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Unfollow, isenção e elogio a Paula 'imperfeita': as polêmicas de Leifert

De Splash, em São Paulo

23/12/2021 10h45Atualizada em 23/12/2021 13h35

Fora da Globo, Tiago Leifert rompeu seu sossego para rebater a crítica de Ícaro Silva ao "BBB" — programa que Leifert apresentou de 2017 até 2021. A discussão tomou proporções e uma tréplica de Ícaro após o ex-apresentador global insinuar que pagou o salário do ator.

Recém saído de "Verdades Secretas 2", Ícaro lembrou sua trajetória enquanto homem negro e LGBTQIA+ — no país em que matou 329 pessoas em 2019 por homotransfobia e que negros são vítimas de 80% das mortes violentas de jovens — para estar na Globo e fazer seus trabalhos.

Ícaro mostrou a contradição do lugar de Leifert, que é branco e cujo pai foi diretor da emissora por mais de 30 anos. Ele insinuou que Leifert conseguiu sua ascensão meteórica — do "Globo Esporte", "The Voice Brasil" ao "BBB" e substituir Faustão — dessa influência.

Ìcaro Leifert - Reprodução - Reprodução
Ícaro Silva e Tiago Leifert
Imagem: Reprodução

Artistas se posicionaram publicamente ou curtiram publicações de Leifert e Ícaro Silva. O apresentador parou de seguir Thelma Assis, campeã do "BBB20", que mostrou entender a crítica do ator e colocar questões raciais como um dos fatores — o Brasil tem mais de 54% da população autodeclarada como negra (preta ou parda).

O apresentador coleciona outros momentos em que fugiu ou rebateu críticas pela postura no "BBB".

'A audácia de ser imperfeita'

Leifert  - Reprodução/GloboPlay - Reprodução/GloboPlay
Tiago Leifert consagra liderança de Paula
Imagem: Reprodução/GloboPlay

Em 2019, Leifert destacou no discurso da final que a campeã — seria Paula von Sperling — foi "a pessoa que teve a audácia de ser imperfeita, que teve a ousadia de ser real em 2019".

O humorista Paulo Vieira, hoje na Globo, questionou o sentido da frase ao coroar a campeã: "Então racismo agora se chama 'ousadia de ser real'? Bacana, não tava sabendo".

A advogada com então 28 anos, branca, teve a trajetória marcada por comentários ligados ao racismo, homofobia e intolerância religiosa: depois de uma conversa com Maycon na qual disse "ter medo de Oxum", o que levou a polícia receber queixas de intolerância religiosa e uma investigação foi iniciada.

Na conversa com Hariany, Paula afirmou ter "medo" de Rodrigo por ele mexer com "esse negócio de Oxum" e finalizou a conversa com a frase "Nosso Deus é maior".

Criticada por não exibir trechos das falas, a edição do programa levou ao ar uma tese sem base de Paula de que ela sofreria racismo — vale lembrar, racismo é fruto de opressões históricas criadas por relações de poder — por ser branca e loira.

Ela também disse não concordar com cotas raciais para o ingresso de negros em universidades. Mesmo com a lei em vigência e os dados da desigualdade, Paula disse que o mecanismo era uma forma de racismo.

Para Leifert, em entrevista a GQ Brasil neste mês, Paula "levou o programa nas costas" e mostrou concordar com a vitória de todos os participantes das cinco edições.

Posicionamento depois de três dias

João Leifert - Reprodução/Globoplay - Reprodução/Globoplay
BBB 21: Tiago Leifert fala sobre comentário do cabelo de João feito por Rodolffo
Imagem: Reprodução/Globoplay

Neste ano, a violência racial surgiu mais uma vez quando Rodolffo sugeriu que o cabelo black power de João Luiz era semelhante a uma peruca de homem das cavernas do mostro.

Ou seja, que um cabelo que carrega significado histórico de resistência e estilo era igual a uma estética primitiva e descuidada.

