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OPINIÃO

'Top Gun 2': o filme perfeito que meu pai, que morreu em 2015, não pôde ver

Tom Cruise interpreta Pete "Maverick" um dos principais aviadores da Marinha - Reprodução/Instagram
Tom Cruise interpreta Pete "Maverick" um dos principais aviadores da Marinha Imagem: Reprodução/Instagram

Fernanda Talarico

De Splash, em São Paulo

02/06/2022 04h00

"Top Gun: Maverick" é um filme de ação, mas tem em sua essência um pouco de sobrenatural, algo de mágico. O longa, estrelado por Tom Cruise, tem o poder de nos transportar para outro tempo. Ele consegue fazer com que pessoas que não acompanharam o lançamento e o auge do título que chegou aos cinemas em 1986 sentissem saudades e nostalgia.

Foi o meu caso que, aos 29 anos, fui tomada por um sentimento diferente de todos os que já tive em uma sala de cinema.

Nasci em 1993, ou seja, quando "Top Gun - Ases Indomáveis" chegou às telonas, meus pais ainda não pensavam em filhos. No entanto, meu pai, um grande fã de filmes de ação, se apaixonou pelo longa e, quase que por osmose, fez com que eu criasse um grande vínculo com o título. Quando criança, eu escutava "Take My Breath Away" - música tema do filme - diversas vezes no rádio do Passat azul-marinho e via meu pai andar de moto com a mesmíssima jaqueta de couro que Tom Cruise usou no filme. Presente da minha mãe de quando ainda eram namorados. "Paguei uma nota!", diz ela até hoje quando vê a peça de roupa.

Meu pai amava motos, jaquetas e óculos escuros. Eu enxergava nele o próprio Pete Maverick andando de moto. E foi assim por muito tempo.

Minha mãe e meu pai, que usava a jaqueta sempre que tinha chance - Arquivo Pessoal - Arquivo Pessoal
Minha mãe e meu pai, que usava a jaqueta sempre que tinha chance
Imagem: Arquivo Pessoal

Anos se passaram até que as primeiras notícias de uma sequência de "Top Gun" começaram a pipocar nos sites de cinema. À época, meu pensamento foi apenas um: "uma pena que meu pai não poderá assistir". Geraldo Talarico Filho, meu pai, morreu um ano antes do anúncio da continuação, em 2015, aos 57 anos, de câncer de pulmão.

A morte dele, meu ídolo e a pessoa por quem eu mais nutri amor na minha vida, me marcou de uma maneira que hoje, anos depois, ainda não consegui processar direito. Falar sobre o assunto é doloroso, lidar com a perda então? É uma batalha diária. Por isso, coloquei a partida do meu pai em uma caixinha dentro de mim. Que eu não mexia e não abria para que as pessoas vissem o conteúdo dela.

Até que, por questões profissionais, fui chamada para assistir "Top Gun: Maverick". A sessão contava com poucos colegas jornalistas, pois aconteceria de maneira antecipada para que pudéssemos fazer as entrevistas. Cheguei ao cinema sem expectativa. Achei que assistiria a mais um filme de ação, como tantos que assisto em nome do jornalismo. Para a minha surpresa, estava errada.

Não precisou de muito tempo. Com a música inicial, com Tom Cruise pegando a jaqueta - igual à do meu pai - e pilotando a moto, a minha reação foi apenas uma: chorar. Eu me vi em um misto de risadas e lágrimas, porque eu via ali, na telona, não apenas mais uma sequência de um filme de ação. Eu vi todos os momentos bons com o meu pai. Lembrei de quando assistimos a "Top Gun" juntos, quando escutávamos as músicas e andávamos de moto.

Imaginei a reação dele ao reencontrar esses amigos de longa data, que não se viam desde 1986. Com certeza iríamos no final de semana de estreia, compraríamos um balde gigante de pipoca e sentaríamos no melhor lugar da sala. E ele com a jaqueta.

A vida aconteceu e ele não pode ir comigo. Mas eu fui por ele. E eu estava lá, assistindo como "Top Gun: Maverick" trouxe de volta toda essa nostalgia em um filme que faz não apenas uma referência a toda uma geração, mas também uma homenagem aos fãs. Mesmo com anos de diferença entre os lançamentos e o avanço da tecnologia envolvida, a sequência não se desfaz do primeiro e o preenche.

Saí do cinema feliz. Realizada. Com uma sensação de: meu pai teria adorado.

Dias depois, entrevistei uma parte do elenco de "Top Gun: Maverick" e, para isso, pedi para a minha mãe para tirarmos a tão querida jaqueta do armário. Ela estava um pouco fedida, com cheiro de guardada, mas valeu a pena. Para entrevistar Jon Hamm, Miles Teller, Joseph Kosinski, Charles Parnell, e outros grandes nomes, vesti a jaqueta. Todos eles, sem exceção, reagiram. Gostaram, falaram bem e até disseram que gostariam de uma igual.

Para mim, foi uma boa homenagem ao filme e a homenagem perfeita ao meu pai.