Roberto Sadovski

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Opinião

Anárquico e vibrante, novo 'Beetlejuice' é puro suco de Tim Burton

Tim Burton estava pronto para entregar o jogo. Depois da recepção azeda a "Dumbo", e da experiência desgastante que foi trabalhar no filme com a Disney, o cineasta que deu um toque de estranheza à cultura pop considerou um único caminho viável: a aposentadoria.

Curiosamente, Burton buscou no passado o aditivo que clareou seu futuro. "Os Fantasmas Ainda Se Divertem - Beetlejuice Beetlejuice" (sério, turma, quem precisa de um título desse tamanho...), sequência tardia do filme que o revelou no final dos anos 1980, é uma aventura divertidamente sombria que traz faíscas criativas na dose certa para o diretor recuperar seu mojo.

A nova empreitada não traz, por óbvio, a inovação e o impacto de seu antecessor — e nem tinha como. Lançado em 1988, "Os Fantasmas Se Divertem" foi uma revelação. O público devorou as estruturas de ângulos estranhos e os personagens ligeiramente fora de sintonia com o mundo normal. Absolutamente nada era parecido com "Beetlejuice" e seu clima estranhamente macabro, que buscava uma intensidade não sombria, e sim lúdica e anárquica.

São dois predicados fundamentais que, felizmente, formam a base de "Beetlejuice Beetlejuice". Mais de três décadas se passaram desde que a família Deetz teve de lidar com o "bio-exorcista" Betelgeuse (Michael Keaton). Lydia (Winona Ryder), que desenvolveu habilidades mediúnicas e passa a enxergar fantasmas, agora apresenta um programa sobre casas assombradas. Já sua madrasta, a excêntrica Delia (Catherine O'Hara), continua na bolha dentro da bolha, imersa em sua arte.

Michael Keaton em 'Beetlejuice Beetlejuice'
Michael Keaton em 'Beetlejuice Beetlejuice' Imagem: Warner

Lydia, entretanto, tem uma relação complicada com a filha adolescente, Astrid (Jenna Ortega), desde a morte de seu marido — o único fantasma que ela não consegue ver. A jovem, por consequência, acha que a mãe é uma farsa e quer distância, mas elas precisam manter a civilidade quando Delia informa a morte de seu amado Charles, pai de Lydia e avô de Astrid. O funeral leva as três gerações da família Deetz de volta à pacata Winter River, cenário perfeito para a volta de um certo fantasma falastrão.

"Beetlejuice Beetlejuice" atira em todas as direções, como se ao longo dos anos os produtores fossem estocando todas as ideias possíveis para a continuação e, quando surgiu a oportunidade, não perderam a chance de usar cada uma delas. Se a trama em 1988 era mais simples e coesa — para expulsar os vivos irritantes de sua casa, dois recém-falecidos apelam para Betelgeuse — dessa vez a tragédia familiar é só um galho em uma árvore que não enxergamos toda sua copa.

O novo filme apresenta a noiva de Betelgeuse, Delores (Monica Bellucci), implacável e sedenta por sua alma; traz Willem Dafoe como um ator que, no pós-vida, atua como policial; arma o casamento de Lydia com um namorado seboso (Justin Theroux em um papel-clichê); e se ocupa do resgate de Astrid, que corre o risco de ficar presa no mundo dos mortos, o que faz Lydia se enroscar mais uma vez com Betelgeuse (que soa, em inglês, como Beetlejuice).

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Winona Ryder e Michael Keaton se reencontram em 'Beetlejuice Beetlejuice'
Winona Ryder e Michael Keaton se reencontram em 'Beetlejuice Beetlejuice' Imagem: Warner

Michael Keaton, claro, nasceu para esse papel. Poucos atores se entregam de maneira tão natural e extraordinária a um personagem. A diferença é que Keaton entende perfeitamente o que faz Beetlejuice funcionar. Não são seus poderes sobrenaturais, e sim sua personalidade. Ele não é um demônio, e sim uma mistura de funcionário público com vendedor de carros usados, um malandro de ótima lábia e senso de humor rápido e afiado.

Assim como em "Os Fantasmas Se Divertem", Keaton tem pouco tempo em cena, mas o necessário para fazer não só a trama principal fluir, como também para amarrar todas as outras sem que elas se atropelem. Não atrapalha, claro, todo o elenco estar na mesma sintonia. Absolutamente todo mundo, e não só as veteranas nesse mundo, pareciam não se divertir em um set há tempos. Essa leveza, claro, respinga do lado de cá.

Segurando todo o circo em pé temos Tim Burton em estado bruto, com todas as suas idiossincrasias e assinaturas. É um prazer ver um dos cineastas mais originais e únicos do cinema tão seguro em sua direção, tão preciso em suas decisões. Mesmo que o filme ameace ceder sob o próprio peso, e que Burton deliberadamente flerte com o caos, ele é firme em sua visão. Não existe um osso cínico aqui, não é um caça-níqueis: "Beetlejuice Beetlejuice" é o trabalho de um artista que sabe do que gosta e como gosta.

Monica Belluci eleva o elenco de 'Beetlejuice Beetlejuice'
Monica Belluci eleva o elenco de 'Beetlejuice Beetlejuice' Imagem: Warner

Uma máquina movida a nostalgia pode, afinal, voar acima do óbvio. É honesto criar um remix de melhores momentos de sua própria criação, do visual deliciosamente artificial aos efeitos artesanais, com retoques digitais em um segundo plano distante, quanto a intenção é orgânica. Não existe ambição em superar o primeiro filme, e sim em continuar sua narrativa com o mesmo charme lúdico.

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Afinal, sejamos honestos, a verdade é que nenhum outro diretor se atreveria a assumir as rédeas em "Beetlejuice Beetlejuice" — ou mesmo em qualquer outra de suas criações — sob a pena de chafurdar na paródia. O que me fez pensar: se Tim Burton está revigorado, revisitando um de seus clássicos com Michael Keaton tão altivo e empolgado a seu lado, sugerir uma viagem da dupla à Gotham City não seria assim tão absurdo. Sonhar, como Tim Burton não cansa de provar, é um barato!

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Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL

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