O fato aconteceu no sábado, gerou posicionamento de Ludmilla na noite de festas e só foi discutida no jogo da discórdia de segunda-feira. Após João chorar ao vivo, leifert abriu espaço para Rodolffo se expressar — ele reforçou que era semelhante.

O posicionamento do apresentador do reality veio na terça-feira de paredão. Ele citou Babu e a explicação do pente garfo, Spike Lee e o privilégio da branquitude no Brasil em um discurso de 11 minutos.

Só que a explicação da direção e do apresentador veio depois do desabafo de Ludmilla e João — que teve que se expor a dor novamente.

Metáfora do 'big stick'

Foi na eliminação do João que fãs e fontes ouvidas por Splash se incomodaram com uma metáfora entre a política norte-americana do "big-stick" e a trajetória de João, professor de Geografia, LGBTQIA+ e negro.

Tinha um presidente americano de muitas décadas atrás que falava, um dos lemas dele, 'fale manso, mas carregue um grande porrete'. O que ele estava querendo dizer é que a força dos americanos, da força militar, era tão tão grande, tão forte, que não precisava ficar mostrando isso o tempo inteiro, e ameaçando o tempo inteiro. Era só falar manso e carregar um grande porrete, que todo mundo ia automaticamente respeitar você, porque as pessoas sabem da sua força. Tiago Leifert

Leifert - Reprodução/Globoplay - Reprodução/Globoplay
Tiago Leifert no BBB 21
Imagem: Reprodução/Globoplay

A política do "Grande Porrete" do presidente Theodore Roosevelt tinha uma ligação com a Doutrina Monroe, que pregava a imposição da demonstração de força dos Estados Unidos no continente americano.

Ela virou um marco da intervenção norte-americana em países da América Central e Caribe, como no caso de Cuba, na época recém-independente, com os Estados Unidos determinando como seria a constituição, e de Porto Rico.

Especialistas em Relações Internacionais avisaram que era "inusitado" usar a metáfora ao falar da trajetória de alguém que enfrentou o racismo no programa porque a política do "Grande Porrete" desencadeou estruturas racistas nos países da América Latina.

Isenção no esporte

Leifert - Zé Paulo Cardeal/TV Globo - Zé Paulo Cardeal/TV Globo
Tiago Leifert no cenário do Globo Esporte, em 2010
Imagem: Zé Paulo Cardeal/TV Globo

Em 2018, ele publicou uma coluna dizendo que eventos esportivos não eram locais para manifestações de cunho político na GQ Brasil. Leifert escreveu: "Quando política e esporte se misturam dá ruim. Vou poupá-los dos detalhes, mas basta olhar nossos últimos grandes eventos para entender que essas duas substâncias não devem ser consumidas ao mesmo tempo".

O jogador da NFL Colin Kaepernick se ajoelhou durante o hino para protestar contra a violência policial contra negros — quatros anos antes de George Floyd ser assassinado asfixiado. Branco, Leifert não aprovou o gesto.

"Olhando por todos os lados, não vejo motivos para politizar o esporte. Não acho justo ele hackear esse momento, pelo qual está sendo pago, para levar adiante causas pessoais.", afirmou ele ao defender o esporte como um espaço a ser descontaminado da política.

Em 2020, atletas da NBA se organizaram em um protesto contra a morte de Floyd e a violência policial — a mesma denunciada por Kaepernick. Os jogadores também chamaram a atenção para causas raciais e o direito ao voto naquele ano de eleição presidencial em plena pandemia de coronavírus.

O esporte foi uso de espaço para manifestação e despertar atenção social para problemas sociais não falados. Um pódio nos Jogos Olímpicos do México em 1968 entrou para a história quando Tommie Smith e John Carlos, ouro e bronze nos 200 metros rasos do atletismo, ergueram o punho fechado e abaixaram a cabeça durante o hino.

O gesto era o símbolo dos Panteras Negras, movimento político dos Estados Unidos e que têm forte influência na luta antirracista através de vários segmentos — incluindo o cabelo e o pente garfo que Leifert disse ter aprendido o significado.