Thiago Stivaletti

Thiago Stivaletti

Siga nas redes
Só para assinantesAssine UOL
Opinião

Nanini é visceral como João de Deus ao expor agressividade e poder cego

O escândalo do médium João de Deus, acusado por mais de 300 vítimas ao longo de 45 anos em que atendia doentes e necessitados em Abadiânia, tornou-se o maior caso de abuso sexual na história do Brasil. Desde que o escândalo estourou em 2018, numa grande reportagem da equipe de Pedro Bial, a história já rendeu duas séries documentais, podcast e alguns livros publicados.

O assunto poderia estar esgotado, mas a primeira série de ficção inspirada no caso, com direção de Marina Person, consegue trazer um ponto de vista e um fôlego novo a uma história tão dolorida.

"João Sem Deus - A Queda de Abadiânia", minissérie em apenas três episódios do Canal Brasil, faz uma boa aposta ao condensar o drama de diversas vítimas em três personagens da mesma família.

Carmem (Bianca Comparato), que serviu de braço direito do médium por anos sem se dar conta das barbaridades de seu chefe; sua irmã Cecília (Karine Telles), que procurou a ajuda espiritual de João e foi abusada; e a filha de Carmem, Ariane (Maria Clara Strambi), que já nasceu em Abadiânia e foi criada ao lado do médium numa proximidade perigosa (vale lembrar que João de Deus abusava de uma filha de dez anos).

Karine Teles, Maria Clara Strambi e Bianca Comparato na série "João Sem Deus"
Karine Teles, Maria Clara Strambi e Bianca Comparato na série "João Sem Deus" Imagem: Mariana Caldas/Divulgação

Além das três, outras mulheres fortes ajudam a desvendar o escândalo, como a jornalista portuguesa que chega a Goiás para cobrir o caso (Ana Sofia Martins). "João Sem Deus" adota assim um claro ponto de vista: o das mulheres que sofreram nas mãos do médium, a vergonha e a culpa que sentiram ao ser abusadas, o medo de denunciar um homem tão poderoso, na religião e na política.

Nenhuma delas é diretamente decalcada de uma vítima real, mas juntas representam diversas situações vividas pelas mulheres abusadas.

Representando esse poder absoluto e cego, Marco Nanini entrega uma presença tenebrosa, visceral, instável. Seus momentos de paz religiosa são intercalados pelos rompantes de agressividade que começa a demonstrar quando o cerco vai se fechando. Diretora de raros trabalhos — seu único filme de ficção como diretora, "Califórnia", é de 2015 —, Marina conduz essa história de violência e drama com total segurança, apoiada na sua ótima trinca de protagonistas e na presença feroz de Nanini.

Contra a corrente das plataformas de streaming, que obrigam produtores e roteiristas a esticar histórias para formatos de oito ou dez episódios, é bem-vinda a decisão do Canal Brasil de manter a minissérie com a duração curta que a história pedia. Menos é mais, e as mais de 300 vítimas de João de Deus ganham mais força concentradas em três mulheres e três episódios.

Continua após a publicidade
Siga o Splash no

João Sem Deus - A Queda de Abadiânia
Minissérie em três episódios
Estreia sexta-feira (13)
Canal Brasil e Globoplay +Canais

Opinião

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

Deixe seu comentário

Só para assinantes