Novo 'Meninas Malvadas' mostra que toda geração demanda sua Regina George
Vinte anos atrás "Meninas Malvadas" foi um fenômeno pop curioso. Em um oceano de comédias adolescentes bobocas, o filme escrito por Tina Fey foi esperto ao redefinir o manjado jogo de poder em uma escola americana. Mesmo depois de sair de cartaz, a comédia que consolidou Lindsay Lohan e disparou a carreira de Rachel McAdams e Amanda Seyfried nunca foi embora.
Se ainda é cedo para cravar que essa nova versão terá longevidade semelhante, a boa notícia é que "Meninas Malvadas" versão 2024 não faz feio ante seu antecessor. A dupla de diretores Samantha Jayne e Arturo Perez Jr. pegou o texto de Fey, bateu no liquidificador da cultura pop contemporânea e trouxe, da versão do filme para a Broadway, um elemento que faz toda a diferença: a música.
É uma estrutura musical saborosa que embala a jornada de Cady (Angourie Rice, que apareceu nas recentes aventuras do Homem-Aranha), adolescente que passou a vida no Quênia com a mãe pesquisadora e agora, pela primeira vez, estuda numa High School nos Estados Unidos. Levemente ingênua e sem o menor tato para o estrato social do jovem moderno, ela logo é "adotada" pela rainha não declarada da escola, a onipresente Regina George.
Ah, e pode apostar que em algum momento você já cruzou o caminho de uma Regina George. Ela é a aluna mais descolada da escola, a que todas as meninas querem ser, a que tem todos os meninos embaixo da sola de suas botas. Ela dita a moda, determina as tribos, é o centro das atenções sem fazer muita força. Regina George, como o próprio filme descreve, é a predadora alfa — e ai de quem ficar em seu caminho!
Mesmo que a trama se desenrole do ponto de vista de Cady, é Regina George quem comanda toda a atenção. Seria fácil para Tina Fey lhe reservar o papel de vilã, mas "Meninas Malvadas" é perspicaz o bastante para não colocar ninguém em caixinhas pré-determinadas — muito menos sua personagem mais interessante. Se no filme original ela é defendida com fúria por Rachel McAdams, aqui Regina ganha corpo e voz na ótima performance de Renée Rapp.
A atriz e cantora de 24 anos não é uma estranha ao papel, já que foi dela a responsabilidade de interpretar Regina na montagem de "Meninas Malvadas" nos palcos. Aqui ela traz a mesma atitude blasé, o mesmo ar irresistível da dona do pedaço que não parece fazer força para conseguir o que quer. Cady para ela é um pet fofo e exótico, uma menina da África que ela pode moldar como achar melhor.
Essa disputa, contudo, toma rumos inesperados. Cady busca uma fresta na hierarquia da escola e termina alienando os novos amigos — em especial a dupla Janis (Auli'i Cravalho), que tem uma rusga antiga com Regina, e o fiel escudeiro Damien (Jaquel Spivey). São os conflitos de alguém penando para não se tornar outra "garota de plástico", apelido nada lisonjeiro dado ao séquito de sua mentora.
O novo "Meninas Malvadas" pode não ter o ineditismo que deu charme ao original, mas mantém intacta sua verve cômica, seu humor ácido e sua metralhadora de bordões. Existe agora a preocupação em deixar o elenco mais inclusivo e mais sintonizado com os anos 2020, e alguns temas sugeridos 20 anos atrás são discutidos mais abertamente. Fora isso, o texto de Tina Fey — que, por sinal, volta ao elenco no mesmo papel que fez em 2004 — não precisou de muitas atualizações.
O que fica mais evidente com essa volta ao universo de "Meninas Malvadas" é como a comédia adolescente, especialmente a que retrata esse ambiente escolar, sempre funciona melhor quando abraça o ponto de vista feminino. É difícil ter filmes sob a ótica dos garotos não descambarem para a superficialidade da comédia sexual.
Histórias guiadas por meninas, por outro lado, não raro são mais honestas e profundas ao retratar questões que assombram a turma que não é mais criança, mas está longe de ser adulta. E não precisa adotar um tom realista: do clássico moderno "Atração Mortal" aos recentes "A Mentira", "Fora de Série" e "Bottoms - Clube da Luta Para Meninas", o humor e o absurdo são sempre caminhos para falar sobre o que importa.
No caso de "Meninas Malvadas", a conexão fica mais fácil com o elenco que não parece pincelado de revistas de moda, e sim gente de verdade. Adolescentes desajeitados, inseguros, deslocados e que encaram os problemas como se fossem o fim do mundo — não que Regina George admita, nem sob tortura, que é menos que perfeita. "Meninas Malvadas", 20 anos depois, ainda é barro!
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