Como um imigrante ajudou o filme '7 Prisioneiros' a impressionar o mundo
O longa brasileiro "7 Prisioneiros", que estreou em 11 de novembro, é atualmente o segundo filme em língua não inglesa da Netflix mais visto no mundo. Segundo a plataforma, foram quase 10 milhões de horas assistidas só em sua primeira semana.
Alguns elementos poderiam explicar o sucesso do filme do diretor Alexandre Moratto ("Sócrates"): a parceria com a O2 Filmes e Fernando Meirelles ("Cidade de Deus") como produtor, Rodrigo Santoro ("300") e Christian Malheiros ("Sintonia") como protagonistas, uma história universal.
A aplaudida passagem pelos Festivais de Cannes, na França, e de Toronto, no Canadá, também já despertava a curiosidade do público enquanto o filme não estreava no streaming.
A gente gostava do filme, mas as críticas [no exterior] foram surpreendentes. Ele apareceu nas previsões para o Oscar. Fernando Meirelles
Conversando com Alexandre Moratto e Fernando Meirelles, Splash descobriu um detalhe de bastidores que fez diferença no produto final. O filme que conta a história de sete trabalhadores explorados em um ferro velho em São Paulo, escancarando o tráfico humano e a escravidão moderna, teve a presença de um imigrante que viveu de verdade aquela situação.
Patrícia Faria, diretora de elenco, foi para as ruas atrás de histórias e personagens que inspirassem o filme. Ela entrou em algumas comunidades bolivianas onde achou Josep, chamado de Romeo pelo diretor do filme, Alexandre Moratto.
"Ele não é profissional como ator. Quando ele migrou para o Brasil, ele passou seis meses em uma oficina de costura onde eles falaram para ele que, se denunciasse, a polícia ia matar. Então ele ficou preso lá", conta Moratto. O relato sobre a polícia, inclusive, entrou como um dos elementos de "7 Prisioneiros".
"A história dele é muito forte, muito impactante. Lembrou a gente todos os dias no set porque a gente estava fazendo esse filme. Eu fiz questão de ele falar com o resto do elenco para todo mundo ouvir a história", relembra o diretor.
[A presença do imigrante] deu aquele lembrete forte diariamente do porquê esse filme é importante. Alexandre Moratto
No filme, Josep aparece brevemente em uma cena em que Mateus (Christian Malheiros) precisa escolher três homens para trabalhar no ferro velho. Embora curta, a cena carrega simbolismos.
Um homem negro e também explorado escolhendo outros para viver a mesma situação. Luca, personagem de Rodrigo Santoro, pagando pelos trabalhadores como se fossem mercadorias. As correntes prendendo os pulsos dos imigrantes venezuelanos, bolivianos e haitianos.
"Isso não é uma condição só do Brasil"
Fernando Meirelles, um dos cineastas brasileiros mais respeitados do mundo, decifra o que teria levado o mundo a se interessar pela história de "7 Prisioneiros". Para ele, o filme estar na lista de previsões para o Oscar 2022 significa que ele foi compreendido pelo mundo.
"Eu acho que não é difícil compreender. Porque pessoas que estão sujeitas a serem exploradas, a fazer um trabalho forçado, existem em todo lugar. Quando você é vulnerável, não tem dinheiro, você vai topando. Um salário pequeno, uma condição de moradia pior... Tem vários níveis até você chegar a ser escravizado. E isso acontece no mundo inteiro", reflete.
Para exemplificar, Meirelles cita o exemplo do filme "Mediterranea" (2015) que mostra praticamente a mesma situação em uma região bem distante do Brasil.
"Ontem eu assisti a um filme que se passa na Itália de um cara de Burkina Faso que colhe laranja e é escravizado. Isso na Itália de hoje. Em qualquer lugar as pessoas entendem esse filme. Isso não é uma condição só do Brasil. Qualquer parte do mundo, Na Europa, inclusive, isso acontece. Infelizmente."
Cheiro de Oscar
Mesmo sem ter sido eleito o representante do Brasil a melhor filme internacional para o Oscar 2022 (o escolhido foi "Deserto Particular"), "7 Prisioneiros" cumpre todas as exigências da academia, tendo inclusive estreado em algumas salas de cinema, e tem chances de correr em outras categorias. Como aconteceu, por exemplo, com o próprio "Cidade de Deus", de Fernando Meirelles e Katia Lund, que concorreu nas categorias de Melhor Diretor, Melhor Fotografia, Melhor Edição e Melhor Roteiro Adaptado no Oscar de 2004.
"Eu ficaria eternamente feliz", admite Alexandre Moratto sobre a possibilidade. "Tem 40 milhões de pessoas no mundo que sofrem esse tipo de exploração todo ano. Espero que o público em outros países possa se identificar. Espero que esse filme abra essa discussão mais ampla."
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