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'A Liga dos Superpets' mostra que lugar de super-herói é com as crianças
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"Meu filho não vai assistir ao novo Batman, é muito violento." Era 2008 quando um amigo mandou essa. "O Cavaleiro das Trevas" estava chegando aos cinemas, embalado por uma campanha intensa. Era o filme do ano!
Mas um garoto de 10 anos não ia assistir. Ele tinha dois anos a menos que a classificação indicativa para a aventura. Seu pai, tendo conferido a produção previamente, não achou adequado. Batman. Um super-herói dos gibis. Proibido para uma criança.
"A Liga dos Superpets", animação ambientada no universo dos super-heróis da DC Comics, não é um filme perfeito. Falta uma certa costura narrativa para que todas as partes façam sentido. O clímax é por vezes bagunçado demais. Mas é, também, uma aventura que chega aos cinemas para corrigir uma imperfeição.
Super-heróis são, a princípio, feitos para crianças. Não há sequer um meio-termo aí. Gibis com justiceiros fantasiados têm, desde o final dos anos 1930, o público infantojuvenil como alvo principal.
Isso não quer dizer que histórias em quadrinhos não possam ser sofisticadas, não possam acompanhar a evolução natural da sociedade e da cultura pop. É saudável ampliar o escopo e criar gibis que possam ser apreciados por um público mais amplo.
Seu ponto de partida, entretanto, sempre foi trazer diversão, entretenimento e, por que não, inspiração, para leitores em formação. A fantasia é uma ótima ferramenta para refletir o mundo, para levantar temas pertinentes em um ambiente lúdico. Era assim com os contos de fadas. É assim quando o Superman veste a cueca por cima de seu uniforme e luta pela verdade e justiça.
Em algum ponto do caminho, entretanto, algo se perdeu. O surgimento de histórias mais adultas entre as maiores editoras de super-heróis, a Marvel e a DC, trouxeram uma geração de criadores refletindo, agora com o poder da caneta, suas próprias experiências. "Watchmen" e "O Cavaleiro das Trevas" desconstruíram os super-heróis, que ficaram menos inocentes e mais intensos.
O que é ótimo, e ajudou a capilarizar personagens fantásticos para além de sua bolha. Não é problema escrever o Homem-Aranha em um texto mais denso. Nos anos 1960 ele teve histórias construídas em torno das consequências da Guerra do Vietnã e do uso de drogas por parte de seu melhor amigo. Era o reflexo do mundo real sob um prisma lúdico. A mesma história trazia uma percepção diferente em adultos e crianças. O que só atesta sua qualidade.
Desde que os super-heróis tomaram posse da cultura pop, porém, esse diálogo tornou-se uma via de mão única. Os fãs de quadrinhos mais ranhetas, geralmente uma turma com a dentição completa, teima na insistência que filme baseado em gibi só é bom quando é sombrio, violento, "realista". Se o Batman fala um palavrão, é a glória!
O que andava esquecido era o equilíbrio. Eu era adolescente quando vi "Batman" de Tim Burton no cinema, um filme vendido como aventura para a criançada e como alegoria gótica para os mais velhos. Todo mundo curtiu, ninguém reclamou. "Batman" se tornou um fenômeno.
A Marvel, Homem-Aranha à frente, entende que esse equilíbrio é fundamental para oxigenar seu público. Mesmo que os mesmos ranhetas reclamem que "Ms. Marvel" não "traz nada para eles" por ter uma protagonista adolescente, foram justamente as adolescentes que se enxergaram como a heroína Kamala Kahn.
A concorrência, por sua vez, andava presa num loop "sombrio e violento", alimentado por seus próprios artistas. Zack Snyder trouxe, especialmente em "Batman Vs. Superman", um mundo árido, sem cor ou imaginação, uma visão torta do que seriam super-heróis. "Coringa" surgiu como um thriller psicológico que faz do sociopata uma vítima, o protagonista de sua própria história. Saudades de César Romero...
"A Liga dos Superpets" é uma correção de percurso absolutamente necessária. A Liga da Justiça, com Superman, Batman, Mulher-Maravilha e cia., ganha aqui sua versão cinematográfica mais divertida e empolgante. Mas o show é mesmo dos bichinhos.
Em particular Krypto, o supercão, enviado para a Terra no mesmo foguete que salvou o bebê Kal-El de seu mundo condenado. A sequência inicial, embalada pelos acordes da trilha de John Williams para o "Superman" der 1978, conta em poucos minutos tudo que precisamos saber sobre o herói. Emociona sem fazer esforço.
A ação então corta para o presente, quando Krypto vive o dilema de ver seu dono, o Superman, cada vez mais envolvido com a repórter Lois Lane. Ele acredita que será deixado de lado, fica triste e confuso. Tão distraído em sua autocomiseração que não percebe quando o Super é atacado.
Como "Superpets" é uma comédia, o ataque não vem de Lex Luthor, e sim de Lulu, uma porquinha da Índia que, graças à kryptonita laranja, ganha superpoderes. Disposta a conquistar o mundo, ela encontra em outros animais banhados pela radiação, agora super poderosos e liderados por Krypto, os únicos capazes de impedi-la.
A trama percorre cada convenção do filme para a molecadinha. É acelerado e divertido, mas traz temas pertinentes sobre amizade e companheirismo, e uma bússola moral clara. Existe uma "lição" a ser aprendida, com Krypto finalmente entendendo seu papel e abraçando todo seu potencial como herói. É muito bonitinho, inofensivo e divertido.
Não acho, de forma alguma, que filmes de super-heróis tenham de ser feitos exclusivamente para crianças. Muito menos mirando unicamente os adultos. O panorama desse "gênero" há muito estava enroscado no paladar de fãs bem grandinhos, muitos esquecendo que um dia foram crianças.
O nome do jogo precisa, portanto, ser "equilíbrio". Nenhum marmanjo com camiseta da Liga da Justiça precisa chorar, sua dose de violência de mentirinha parece estar garantida com "Adão Negro". Na mesma onda, o segundo "Shazam!" chega com a missão de deixar o mundo mais leve. Tem para todo mundo. "A Liga dos Superpets" mostra que abraçar todos os públicos não é só um bom plano de marketing: é a coisa certa a ser feita.
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