Cartunista expõe falas ofensivas a deficientes físicos e perrengues diários
Ser deficiente físico no Brasil significa, muitas vezes, não conseguir parar uma pessoa para solicitar informação por ela achar que vai pedir esmola, se descabelar com a arquitetura urbana hostil, atrair olhares de pena. A piada está pronta. Ricardo Ferraz, muletante, só coloca no papel como charge.
Aos 68 anos, Ricardo, que vive em Cachoeiro de Itapemirim (ES), atua como cartunista e militante pelos direitos das pessoas com deficiência. Ele afirma que acredita na arte como "ferramenta de cidadania".
Desde 1981, saem, de sua caneta, linhas bem-humoradas que mostram situações difíceis vividas por deficientes no dia a dia, pensamentos e falas ofensivas e outras chateações afins.
Batendo na desinformação
Ricardo, que teve poliomielite aos cinco anos e carrega sequelas da doença, contou a Splash que começou a desenhar quando criança para se distrair das dores causadas pela enfermidade.
Há 40 anos, passou a usar o talento como instrumento de conscientização.
Ricardo Ferraz
Ele diz que, na época, participava frequentemente de eventos nacionais e internacionais que discutiam a questão da deficiência.
Depois dos debates, ia beber com outros participantes e ouvia, em forma de piada, circunstâncias de preconceito vividas por eles.
Ricardo Ferraz
Alcance nacional
As charges eram publicadas em um jornal local de Cachoeiro, em uma época em que pouco se falava sobre deficiência.
Depois, com maior visibilidade, ele passou a fazer exposições de seu trabalho pelo Brasil em um esforço para "provocar reflexões e educar olhares".
Ao longo das últimas décadas, Ricardo também promoveu oficinas em escolas e em universidades para discutir a inclusão social.
Ainda hoje —com uma pausa obrigatória pela chegada da pandemia do coronavírus—, ele realiza essas atividades.
Um dos orgulhos de Ricardo é ter emplacado, em 2001, uma vinheta sobre acessibilidade nos intervalos comerciais da TV Globo.
O cartunista participou de um concurso nacional da emissora —segundo ele, sem grandes expectativas ou muita ambição— enviando ao canal uma ideia de animação desenhada na cozinha de sua casa. Para sua surpresa, ela foi escolhida.
Eis a animação:
Ricardo Ferraz
Vida hoje
Ricardo, que trabalhou por 40 anos ensinando desenho, considera que houve avanços em relação aos direitos das pessoas com deficiência nas últimas décadas, assim como às políticas públicas voltadas a elas.
No entanto, cobra mais combatividade das novas gerações para evitar retrocessos.
Ricardo se orgulha de ter suas charges publicadas em muitos livros didáticos pelo Brasil (apesar de não ter recebido nada por isso).
Atualmente, tem produzido muitas charges críticas às desigualdades sociais e ao governo do presidente Jair Bolsonaro.
Ele acredita que, assim como os cartuns sobre deficiência, a ingerência política do presidente oferece piadas prontas a quem faz humor.
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