Suspeita de racismo contra Titi e Bless pode ficar impune por lacuna na lei
Os filhos de Giovanna Ewbank e Bruno Gagliasso, Titi e Bless, foram vítimas de racismo em um restaurante em Portugal, onde a família passa férias, na tarde de sábado. A suspeita de racismo pedia que eles e um grupo de angolanos saíssem do local e voltassem para a África, além de chamá-los de "pretos imundos". Após Gagliasso chamar a polícia, a mulher foi levada a uma delegacia, mas liberada na sequência, como informou o jornal português Público.
Os atos da suspeita, no Brasil, poderiam ser enquadrados como injúria racial, ou seja, ofensa à dignidade de alguém, baseado em sua raça, cor, etnia, religião, idade ou deficiência. Mas em Portugal, devido a uma lacuna do Código Penal do país, a situação pode ser diferente.
Em Portugal, o artigo 240 do Código Penal, que trata dos crimes de discriminação e injúria, não cita "ódio racial". A qualificação do crime por motivação de "ódio racial" ou "gerado pela cor, origem étnica ou nacional", está prevista somente para os crimes de homicídio e ofensa à integridade física, analisou o projeto COMBAT.
Somente em setembro de 2021 que foi criado um projeto de lei visando aprimorar as penas para situações de ofensas raciais, segundo o jornal O Globo, com texto da deputada Joacine Katar Moreira.
Em entrevista ao site i, em setembro de 2021, a deputada frisou que Portugal "nega a experiência quotidiana de racismo e teima, frequentemente, em qualificar esta forma de violência, inerente à ordem social e cultural, como uma manifestação de uma 'opinião', de uma atitude interna sem sequelas na vida das suas vítimas".
Em dezembro, a deputada divulgou um vídeo do programa "LEIturas", apresentado por Miriam Sabjaly, que explica a lacuna da lei portuguesa e as suas insuficiências referentes a erradicação da violência racista no artigo 240, que trata da "discriminação e incitamento ao ódio e à violência".
"Os crimes de difamação e injúria não preveem qualquer agravante por ódio racial. O crime de injúria racial não existe no ordenamento jurídico português, ao contrário do que acontece, por exemplo, no Código Penal Brasileiro", disse a apresentadora Miriam. No Código Penal português, a injúria é entendida apenas como "quem injuriar outra pessoa, imputando-lhe fatos, mesmo sob a forma de suspeita, ou dirigindo-lhe palavras, ofensivos da sua honra ou consideração".
"Para que a injúria racial seja enquadrada no Código Penal, podemos olhar o artigo 240º do Código Penal (...) que se refere à discriminação e ao incitamento ao ódio e à violência... No entanto, para que a injúria racial seja crime com base neste artigo do Código Penal, é necessário que a conduta tenha sido tomada publicamente, através de um meio apto à divulgação. Assim, exclui desta norma qualquer conduta que tenha ocorrido entre agressor e vítima, mesmo publicamente, mas que não tenha ocorrido no meio destinado à divulgação, por exemplo à comunicação social. O que significa que a injúria racial só pode ser considerada no Código Penal português em termos muito limitados", completa a apresentadora Miriam.
No mesmo vídeo, o programa "LEIturas" cita que a primeira condenação por discriminação racial em Portugal aconteceu em 2002. De lá para cá, em 20 anos, outras condenações foram "praticamente inexistentes". Quando o artigo de discriminação é aplicado pela corte, a lei prevê até cinco anos de prisão.
Confira o vídeo completo:
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