Caetano Veloso lamenta morte da amiga Elza Soares: 'Morreu na glória'
O cantor Caetano Veloso, de 79 anos, se manifestou, na noite de hoje, para se despedir de Elza Soares, que morreu na tarde de hoje, aos 91 anos, de causas naturais. Ele era amigo da cantora e responsável por não deixá-la desistir da carreira.
Elza Soares foi uma concentração extraordinária de energia e talento no organismo da cultura brasileira. Tendo sido fã de sua voz e musicalidade desde os meus anos de ginásio, tive a honra de ser procurado por ela quando de sua iminente decisão de abandonar a carreira e/ou o Brasil.
publicou Caetano, no Instagram.
Em 2020, Elza chorou no programa "Encontro com Fátima Bernardes" (Rede Globo) ao falar da importância de Caetano Veloso em sua vida. "Cheguei para ele e falei: 'vou parar, não quero cantar mais, não dá mais'. Ele disse: 'não, nunca, você não pode parar de cantar'", disse à época.
Em sua homenagem para Elza Soares, o cantor lembrou do episódio e contou que a convenceu a seguir na música por entender que a mensagem da amiga era um pedido de ajuda. "Fui capaz de convencê-la a ficar porque entendi que aquilo era uma espécie de pedido de socorro", afirmou ele.
O artista finalizou a homenagem à Elza lembrando que compôs o samba-rap "Língua" e a convidou para cantar a parte melódica com a intenção de colocá-la na televisão.
Compus o samba-rap "Língua" e a convidei para cantar a parte melódica. Assim ela voltou a cantar e a receber atenção. Voltou à televisão e, depois, figuras tão díspares quanto Lobão e Zé Miguel Wisnik fizeram questão de trabalhar com ela. Recentemente jovens músicos paulistanos (e ao menos um carioca que vive em Sampa) têm feito com ela o que ela merece. Morreu na glória a que fazia jus, numa idade respeitável, afirmando a grandeza possível do Brasil.
Sobrinha de Elza, Vanessa Soares informou a Splash que ainda não há informações sobre velório e enterro da cantora.
Elza foi considerada pela BBC a "voz brasileira do milênio", em 1999, e venceu o Grammy Latino na década seguinte. Porém, o início na música foi na década de 1950. Ela subiu ao palco do "Calouros em Desfile", programa comandado por Ary Barroso, e cantou "Lama". O primeiro contrato foi assinado em 1960, incluindo ainda uma turnê internacional.
Elza contou recentemente no programa "Conversa com Bial" que começou a fazer o scat (uma técnica vocal gutural criada por Louis Armstrong e popularizada por Ella Fitzgerald) sem saber. "Eu botava uma lata de água na cabeça e gemia. Eu pensei, esse barulho vai dar um som maravilhoso".
Eu achava que ele [Louis Armstrong] me imitava. Eu não o conhecia", disse a cantora sobre o encontro que teve com o músico na década de 60.
"Eu substituí Ella Fitzgerald na Itália. Ela tinha um show em que cantava Tom Jobim e eu morava por lá com o Garrincha", disse ainda.
Após mais de 30 álbuns na carreira, a última década marcou uma nova fase para ela. Em 2015, Elza lançou o álbum "A Mulher do Fim do Mundo", seu primeiro em oito anos. O disco foi visto como um renascimento em sua já consagrada carreira e foi eleito como um dos maiores destaques do ano até mesmo por veículos internacionais.
"Elza Soares fez o álbum de sua vida, em todos os sentidos", declarou o crítico musical Philip Sherburne da "Pitchfork". Misturando gêneros como o samba, o rock e o rap, o CD ainda discutia nas letras temas como violência doméstica e negritude.
Foi com "A Mulher do Fim do Mundo" que Elza garantiu sua primeira e única vitória no Grammy Latino, vencendo o prêmio de "Melhor Álbum de Música Popular Brasileira". Seu disco seguinte, "Deus é Mulher", de 2018, também foi nomeado na mesma categoria.
Dramas pessoais
Elza herdou o sobrenome Soares do primeiro marido. Ela foi obrigada pelo pai a se casar quando tinha 12 anos. No ano seguinte, engravidou do primeiro filho e aos 21 anos já era viúva. Dois filhos da cantora morreram de fome ainda nos anos 1950.
A artista morreu no mesmo dia que o ex-marido Mané Garrincha, 39 anos depois. Mesmo após tanto tempo, ela contou que sempre sonhava com o ex-atleta. "Eu viajo para o paraíso quando penso nele [Garrincha]. Sonho com ele até hoje. O Brasil (seleção) morreu com ele", contou a artista em participação no programa do Bial.
Eles se conheceram em 1962. Casado com outra mulher na época, o craque levou um ultimato da cantora, e foram morar juntos em 1966. Fãs e a própria imprensa perseguiam o casal e diziam que Elza era culpada pelo fim do relacionamento anterior dele.
Elza e Garrincha se separaram em 1982 após um relacionamento conturbado que envolvia vício em álcool e violência doméstica. Com a morte do jogador em 1983, a cantora ficou depressiva e cogitou o suicídio. Ela conseguiu se reerguer após quatro anos, quando voltou a gravar.
O filho Garrinchinha, o único dela com o atleta, morreu em acidente de carro em 1986, aos 9 anos. O 4º filho da cantora a morrer foi Gilson, aos 59 anos, em 2015.
A única coisa do passado que ainda me machuca é a perda dos meus quatro filhos. O resto tiro de letra. Mas filho é uma ferida aberta que não cicatriza. Estará sempre presente.
Em 1999, a cantora sofreu uma queda durante um show no Rio e passou a se locomover de cadeira de rodas — ela passou por cirurgias na coluna vertebral e na lombar por causa do acidente. Nos últimos anos, ela era sempre vista publicamente usando cadeira de rodas e se apresentava sentada nos shows.
Defensora da vacina
No início de dezembro, Elza anunciou que estava com covid e fez um apelo para a importância da vacina. Ela não teve sintomas e já estava com a dose de reforço.
"Você precisa escutar isso e somente eu posso te contar. Fui um susto pavoroso, mas, ao mesmo tempo, uma experiência que passei sem qualquer sintoma e venci o vírus!", iniciou ela.
"Eu tive covid, gente, e as vacinas salvaram minha vida. Fiz questão de gravar esse depoimento, de mostrar meu exemplo para pedir para vocês que vacinem-se!", pediu.
"Por favor, vacinem-se! Essa doença horrorosa é muito perigosa. Viva a ciência", finalizou.
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