Topo

Como música criada na antiga Febem derrubou um site e virou hino do funk

MC Duda do Marapé Arquivo Pessoal / Dennis Romano

De Splash, em São Paulo

12/04/2021 15h15Atualizada em 12/04/2021 16h32

Em 2005, o funk tinha dois polos no Brasil: o Rio de Janeiro, berço do movimento, e a Baixada Santista. E foi no litoral de São Paulo que nasceu "Lágrimas", música do MC Duda do Marapé. Escrita durante internato do cantor na Febem (hoje Fundação Casa), ela derrubou um site e virou um hino.

Hoje, 12 de abril, a morte de Duda completa 10 anos.

Ele foi assassinado com 11 tiros no centro de Santos. O cantor foi um dos cinco artistas —quatro MCs e um DJ— mortos entre 2010 e 2012. A Justiça não descobriu a autoria dos crimes ou se eles têm alguma ligação, apesar de todos terem acontecido em abril.

Mas, voltemos à "Lágrimas". A faixa nasceu no começo dos anos 2000, quando Eduardo Antônio Lara (nome de batismo de Duda do Marapé) estava internado na Febem por tentativa de homicídio.

Lá, ele compôs a música que começa assim:

Lágrimas cai quem já passou no sofrimento / coração bate acelerado / mó saudade...

A letra retrata o cotidiano de um jovem internado, que tem saudades da família e quer sair para viver uma vida melhor "fora da ilha".

Mas Duda conseguiu transformar um relato tão íntimo num discurso universal, com o qual todos conseguiam se identificar.

Imagem: Reprodução / Dennis Romano

O MC saiu da Febem com a letra na mão e foi até a casa do DJ Baphafinha, produtor de grandes sucessos do funk paulista. Ao ver os rascunhos, Baphafinha ficou impressionado.

Duda e o produtor eram vizinhos do bairro santista do Marapé, e Baphafinha era uma espécie de pai pro cantor.

O MC, que estava começando a carreira, ficou de voltar na casa do amigo para dar início ao trabalho.

Porém, ele não aguentou esperar muito. Num dos seus shows, ele pediu para o público "prestar atenção na letra" e começou a cantar.

Marcelo Fernandes, DJ de Duda, teve a ideia de gravar o show num aparelho MiniDisc (MD). Ele conta que, naquele dia, o MC cantou (e Marcelo gravou) várias inéditas.

Quando Duda começou a cantar 'Lágrimas', fiquei sem reação, não sabia qual base usar. Foi com um tamborzão e improvisei. Deu certo.

Era um baile no morro São Bento, em Santos. O Duda estava começando e combinamos de gravar algumas inéditas. Ele era predestinado, mas não imaginava que ia virar um hino.
Marcelo Fernandes, DJ e produtor

Em 2005, era comum os organizadores gravarem o áudio dos bailes funk. E "Lágrimas" foi disponibilizada no então recém-criado funkmp3.net. Dennis Romano e Pepito Romero, que comandavam o site, tinham um servidor bom, mas a página não aguentou o tráfego de usuários buscando pelo sucesso instantâneo.

"Lágrimas", a música gravada ao vivo e quem ninguém conhecia, tinha virado um fenômeno. Graças ao boca a boca, já que as redes sociais engatinhavam (alô, Orkut!), todo funkeiro queria ter aquela música.

Até Neymar Jr., que cresceu em Praia Grande, SP, é fã da faixa e já a compartilhou nas suas redes.

A faixa só foi produzida e gravada em estúdio no ano seguinte, 2006. Ela integrou o álbum "Sorrir", produzido pela gravadora Litoral Funk. Porém, a versão não colou. Até hoje, a gravação ao vivo só com tamborzão e voz é o sucesso. Lançada pré-YouTube, a música tem 11 milhões de views na plataforma.

Duda é considerado um visionário, inclusive pelos seus pares. Além de conseguir emplacar sucessos em versões improvisadas (hoje chamadas de "prévias"), Duda já mesclava o funk com rap. Hoje, essa mistura é consagrada, como apontou o MC Hariel.

Duda do Marapé morreu com 27 anos (a tal idade maldita), em 2011.

Naquele ano, o funk começava a fazer sucesso na capital, mas o cantor não acompanhava essa mudança. Por conta dos seus problemas com drogas, ele perdeu o bonde e ficou os últimos anos sem conseguir emplacar grandes sucessos.

Comunicar erro

Comunique à Redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:

Como música criada na antiga Febem derrubou um site e virou hino do funk - UOL

Obs: Link e título da página são enviados automaticamente ao UOL

Ao prosseguir você concorda com nossa Política de Privacidade