'Coração Ardente' mostra que filmes religiosos podem ir além, mas não vão
Dramas religiosos são, tradicionalmente, filmes que caminham numa linha tênue entre a moral e a necessidade de ruptura, uma característica atrelada à raiz do cinema. Em "Coração Ardente", os diretores criam uma ficção que serve como linha narrativa para chamar atenção aos fatos históricos apresentados na parte documental.
A estratégia, embora interessante, acaba não funcionando tão bem. É possível enxergar dois filmes dentro do drama espanhol. Um deles muito mais interessante do que o outro.
Coração Ardente
Lançamento: 2022 Duração: 89min Pais: Espanha Status: Em cartaz Direção: Antonio Cuadri, Andrés Garrigó Roteiro: Andrés Garrigó, Pedro DelgadoVeredito
O filme mistura drama ficcional e documentário para contar a história das aparições e dos milagres do Sagrado Coração de Jesus ao longo da História. O artifício narrativo, embora interessante, acaba prendendo o longa a convenções de gênero muito fáceis e pouco inventivas: o filme ganha vida na parte documental, e perde fôlego na parte da ficção.
O drama espanhol conta a história de uma escritora de sucesso, Lupe Valdés (Karyme Lozano), que passa por uma crise criativa para escrever seu próximo livro. Ela acaba entrando em contato com uma perita em mistérios, Maria (María Vallejo-Nágera), que apresenta a ela revelações e mistérios sobre aparições do Sagrado Coração de Jesus.
Por meio de sua pesquisa, Lupe descobre assassinatos, conspirações e uma série de crimes que perpetuaram ao longo da História em torno das figuras religiosas.
O diretor e roteirista Andrés Garrigó usa, para este filme, o mesmo artifício que já havia utilizado para o longa "Fátima - O Último Mistério" (2017), de criar um docudrama com partes reais e partes fictícias.
Na parte documental, Garrigó apresenta entrevistas, depoimentos e uma pesquisa histórica profunda e bem estruturada. De conspirações políticas a assassinatos, as imagens revelam ligações entre antigos reis de territórios europeus, santos e Papas, exibem uma coleção de milagres e aparições misteriosas que geram perguntas no espectador e mostram a ligação profunda entre política e religião.
Esta parte, além de ser bastante esclarecedora, é apresentada com muita naturalidade. O cineasta passeia tranquilamente entre resgates históricos da idade medieval e momentos contemporâneos, e usa entrevistas e depoimentos para costurar as ideias em uma teia narrativa coerente.
Embora o filme não esteja interessado em respostas fáceis, a ideologia católica fica evidente do início ao fim.
Já a parte ficcional, comandada por Antonio Cuadri, mostra Lupe e Maria conduzindo tais investigações, enquanto a escritora utiliza as suas descobertas para desvendar mistérios sobre sua própria vida.
O drama se limita a ser um simples fio condutor da narrativa documental, tecendo algumas comparações e criando certas metáforas para que a audiência acompanhe e tenha interesse nos conflitos. Mesmo assim, as tentativas são simples e não apresentam muitos elementos novos que cativem o espectador de formas diferentes.
Em suma, "Coração Ardente" é um filme que se propõe muito mais a elucidar fatos do que a tecer grandes questionamentos, e se dá melhor na documentação de fatos históricos que na construção de conflitos narrativos — estes muito tradicionais e pouco inventivos.
Justamente por isso, ele acaba caindo vítima do mesmo problema que aflige a grande maioria dos filmes religiosos: ele não rompe o suficiente com os paradigmas para ir além da bolha.
ID: {{comments.info.id}}
URL: {{comments.info.url}}
Ocorreu um erro ao carregar os comentários.
Por favor, tente novamente mais tarde.
{{comments.total}} Comentário
{{comments.total}} Comentários
Seja o primeiro a comentar
Essa discussão está encerrada
Não é possivel enviar novos comentários.
Essa área é exclusiva para você, assinante, ler e comentar.
Só assinantes do UOL podem comentar
Ainda não é assinante? Assine já.
Se você já é assinante do UOL, faça seu login.
O autor da mensagem, e não o UOL, é o responsável pelo comentário. Reserve um tempo para ler as Regras de Uso para comentários.