'Aquaman 2' encerra o ano dos super-heróis morrendo na praia
"Aquaman 2: O Reino Perdido" não é um desastre, e sim uma curiosidade mórbida. É o acidente em descida de serra que você diminui a velocidade para apreciar o caos, mas logo senta o pé e segue em frente. É também um fim melancólico e emblemático para o ano dos super-heróis no cinema.
Emblemático porque "Aquaman 2" encerra o "universo estendido DC", experiência que buscou espelhar o sucesso da fórmula da Marvel a partir de "O Homem de Aço", em 2013. Foram 16 filmes, variando entre bons ("Mulher-Maravilha", "Shazam!", "O Esquadrão Suicida"), ruins ("Batman vs. Superman", as duas versões de "Liga da Justiça") e escabrosos ("MM84", "Adão Negro") que deixaram uma marca torta na cultura pop.
A nota melancólica fica por conta do clima de fim de festa trazido não só pela nova aventura liderada por Jason Momoa, mas também pelo estado das coisas desse subgênero que, praticamente anteontem, dominava a discussão do cinema de entretenimento. Entre os tropeços da DC e os tombos da Marvel, ninguém mais parece se importar.
Mais uma vez dirigido por James Wan, "Aquaman 2" nem sequer se esforça para virar o jogo neste fim de prorrogação. Uma coleção de tudo que é pior não só em filmes de super-heróis, mas em candidatos a blockbusters modernos, o filme segue um roteiro sem riscos ou novidades, de diálogos constrangedores, em que personagens se trombam em cenários digitais sem vida, desinteressantes como a escuridão nas profundezas do oceano.
Depois dos eventos do primeiro filme, ainda uma fantasia decente que é menos super-heróis e mais "O Senhor dos Anéis", Arthur Curry agora se divide entre a vida de marido e pai com as obrigações que vem com a coroa da Atlântida. O trabalho de ser rei, no entanto, consome Aquaman de tédio, e ele prefere filosofar com seu próprio pai (Temuera Morrison) enquanto divide uma cerveja do que manter a coesão de seu reino.
A chapa esquenta com a volta de Arraia Negra (Yahya Abdul-Mateen II), vilão tecnológico fixado na ideia de se vingar do herói. Em sua busca por uma fonte de poder, ele encontra um artefato místico que faz parte de um legado sombrio da Atlântida e torna-se um condutor para o ressurgimento de um mal ancestral. Para enfrentar a nova ameaça. Arthur decide libertar seu irmão, Orm (Patrick Wilson), de quem ganhou o direito de governar ao final do primeiro filme.
Não existe em "Aquaman 2" nenhuma ideia que não fora testada e aprovada antes em filmes melhores. Listar as... err... "influências" seria desperdício de tempo e espaço. Basta dizer que Wan assumiu a vocação infantojuvenil da empreitada e recheou o filme com ainda mais criaturas marinhas (o que inclui um polvo como parceiro do herói), mais geringonças submarinas, mais desculpas para vender brinquedos. O clima geral é de "Batman & Robin", tanto no visual cafona quanto no clima de galhofa.
Jason Momoa segue como protagonista decente, mas ele precisa de um papel em que não interprete uma variação de Jason Momoa, o sujeito espalhafatoso e falastrão, como um vendedor de carros forrado de tatuagens. O resto do elenco cumpre seu papel com a dignidade de quem foi pago em dia, mas de Nicole Kidman a Dolph Lundgren a Amber Heard, ninguém consegue disfarçar o constrangimento de quem segue na pista de dança quando as luzes já estão acesas.
A sensação ao assistir a "Aquaman 2: O Reino Perdido" se assemelha ao fim da sessão de "As Marvels". Ambos são continuações de filmes que renderam mais de US$ 1 bilhão, ambos parecem cumprir tabela sem propósito dentro de seu universo compartilhado, e sem sucesso como obra cinematográfica avulsa. São sintomas de que uma reinvenção é urgente.
No caso da DC, ela vem em 2025 com "Superman Legacy", de James Gunn, que vai zerar o universo com os personagens da editora no cinema na tentativa de erguer uma cronologia mais coesa. Tudo que existiu até "Aquaman 2" agora pertence ao passado. É o fim definitivo das ideias desenvolvidas anteriormente por Zack Snyder — que não tem aqui mais nenhum crédito.
Ou seja, não espere nesta última aventura de Jason Momoa como Aquaman qualquer conexão com outros filmes. Perca as esperanças de ver qualquer outro herói fazendo uma ponta, desista de aguardar um gancho para o próximo capítulo. Este é o ponto final de uma era da DC no cinema. Acredite, quando você vir a cena extra no meio dos créditos, vai concordar que é para melhor.
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