Thiago Stivaletti

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Opinião

Série 'Fim' é mais melancólica e feminista que o livro de Fernanda Torres

Quando entrevistei Fernanda Torres dez anos atrás, ela estava em São Paulo para a noite de autógrafos do seu primeiro romance, "Fim". Ela me explicou que dois motores a levaram a escrever o livro: um fascínio pela maneira como os homens se relacionam entre si e suas lembranças de quando chegou ao Rio, com cinco anos de idade - lembranças dos anos 70 carregadas de uma libido ainda indefinida para uma criança, mas já bastante percebida.

Uma década depois, "Fim" chega às telas como série da Globoplay, escrita por ela e Maria Camargo, com direção de Andrucha Waddington e Daniela Thomas. É a história de cinco amigos ao longo de mais de 30 anos, dos anos 60 aos 90: o belo Ciro (Fábio Assunção), o cafajeste Silvio (Bruno Mazzeo), o platônico Ribeiro (Emílio Dantas), o certinho Neto (David Junior) e o tímido Álvaro (Thelmo Fernandes). A história começa com a morte de Ciro, o mais bonito e mulherengo dos cinco, o que leva os outros quatro a relembrarem os tempos de juventude, farra, bebida, inconsequências.

Nos dois primeiros episódios, duas diferenças gritam em relação ao livro. Enquanto o texto de Fernanda tinha um tom mais leve, quase cômico - bem próximo da imagem que temos da Fernanda atriz, e muito próximo do universo de um Luis Fernando Veríssimo -, a série já impõe um tom mais dramático desde o início. E se o livro é realmente muito centrado nos homens, a série dá igual peso às mulheres que casaram e se separaram deles ao longo de tanto tempo: Ruth (Marjorie Estiano), Irene (Débora Falabella), Norma (Laila Garin) e Célia (Heloísa Jorge). É uma aposta acertada, ao mostrar como essas mulheres construíram suas vidas apesar dos erros desses homens, por conta deles, e se apoiando umas às outras nos momentos difíceis.

De cara, "Fim" conquista pela bela reconstituição de época dos anos 60 e por uma certa liberdade sexual da época que raramente vemos nas séries de hoje, brasileiras ou não. A primeira cena, de Ciro no leito de morte do hospital, já nos joga no universo de pulsões de Nelson Rodrigues, autor bastante cancelado nos dias de hoje. Mas talvez o maior acerto seja manter todos os atores dos anos 60 e 90, marcando a passagem do tempo apenas na roupa, cabelo e maquiagem - contra o recurso batido de usar atores mais jovens e diferentes do elenco principal, muito usado nas novelas. É uma aposta no poder de convencimento do ator que tem tudo a ver com o trabalho de Fernanda, uma atriz atemporal. Nesse passar dos anos, Marjorie Estiano, Bruno Mazzeo e Débora Falabella brilham ao comprovar que a passagem do tempo provoca mais mudanças nas pessoas do que o seu próprio esforço em mudar.

"Fim" é uma boa surpresa num ano de ouro para as séries brasileiras, que já teve até aqui "Os Outros" (Globoplay) e "Cangaço Novo" (Prime Video). A ver se as andanças e revelações dos personagens seguram bem o interesse do espectador por dez episódios de 50 minutos.

FIM

Série em dez episódios na Globoplay
Dois novos episódios toda quarta-feira à noite

Opinião

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

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