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Equipe da TV Globo é ameaçada durante manifestação de policiais em MG

André Junqueira e colega da TV Globo Minas receberam diversos insultos na manifestação em BH - Reprodução/ Twitter @afonsoborges
André Junqueira e colega da TV Globo Minas receberam diversos insultos na manifestação em BH Imagem: Reprodução/ Twitter @afonsoborges

De Splash, em São Paulo

22/02/2022 16h49Atualizada em 22/02/2022 16h56

Uma equipe da TV Globo Minas se preparava para cobrir a manifestação das forças de segurança de Minas Gerais para reajuste salarial, ocorrida ontem em Belo Horizonte, quando sofreu diversas ameaças e intimidações enquanto o repórter cinematográfico e o jornalista André Junqueira deixavam o local.

Em vídeo publicado no Twitter (clique aqui para ver), é possível escutar diversos insultos direcionados a Junqueira: "Sai daqui filho da p***", "Filma o [governador Romeu] Zema lá", "Vai filmar a casa do c******", foram alguns deles presentes na filmagem de pouco mais de um minuto.

André Junqueira se vira para um manifestante que estava gravando a cena e pede: "Não deixa acontecer isso não, vocês são policiais".

"Aqui é manifestação de polícia, não tem bandido no nosso meio não", responde uma mulher antes de outra pessoa começar a falar.

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Em um trecho da gravação André Junqueira pediu a um policial para não deixar ocorrer as retaliações gratuitas contra ele
Imagem: Reprodução/ Twitter @afonsoborges

Um homem ainda pergunta a André Junqueira o que a equipe estava fazendo no local e, antes de André terminar de responder que estava cobrindo a manifestação, ele já responde com grosseria:

"Não, não. Não veio cobrir nada não. Processa todo mundo então que está fazendo isso. Nós também estamos trabalhando", diz profissional de segurança que estava na manifestação.

"Nós é que damos a segurança para vocês. Na hora que você sofre um acidente, nós que vamos resgatar você", continua ele enquanto Junqueira é filmado.

Há uma sobreposição de vozes na gravação e uma pessoa pergunta novamente o que a equipe estaria fazendo ali. Não dá para escutar se é André Junqueira ou o repórter cinematográfico, ou mesmo algum outro manifestante.

Uma voz masculina responde: "Fazer merd*. A Globo só faz merd*. A Globo só faz merd*. Se não fosse manipuladora, não teria nada disso. Aqui não. Fora, fora, fora", fala o homem aos berros em direção à equipe da TV Globo Minas.

Parte das filmagens foi compartilhada no Twitter por Afonso Borges, jornalista e colunista do Jornal O Globo, que prestou solidariedade ao colega do Grupo Globo:

"Meu irrestrito apoio e solidariedade ao colega jornalista André Junqueira pelas hostilidades e violência que integrantes da Polícia Militar de MG e Bombeiros de MG praticaram contra ele, hoje".

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Apesar dos transtornos, reportagem de André Junqueira sobre o protesto foi exibida ainda na noite de ontem, no telejornal "MG2" (TV Globo)
Imagem: Reprodução/ Globoplay

A jornalista Malu Gaspar, que também é colunista d'O Globo, comentou ao compartilhar o post de Borges, a bruta retaliação sofrida por Junqueira, que apenas tentava cumprir seu trabalho jornalístico: "Toda a solidariedade ao André Junqueira, que só tentava fazer o seu trabalho".

Nota de repúdio

A Fenaj (Federação Nacional dos Jornalistas) e o SJPMG (Sindicato dos Jornalistas Profissionais de Minas Gerais) divulgaram nota e também manifestaram repúdio "às violências verbais e ameaças praticadas por policiais militares e civis e por bombeiros contra uma equipe da Rede Globo, durante manifestação das categorias".

"As entidades prestam solidariedade ao jornalista e ao repórter cinematográfico, que tentavam cobrir a manifestação quando foram ofendidos, ameaçados e perseguidos, até serem expulsos por um grupo de manifestantes. É necessário que as autoridades tomem providências para garantir a liberdade de imprensa", complementa a nota.

No Brasil, são proibidas greves de militares e demais agentes de segurança. Ontem, as forças de segurança mineiras aprovaram greve. Por isso, eles deverão manter um contingente trabalhando durante o período de paralisação.

Leia a nota na íntegra:

A Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj) e o Sindicato dos Jornalistas Profissionais de Minas Gerais (SJPMG) vêm a público manifestar seu repúdio às violências verbais e ameaças praticadas por policiais militares e civis e por bombeiros contra uma equipe da Rede Globo, durante manifestação das categorias na tarde de hoje, segunda-feira, 21, em Belo Horizonte.

As entidades prestam solidariedade ao jornalista e ao repórter cinematográfico, que tentavam cobrir a manifestação quando foram ofendidos, ameaçados e perseguidos, até serem expulsos por um grupo de manifestantes. É necessário que as autoridades tomem providências para garantir a liberdade de imprensa.

O cerceamento ao trabalho de equipes jornalísticas, bem como as agressões a trabalhadores da notícia, aumentaram exponencialmente nos últimos anos, principalmente com a chegada de Jair Bolsonaro à Presidência, em 2018. Propagador de notícias falsas, o presidente busca não só desqualificar o trabalho da imprensa, como também ofende verbalmente jornalistas e incentiva agressões contra a categoria.

O Relatório Anual da Fenaj que mede o índice de violência contra jornalistas e contra a liberdade da imprensa no Brasil aponta que, em 2021, Bolsonaro seguiu como o maior responsável por ataques, com 147 casos (34,19% do total), sendo 129 episódios de descredibilização da imprensa (98,47% da categoria) e 18 de agressões verbais a jornalistas.

Cabe ressaltar que a reivindicação por reposição salarial é um direito de todos os trabalhadores, sejam da segurança pública, da educação, da imprensa, da saúde. E é papel do jornalismo apurar e noticiar tais manifestações, para informar a sociedade.

Assim, não é surpresa que justo no protesto de policiais e bombeiros, categorias que compõem boa parte do eleitorado de Bolsonaro, a violência contra jornalistas seja reproduzida, como sempre ocorreu em manifestações favoráveis ao presidente. E a maior contradição está no fato de tais categorias apoiarem um presidente e um governador, Romeu Zema (Novo), que mais retiraram direitos da classe trabalhadora. O governador de MG, por exemplo, não paga o piso salarial dos professores do Estado.

O SJPMG e a Fenaj reforçam que não se calarão diante das violências e restrições ao trabalho da imprensa, pois elas configuram uma das mais sérias ameaças à democracia. Jornalistas de Minas e do Brasil exigem respeito ao seu trabalho, à Constituição, à liberdade de imprensa e ao livre exercício profissional dos jornalistas.