Elenco do divertidíssimo 'Loucas em Apuros' fala sobre o limite do humor

Em "Loucas em Apuros", quatro amigas partem numa viagem à China em busca de suas raízes. Ok, essa seria a sinopse caso fosse um drama fofo sobre o valor da amizade. Como o filme da diretora Adele Lin é uma comédia proibida para maiores, fica só a parte da "amizade", embalada em piadas de fazer um estivador corar.

Não que comédias com esse tom sejam novidade — muitíssimo pelo contrário! O cinemão americano é catedrático em histórias que compensam a simplicidade de sua trama com senso de humor que, por vezes, parece não ter limites. A pegadinha é que "Loucas em Apuros" não é mais uma reunião de meninos, e sim uma comédia feita por mulheres e com mulheres, talentos emergentes da comunidade asiática em Hollywood.

A mudança de perspectiva faz toda a diferença, mas não alivia nem por um segundo a intensidade do humor que conduz o filme. Assim como em "Se Beber, Não Case!", só para ficar em um exemplo recente, "Loucas em Apuros" não economiza em piadas sexuais, na objetificação do sexo oposto, no consumo industrial de álcool e substâncias ilícitas, e na ridicularização da cultura pop contemporânea. Limites? Bom, não onde a vista alcança.

"Criamos um filme em que a gente pudesse dar risada", explica Adele Lin, que estreia aqui na direção depois de empregar seu talento como roteirista na comédia "Podres de Ricos" e na animação "Raya e o Último Dragão". "Nunca pensamos em traçar limites, ou racionalizar se alguma piada seria ofensiva", continua. "Para nós o importante era o humor soar autêntico e verdadeiro e que alavancasse a narrativa."

"Loucas em Apuros" começa com a amizade de Audrey (Ashley Park, de "Emily em Paris") e Lolo (a comediante Sherry Cola). Elas se conhecem ainda crianças — por ser as únicas meninas asiáticas em Seattle — e crescem como unha e carne. Se Audrey, advogada de sucesso, é a mais certinha da dupla, Lolo, uma aspirante a artista plástica, mora em uma edícula no quintal da amiga e é mais, digamos, desinibida.

Uma oportunidade de promoção surge quando Audrey precisa fechar um contrato com um cliente na China. Adotada ainda bebê por pais americanos, ela desconhece seu país natal e aceita levar Lolo na viagem como intérprete — que por sua vez arrasta a prima, Vanessa "Olho de Peixe Morto" (a excepcional Sabrina Wu).

Uma vez em Pequim, elas encontram Kat (Stephanie Hsu, de "Tudo em Todo o Lugar ao Mesmo Tempo"), atriz de novelas, colega de faculdade de Audrey e um vulcão coberto por uma máscara de castidade. Como diz a narração da TV, "essa turma vai se meter em altas confusões".

O que seria mera viagem de negócios torna-se uma busca pelas raízes de Audrey quando as circunstâncias a colocam numa jornada para encontrar sua mãe biológica. No meio do caminho, as piadas se tornam mais e mais ousadas, ao mesmo tempo em que "Loucas em Apuros" encontra um centro emocional terno e inesperado. "Loucas em Apuros" é um filmaço que provoca gargalhadas sem esquecer de aquecer o coração.

"O mais libertador nesse projeto foi sentir que havia um espírito generoso e genuíno", conta Ashley Park. "Geralmente artistas com meu rosto são o alvo da piada, mas pela primeira vez elas faziam parte de nossa história, o que nos deixou à vontade até para extrapolar os limites!"

"Foi um alívio finalmente poder tirar sarro de nós mesmos", completa Sherry Cola. "A gente entende o outro lado, entender ser o gancho do humor, e esse filme foi a chance de assumir nosso protagonismo", ressalta. "Mesmo que o clima fosse indecente, as piadas tem bom gosto, são espertas."

Quando pergunto sobre o tal limite do humor, Ashley é assertiva. "Vemos esse tipo de piada o tempo todo, só que contadas por outras pessoas, geralmente as mesmas pessoas", explica. "Mas ao ver esse humor vulgar com quatro protagonistas asiáticas, em uma produção majoritariamente asiática, senti que estávamos contando nossa história." Ela sublinha: "Acho que muita gente vai achar indecente porque é algo que nunca foi mostrado antes".

"Podres de Ricos", comédia romântica dirigida por Jon M. Chu, faturou US$ 240 milhões nas bilheterias em 2018. Foi o momento em que Hollywood percebeu que havia um mercado gigantesco a ser explorado, voltado a uma parcela significativa do público que, até então, parecia invisível para a indústria.

"Foi como se um grande portal fosse aberto", ressalta Stephanie Hsu, que neste ano foi indicada ao Oscar de melhor atriz coadjuvante por "Tudo em Todo o Lugar ao Mesmo Tempo". "Mas eu vejo assim", completa. "Para os cinéfilos, o cinema asiático sempre esteve presente, essa turma sabe que fazemos arte há muito tempo. O que aconteceu depois de 'Podres de Ricos' foi que pudemos abrir o leque."

O desafio para Adele Lim era, portanto, criar um filme que pudesse reverberar histórias feitas pela comunidade asiática em todo o mundo — além dos círculos artísticos e do fenômeno "Podres de Ricos". "As comédias proibidas para maiores, geralmente, são direcionadas a meninos e quase todos os envolvidos em filmes assim são homens", teoriza a diretora.

"Mas se você passar um tempo com um grupo de mulheres, mesmo sua mãe ou suas tias, o humor vai terminar sendo bem pessoal, bem sórdido e bem desagradável. Essa é a dinâmica muito feminina e bastante barulhenta que a gente quis compartilhar com o mundo."

A tarefa em "Loucas em Apuros" era, portanto, encontrar essa linguagem universal traduzida no humor. "Algumas piadas que funcionam em um país não tem nenhum efeito em outro", continua Adele. "Mas se o coração está no lugar certo, se a jornada dos personagens cria uma conexão com a plateia, o humor mais politicamente incorreto certamente vai funcionar em qualquer lugar do mundo."

"Não sei se a gente estava tentando fazer uma comédia que fosse universal", ressalta a roteirista e comediante Sabrina Wu, que devora cada cena como Olho de Peixe Morto. "Não temos como racionalizar o processo de criar piadas", continua. "Mas acho que quando contamos muitas piadas, e elas são genuinamente engraçadas, alguém vai encontrar algo para se agarrar."

O limite do humor, por fim, encontra seu ponto de equilíbrio na receita que mistura rir de si mesmo e usar a comédia para elevar o espírito. "A verdade é que todos já rimos de piadas que são ridículas e ofensivas", completa a diretora. "Mas para mim o que conta é o tom, se a piada é maldosa, se ela está derrubando alguém em vez de elevar. A intenção nunca é essa."

"A comédia é um grande agregador", ressalta Sabrina. "Nada une mais as pessoas do que uma boa risada. Em 'Loucas em Apuros' temos humor físico, comédia para chocar, piadas muito indecentes, momentos ternos e tiramos sarro com o exagero ridículo do K-Pop", conclui. "E piadas muito nerds. Piadas com o mestre Splinter vão fundo na cultura nerd!"