Quem dá mais para vencer? Escândalo de corrupção abala Globo de Ouro
De Splash, em São Paulo
23/02/2021 11h56
O Globo de Ouro é uma das principais premiações de cinema e TV dos EUA, atraindo milhões de espectadores todos os anos, além do elenco estelar de celebridades que comparecem à cerimônia. Nada poderia abalar uma instituição de quase 80 anos, certo? Errado!
Em novembro do ano passado, um processo movido pela jornalista norueguesa Kjersti Flaa foi julgado improcedente por um juiz federal, mas foi o suficiente para movimentar as estruturas da Associação de Imprensa Estrangeira de Hollywood, a HFPA, grupo de 87 jornalistas que organiza o Globo de Ouro.
O que dizia o processo?
Flaa acusava a Associação de criar uma "cultura de corrupção", barrando a entrada de certos profissionais, como ela, no comitê e aceitando "milhares de dólares de estúdios, canais e celebridades para quem eles entregam os prêmios", em troca de silêncio sobre tais práticas.
O jornal Los Angeles Times foi atrás de atuais e antigos membros da Associação de Imprensa, além de publicitários e executivos de Hollywood, para avaliar como a reputação do Globo de Ouro pode ter sido arranhada pelas acusações de corrupção na hora de escolher indicados e vencedores do prêmio.
Membro da HFPA que não quis se identificar
Não é de hoje
O Globo de Ouro sempre foi tido como duvidoso em Hollywood. A premiação era alvo de piadas por sua credibilidade inclusive durante a própria cerimônia. Mesmo assim, a influência dos membros da Associação de Imprensa e a audiência do evento só cresce ao longo dos anos.
Quando você pensa que é um grupo tão pequeno que toma as decisões, é assustador. Mas o verdadeiro problema é que os estúdios precisam deles. O Globo de Ouro é o evento mais importante antes do Oscar.
disse um relações públicas que também não quis se identificar
Os jornalistas da HFPA conseguem acesso a festas exclusivas com grandes astros, viajam para hoteis cinco estrelas ao redor do mundo para visitar estúdios ou participar de entrevistas e recebem presentes e até jantares bancados pelos grandes estúdios de Hollywood.
O contrato do Globo de Ouro com a emissora NBC também garante milhões de dólares aos membros: só no ano passado, eles receberam U$ 27,4 milhões, cerca de R$ 150 milhões, pelos serviços prestados. A cerimônia atrai cerca de 20 milhões de espectadores todos os anos, superando até o Emmy.
Tentativa de mudança
Para transformar sua imagem pública, nos últimos anos, a Associação de Imprensa passou a doar grandes quantias de dinheiro para causas diversas, incluindo bolsas de estudo voltadas para cursos de arte e cinema.
Mesmo assim, os jornalistas continuam faturando alto. A Associação desembolsa, mensalmente, cerca de U$ 100 mil (quase R$ 600 mil) para pagar os membros que participam de diferentes comitês. Uma mesma pessoa pode estar em vários comitês ao mesmo tempo.
Outros gastos ainda incluem:
- R$ 19 mil para cada um dos 24 membros do comitê de filmes estrangeiros para assistirem aos longas
- R$ 17 mil para cada um que escreve cerca de oito artigos para o site da Associação
- R$ 43 mil para três membros que organizaram o jantar anual da Associação
E por aí vai...
De acordo com Daniel Kurtz, advogado especialista em instituições sem fins lucrativos como a HFPA, não é comum que tanta gente receba tanto dinheiro. "Associações como essa existem para benefício da indústria e não para benefício dos membros", concorda Douglas Varley, outro advogado.
Um representante da Associação defende que os valores pagos aos membros são justos e de acordo com o mercado. Porém, até mesmo alguns membros questionam a ideia. "Um dia vão criar comitês para a criação de novos comitês. Nunca acaba. Não somos um banco".
Lobby
De acordo com a Lei das Comunicações de 1934 dos EUA, a prática de "payola", isto é, receber pagamento para promover um serviço em um meio de comunicação, é proibida. Porém, a HFPA foi processada em 2011 por aceitar pagamentos de estúdios para garantir indicações ao prêmio.
disse um veterano do marketing de campanhas para o Oscar
Uma regra do Globo de Ouro impede que os membros ganhem presentes caros, mas eles ainda fazem viagens de luxo e conhecem celebridades.
Em 2019, 30 membros da HFPA viajaram a um hotel cinco estrelas de Paris para visitar o set de "Emily em Paris", série da Netflix. Mesmo com críticas medianas, a série foi indicada ao Globo de Ouro em duas categorias —enquanto séries como a elogiada "I May Destroy You', da HBO, foram esnobadas.
Fomos criticados e com razão. Aquela série não é uma das melhores de 2020. Isso é um exemplo de como precisamos de mudança. Se não fizermos isso, continuaremos a ser criticados.
disse um membro da HFPA, que não visitou o set em Paris
Os prêmios vão acabar?
Diante de um histórico de polêmicas, a reputação do Globo de Ouro está ameaçada. Alguns membros da Associação defendem que mudanças sejam feitas para que Hollywood os leve mais a sério, afinal, eles têm o poder de destruí-los quando quiserem.
Masl no final, todo mundo adora ganhar um prêmio, e com todo o dinheiro e exposição que aparecem com algo dessa magnitude, se torna uma bola de neve que você não consegue impedir.
conclui uma fonte ligada a Associação de Imprensa Estrangeira de Hollywood