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O que Britney Spears nos ensinou sobre violência psicológica antes do 'BBB'

A cantora Britney Spears, tema do filme 'Framing Britney Spears' Handout/Getty Images

Colaboração para Splash, em Lewisburg (EUA)

18/02/2021 04h00

Nunca se falou tanto sobre violência psicológica como nestas últimas semanas de Big Brother Brasil 2021 no ar.

Até quem não assiste ao reality sabe que há acusação de agressões emocionais, questionamento de atitudes, críticas, ironias, isolamento e até manipulação do sentimento alheio.

Mas muito antes de o "BBB" ser palco dessas situações, esse comportamento destrutivo já estava confortavelmente entre nós.

A diferença é que ninguém dava nome aos bois.

Hoje há a vigilância das redes sociais, mas antes estavam todos assistindo à degradação de alguém com um saco de pipoca nas mãos.

Sim, estamos falando da Britney.

Imagem: Reprodução

Você se lembra dos memes da popstar com a cabeça raspada, os olhos arregalados, em uma nítida crise de saúde mental, depois de anos sendo explorada e anulada emocionalmente.

Virou piada. Foi ridicularizada. Proporcionou entretenimento. Spoiler: não era.

Essa trajetória conturbada e cercada de traumas está contextualizada em "Framing Britney Spears", documentário produzido pelo canal FX com o jornal "The New York Times".

Britney Spears em retrato exibido durante o documentário "Framing Britney Spears" Imagem: Reprodução

Lançado no streaming americano Hulu, o filme é um retrato da ascensão meteórica e da impetuosa queda da então "princesinha do pop".

Pessoas próximas e advogados ligados à sua tutela restritiva reavaliam sua carreira, enquanto ela, aos 39, ainda briga com o pai na justiça sobre o controle de sua vida.

Este não é um documentário com grandes revelações a serem feitas.

A força do projeto está na retrospectiva e ao analisar as circunstâncias que levaram Britney Spears, no final dos anos de 1990, a se transformar em fenômeno global e em como seu castelo desmoronou.

O filme coloca em perspectiva como, naquela época, a fama poderia ser cruel.

Especialmente para mulheres jovens.

Como aponta o crítico do "NYT" Wesley Morris, Britney foi alçada ao sucesso durante o escândalo Bill Clinton-Monica Lewinsky, quando a sexualização de meninas adolescentes era, pasmem, tolerável e a sexualidade delas era discutida em público de maneira grosseira, invasiva e até com certo desdém.

Nessa entrevista, por exemplo, um jornalista britânico diz à cantora:

Tem outro assunto que a gente ainda não falou e que está todo mundo comentando. Os seus seios.

Britney sorri desconfortável.

Ela tinha 16 anos.

E essas abordagens indelicadas eram comuns, mesmo de jornalistas respeitados.

Em um vídeo resgatado para o filme, a veterana Diane Sawyer, da ABC, mostra um áudio da então primeira-dama do estado de Maryland dizendo que se pudesse dar um tiro em Britney Spears, ela o faria por considerá-la um mau exemplo para as crianças.

Em outro, Matt Lauer, da NBC, em uma entrevista insensível, a questiona sobre ser uma mãe ruim.

O motivo? Foi fotografada com o filho pequeno no colo enquanto dirigia.

Cada ação de Britney foi abertamente julgada em público.

A maneira como se vestia no palco. O fim do relacionamento com Justin Timberlake. O noivado relâmpago com Kevin Federline. O divórcio. A maneira como criava os dois filhos. A briga pela guarda das crianças. O ganho de peso.

Britney Spears e Justin Timberlake, então namorados, em foto de 2001 Imagem: Jeffrey Mayer/WireImage/Getty Images

Tudo plenamente coberto com fotos de paparazzi, que a seguiam dia e noite e vendiam as imagens por milhares de dólares.

O sofrimento dela rendia dinheiro.

Que o digam os autores das infames imagens de 2007, em que ela aparece raspando a cabeça, logo após um confronto pela custódia dos filhos. Sufocada pela ação dos fotógrafos, ela ataca o veículo de um deles e pede: "Me deixe em paz".

Não foi uma boa noite para ela. Mas foi uma boa noite para nós, porque fizemos um bom dinheiro, frase o paparazzo que teve o carro atacado pela cantora no documentário.

Britney Spears foge de paparazzi em 2006: rotina na vida da cantora Imagem: Henry Flores, Ken Katz/Getty Images

O documentário informa que a mãe de Britney acreditava que ela estava sofrendo de depressão pós-parto.

E foi justamente esse episódio que levou o pai da cantora, até então sem qualquer envolvimento na vida da filha, a assumir uma tutela restritiva que vigora até hoje.

Ao revisitar essas imagens de menos de 20 anos atrás, fica nítido que o tratamento sexista que Britney Spears recebeu da imprensa, perseguida e assediada até o seu limite.

E que o público, influenciado por uma cultura misógina sistêmica, colaborou para isso, acompanhando e alimentando a exploração.

Assista ao trailer de 'Framing Britney Spears'

"Framing Britney Spears" é um retrato dolorido de um ser humano imperfeito (opa, como todos nós!) e que foi torturado simplesmente por ser real.

É também um alerta sobre como a violência psicológica pode causar danos irreparáveis e como o julgamento público sem limites é tóxico.

Se eu não estivesse sob as restrições que estou agora, com todos os advogados e médicos, e as pessoas me analisando todos os dias, e todo esse tipo de coisa, eu iria me sentir livre e como eu mesma. Eles ouvem o que querem ouvir. Isso é ruim. Eu estou triste. Britney Spears, em 2008

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