumas semanas. "Eu queria ter meus filmes, mostrar como eu trabalhava como diretor, antes de cutucar o legado do meu pai."
Ivan, orgulhoso, interrompe a cria com elogios. "Jason construiu seu próprio legado", continua. "Seus filmes mostraram que havia espaço para repensar o que seriam os caça-fantasmas." Jason rapidamente mostra que sabe jogar em equipe: "O filme de Paul Feig mostrou que era possível colocar outras pessoas como caça-fantasmas, e sem ele eu provavelmente não estaria aqui conversando contigo."
A reinvenção bolada por Jason foi radical, mas totalmente imersa nos temas de família e legado. Ele imaginou uma adolescente com o equipamento usado pela trupe e, a partir daí, desenhou uma história sobre uma família desconectada que reencontra seu centro ao encarar um passado até então envolto em mistério: o legado do cientista Egon Spengler, que na série original foi interpretado por Harold Ramis.
"Meu filme é o capítulo seguinte à mitologia original", explica Jason. "A minha conexão remete a estar no set de 'Os Caça-Fantasmas' aos 6 anos de idade, vendo marshmallow despencando do céu e o Ecto-1 cruzando Manhattan." Ele diz que sempre imaginou o que um filme "Ghostbusters" poderia ser, mas só agora se comprometeu a colocar palavras no papel.
"Ghostbusters - Mais Além" - o título mantido em inglês agora é questão de branding, bem ao estilo "Star Wars" - troca Nova York pelo coração da América, uma comunidade rural em Oklahoma assolada por tremores de terra e por fantasmas. Os motivos remetem a acontecimentos do filme original, o que garante a dose de nostalgia que entrega charme ao filme.
Essa nostalgia permeia também os bastidores. Embora use tecnologia digital para criar os efeitos do novo filme, o diretor buscou artesão para construir fantasmas e outras criaturas que pudessem ser vistas e sentidas no set - como os cães demoníacos, que voltam à história depois de possuir Sigourney Weaver e Rick Moranis no filme de 1984.
Jason teve cuidado em recuperar o visual de alguns efeitos mais antigos, mesmo quando tinha de usar um computador. "O barato mesmo é usar técnicas antigas, como luz e fumaça, para criar a atmosfera", empolga-se. "Não é tão divertido estar em um set cercado de telas verdes, e nada é melhor do que construir cenários de verdade e ter técnicos operando bonecos monstruosos, da mesma forma que vimos demônios agarrando Sigourney em um sofá no primeiro filme."
Ivan Reitman, que também é produtor de "Ghostbusters - Mais Além", olha para seu filho com orgulho, sabendo que seu legado finalmente está nas mãos certas. Quando pergunto qual o segredo para recapturar o raio na garrafa, ele não hesita. "Misturar comédia e terror com seriedade mas sem perder a leveza", ele responde, concluindo. "Jason trouxe sinceridade à responsabilidade de equilibrar os gêneros. Essa é a essência de 'Ghostbusters'."
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