Scorsese, Stones: Como os veteranos estão ditando a cultura pop moderna
Martin Scorsese segue falando sobre "Assassino da Lua das Flores", mesmo depois de o filme entrar em cartaz. Ele não faz isso por marketing, e, sim, para cada pessoa que sente o coração bater mais forte quando o assunto é cinema. Aos 80 anos, o cineasta faz o papel de mestre e de pupilo, de alguém que entende a linguagem cinematográfica como ninguém e traduz essa paixão com entusiasmo.
Scorsese fala, o mundo ouve. Não deixa de ser curioso que, em tempos tão acelerados, em que as novas gerações parecem incapazes de segurar sua atenção em um único ponto além da metragem de um TikTok, a voz que recupera o prazer de experimentar um filme venha coletivamente de um senhor que há tempos não tem o que provar a ninguém.
O épico de três horas e meia, desde já um dos filmes mais poderosos de 2023, disparou conversas sobre a herança e o legado dos povos nativos nos Estados Unidos, sobre representatividade, sobre a própria natureza de uma indústria até então dominada por marcas.
Sua estreia trouxe números sólidos nas bilheterias mundiais. Mais curioso ainda é constatar que metade dessa plateia tem entre 18 e 34 anos, enterrando a noção de que não seria um "filme para jovens".
Poucos cineastas, por sinal, tem a bagagem e a habilidade para construir um filme como "Assassinos da Lua das Flores". Isso independe de nacionalidade ou de gênero: Scorsese construiu um espetáculo que remete a um cinema clássico, sem jamais perder sua conexão com o mundo moderno.
Nos próximos meses, outros diretores de sua estatura voltam ao cinema com propostas de escopo semelhante, como Ridley Scott, que finaliza seu "Napoleão", e Michael Mann, que logo estreia "Ferrari". Todos têm mais de 80 anos.
É uma provocação saudável em um momento que o cinema precisa de fôlego. Diretores contemporâneos seguem criando arte, e o cinema só ganha com isso. De Christopher Nolan a Greta Gerwig, para ficar em dois exemplos óbvios neste ano, passando por Ryusuki Hamaguchi, Robert Eggers, Emerald Fennell, Martin McDonagh, Bong Joon-ho e Kleber Mendonça Filho, todos estão no ombro de gigantes.
Tarantino, Del Toro, Villeneuve, Fincher, Peele, Aronofsky, Campion, Anderson (Wes e Paul Thomas) e Lanthimos enxergam o cinema para muito além de um sistema de entrega de produtos. Em comum, todos eles — e mais dúzias e dúzias de novos artistas — olham para trás e sentem-se amparados pelo trabalho de mestres como Martin Scorsese.
A cultura pop, ao menos em 2023, parece a antítese do etarismo. Uma leitura ligeira mostra que, embora a superficialidade de uma geração mais hiperativa pareça dominar o cenário, o equilíbrio é o que determina o estado das coisas. Artistas com bagagem indiscutível tomam a narrativa para si sem nenhum mecanismo moderno, como "likes" e outras bobagens. Tudo pela força de seu talento — e não só no cinema!
O melhor exemplo são os amigos de Scorsese, que atendem há mais de seis décadas por Rolling Stones. Seu novo álbum de músicas inéditas, "Hackney Diamonds", não parece de forma alguma construído por um grupo que há muito tempo não pega mais fila no banco — ao mesmo tempo em que jamais poderia ser concebido por quem não tem sua quilometragem.
Mick Jagger, Keith Richards, Ron Wood e uma coleção de convidados absurdos — de Lady Gaga a Elton John a Stevie Wonder a Paul McCartney! — criaram um disco de rock que coloca a molecada no chinelo. É pesado, traz riffs que não saem dos ouvidos, é melancólico como o melhor blues, é épico e intimista. Um dos melhores discos do ano, de longe, feito por uma banda que segue com a mesma vitalidade, disposição e bom humor. É absolutamente impressionante!
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