Roberto Sadovski

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Opinião

'Meu Malvado Favorito 4' estica a piada em filme para crianças bem pequenas

"Meu Malvado Favorito 4" ilustra perfeitamente a diferença entre cinema e produto. Quarto exemplar de uma das séries animadas mais bem sucedidas do cinemão, ele traz novos personagens e repagina alguns velhos conhecidos, reciclando as prateleiras das lojas de brinquedos e fazendo a caixa registradora tilintar. É parte do jogo e não há nenhum problema aí.

Não existe, contudo, absolutamente nenhuma nova ideia na volta do vilão-transformado-em-herói Gru. O personagem é inerte, estático em seu desenvolvimento. Esse ponto morto evolutivo remove qualquer interesse em acompanhar o que ele faz ou, no caso, deixa de fazer. Conformado nessa posição, o filme investe em dinamismo e histeria até transformar tudo em uma cena de ação gigante que só nos tira fôlego e paciência.

Entrar num beco sem saída criativo é uma armadilha inerente a todo produto infantojuvenil. Assim como "Shrek" ou "Madagascar", "Meu Malvado Favorito" começou como uma expressão artística, uma ideia bacana nascida em uma estrutura corporativa. O sucesso, contudo, dispara um monstro que precisa ser constantemente alimentado. Em meio a avalanche de produtos, o conceito original evapora. É a natureza da fera.

A nova aventura traz Gru (que tem voz original de Steve Carell), agora membro ativo da Liga Antivilões, acomodado com sua vida em família. Além de ter adotado as três irmãs Margo, Edith e Agnes, ele agora é o papai orgulhoso de Gru Jr., seu filho com a agente Lucy (Kristen Wigg), com quem ele casou no segundo filme. O bebê é uma cópia carbono de Jack Jack de "Os Incríveis", mas provavelmente contrataram o mesmo ator para o papel...

Gru está de volta em 'Meu Malvado Favorito 4'
Gru está de volta em 'Meu Malvado Favorito 4' Imagem: Universal

A ameaça de um novo vilão, Maxime Le Mal (Will Ferrell), força a família a adotar novas identidades no subúrbio, com a recomendação expressa para Gru frear sua personalidade expansiva e seu ego descomunal - poderia ser interessante ver o personagem policiando seu "jeitinho", mas o filme não tem o menor interesse em lhe dar uma história interessante.

Em vez disso, "Meu Malvado Favorito 4" se apressa em colocar Gru contra Maxine Le Mal, Para preencher os 95 minutos de trama, o filme sai em tangentes que invariavelmente não dão em nada. Um exemplo é a breve carreira de Lucy como cabeleireira, que resulta na fúria de uma cliente que teve as madeixas arruinadas. Toda a construção da cena serve para uma perseguição irrelevante para o resto do filme.

Não que isso faça a menor diferença para o naco da plateia que ainda preserva todos os dentes de leite. "Meu Malvado Favorito 4" sabe manter o ritmo vibrante e a produção colorida e afiada, caprichando unicamente nos estímulos sensoriais. Os minions, ajudantes de Gru que ganharam vida própria (e dois filmes para chamar de seus), ampliam suas fileiras com versões com superpoderes que alimentam o humor pastelão. É tudo gritante, acelerado, inofensivo e esquecível.

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Talvez esse desapego à criatividade torne a máquina mais eficiente. Talvez a mentalidade do algoritmo reforce símbolos que levem a petizada a pedir bis, em um ciclo que induz o consumo e não a reflexão. Ser mais produto e menos cinema seria, portanto, proposital. Tudo bem. Ainda dá para escapulir para a sala ao lado e exercitar a massa cinzenta em mais uma sessão de "Divertida Mente 2". Criança não é boba não.

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Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL

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