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'Super Mario Bros.' é fofo e ligeiro, mas uma boa história faz muita falta
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Assistir a "Super Mario Bros." é como ter o consumo liberado em uma loja de doces. Tudo é muito bonito e a satisfação é imediata, mas não ache ruim quando o estômago reclamar algumas horas depois. Não existe nada que desabone essa adaptação de um dos videogames mais bem sucedidos da história, a não ser exatamente isso: ela é um doce sem recheio.
Levar "Super Mario Bros." ao cinema não parecia exatamente ciência de foguetes. Assim como no jogo, nosso herói, o encanador do Brooklyn de sotaque italiano carregado, precisa correr, saltar obstáculos, colecionar power ups ao longo do caminho, salvar a princesa e derrotar o vilão.
Um filme, contudo, é um produto mais sofisticado do que um jogo - ou pelo menos deveria ser. Para uma narrativa funcionar, o protagonista precisa de conflito, precisa evoluir, precisa terminar a história diferente de como entrou nela. Do contrário, a empreitada não passa de produto. Sobra o estômago doendo depois de tanto doce.
Existe aqui um esforço para ao menos dar um chão a Mario e a seu irmão, Luigi. Em um prólogo maior do que deveria ser, descobrimos que eles são encanadores no Brooklyn, motivo de risada em sua própria família e estão a um passo do fracasso completo. Uma passagem interdimensional os arremessa, porém, em um mundo de fantasia ameaçado por um monstrão conquistador. É onde eles podem ser heróis!
Tudo em "Super Mario Bros." acontece com o pé no acelerador, o que não seria problema se houvesse mais cuidado com a história. Esse desenvolvimento, porém, é sacrificado para espremer, ao longo de todo o filme, dúzias de referências não só à série de games, mas também a outros jogos da Nintendo. O fã mais "radical" do videogame vai adorar os easter eggs. E o filme sofre por isso.
O motivo é simples, e parece absurdo ter de ressaltar o óbvio: "Super Mario Bros." é um filme infantil. A criançada não dá a mínima para as minúcias, para fan service e para todas essas besteiras. O barato dos pequenos é ter a mesma satisfação de jogar o game, só que com mais estofo. É se empolgar com os personagens. Rir. Se emocionar com eles. Essa simplicidade devia ser a régua que conduz o projeto, e não o marmanjo que faz cosplay para ir ao cinema.
Adaptar um videogame não é tarefa fácil. O próprio "Super Mario Bros." teve a honra de ser o primeiro jogo a saltar para o cinema há três décadas, em um filme todo errado encabeçado por Bob Hoskins. Entre um "Mario" e outro, lições foram aprendidas, erros são repetidos. O novo filme, em sua defesa, ao menos rascunha uma trama que usa o game como referência.
Mario é separado de Luigi quando ambos são sugados para outro universo. Enquanto nosso herói despenca no Reino dos Cogumelos, governado pela bondosa e espoleta Princesa Peach, seu irmão termina capturado nos domínios sombrios de Bowser, o monstruoso Rei dos Koopas. Não há muita explicação para Mario se aliar a Peach para resgatar Luigi e derrotar Bowser. A essa altura o filme está no modo corre-pula-passa de fase.
Visualmente "Super Mario Bros." é um deleite. Cada nova sequência não só espelha o gameplay de algum dos jogos - inclusive o divertidíssimo "Mario Kart" -, como traz uma direção dinâmica e colorida. A criançada vai se amarrar. O fanboy, enquanto pesca mais referências, idem.
Faltou, porém, um tempero. Um dos filmes mais bacanas para a criançada em 2023 foi "Gato de Botas 2: O Último Pedido". A aventura com o herói do mundo de "Shrek" também era colorida e acelerada. Mas trazia uma história que mostrava o Gato crescendo e evoluindo, aprendendo e se tornando alguém melhor. A trama reverberava.
Desenhos animados infantis são basicamente contos de fada anabolizados. As melhores animações são aquelas em que os heróis aprendem algo com seus desafios, emergem deles com a bússola moral realinhada.
Em "Super Mario Bros.", o único personagem que exibe alguma personalidade é, ironicamente, o vilão, Bowser: sua sede de conquista é atrelada à sua paixão pela princesa Peach, o que resulta no conflito entre a conquista e o amor. Se não fosse sua crueldade natural, o Rei dos Koopas, que se mostra cantor talentoso, teria minha torcida!
Entre atender a seu público-alvo com mais cuidado e bajular os fãs que provavelmente compraram o primeiro cartucho do jogo para o Nintendo em 1985, os responsáveis por "Super Mario Bros." ficaram numa sinuca. Videogames fazem parte de nossa cultura de entretenimento, e adaptar um jogo hoje é patinar em um terreno instável.
A infantilização da cultura pop, que criou uma legião de adultos certos de que um produto como "Super Mario Bros." existe unicamente para eles, cobra seu preço quando um filme para crianças deixa de ser... um filme para crianças! Um produto infantil sem propósito é como um brinquedo quebrado.
O que deixa "Super Mario Bros." com pelo menos três estrelinhas é o carisma de seus personagens, em especial Donkey Kong, que obviamente deve ganhar um spin off para chamar de seu. Não é nenhum "Detona Ralph", mas "Mario" consegue ser diversão inofensiva, barulhenta e superligeira. Mesmo que a satisfação, assim como um doce, seja breve e imediata. A dor no estômago pode incomodar, mas logo passa.
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