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Artistas podem ter problema na Justiça por apoiar candidatos no palco?

Pabllo Vittar e Nando Reis já usaram palco para manifestações políticas - Reprodução
Pabllo Vittar e Nando Reis já usaram palco para manifestações políticas Imagem: Reprodução

De Splash, no Rio

01/08/2022 04h00

A pouco mais de dois meses para as eleições de 2022, vários artistas já se manifestaram politicamente em cima dos palcos enquanto se apresentavam. Fato celebrado por parte dos fãs e apoiadores, mas que provoca ameaças de ações na Justiça por grupos contrários às posições dos músicos.

O caso mais recente envolveu após um show da cantora Manu Gavassi em Natal (RN). A artista exibiu uma estrela branca em fundo vermelho durante a apresentação da música "Deve ser horrível dormir sem mim", parceria dela com Gloria Groove. Na canção, Manu canta sobre seus atributos, entre eles um "claro posicionamento político, laço no cabelo e bom senso crítico", trecho escolhido para exibir a estrela.

O MBL (Movimento Brasil Livre) disse ter acionado a cantora na Justiça, acusando-a de promover um "showmício disfarçado". Em março, o PL, partido do presidente Jair Bolsonaro, foi ao TSE (Tribunal Superior Eleitoral) pedir a proibição de manifestações políticas no festival Lollapalooza Brasil, após Pabllo Vittar levantar uma toalha com o rosto do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, candidato do PT à Presidência.

Especialistas ouvidos por Splash avaliam que "showmícios" são, sim, proibidos, mas que os artistas estão resguardados no direito constitucional de se manifestarem, assim como qualquer cidadão brasileiro.

"Artista pode se manifestar dentro da liberdade de expressão garantida a todos os cidadãos pela Constituição Federal. Não há previsão específica na legislação sobre isso, pois esta regula apenas as situações de exceção, ou seja, quando a livre comunicação não é permitida, restrição que se aplicando especialmente para os candidatos e agentes públicos, quando há ampla legislação", explicam Ana Paula Fuliaro, doutora em Direito pela USP e professora da Universidade Católica de Santos, e Alexandre Fidalgo, doutorando em Direito na USP, em parecer enviado ao UOL sobre o tema.

Shows particulares

A legislação brasileira não proíbe manifestação política de qualquer indivíduo, incluídas as de artistas. Por isso, cantores podem emitir suas manifestações em shows próprios, em festivais e nas redes sociais, pois é garantido pela liberdade de expressão prevista na Constituição Federal de 1988.

Vera Chemim, especialista em direito constitucional e mestre em direito público administrativo pela FGV, porém, ressalta que as manifestações em shows particulares não devem envolver "pedido explícito de voto e a menção às qualidades pessoais dos candidatos".

Showmícios proibidos

O que é proibido é a realização de showmícios. Mas o que seria isso?

Os showmícios são apresentações de artistas durante comícios eleitorais, ou seja, dividir um palco entre um show do artista e um comício do candidato.

Esses shows foram proibidos na minirreforma eleitoral de 2006, em acréscimo à lei nº 9.504, de 1997, para buscar igualdade de competição entre candidatos e, em muitas situações, acabar com o abuso de poder econômico.

"O candidato que tem um show em seu comício atrai muito mais eleitores, mesmo que não tenham aderências às suas propostas de início, mas que podem ser impactados por sua mensagem política. De outro lado, aquele que não tem o show não teria a mesma chance de alcance de eleitores", ponderam Fuliaro e Fidalgo.

O STF (Supremo Tribunal Federal) decidiu manter a proibição em discussão realizada em outubro de 2021, incluindo para apresentações de artistas sem cachê. "Conforme se pode depreender da lei mesmo que o showmício seja gratuito, não deixa de configurar uma vantagem econômica de um candidato em face de outro", pensa Chemim.

Shows para arrecadação de cachê

Além disso, o STF também debateu sobre a possibilidade de shows em eventos fechados para arrecadação de recursos. Neste caso, as apresentações artísticas foram permitidas, pois o STF entendeu que o público que vai a um evento fechado já tem aderência ao candidato que o organizou.

"Essas questões eleitorais devem ser analisadas levando em conta o equilíbrio das eleições. Qualquer coisa que beneficia candidatos é vedada. Showmício, mesmo sem o artista ganhar cachê, é igualmente proibido. O resultado é o mesmo. O que é permitido é um show para arrecadar fundos. Porém, penso que esse tipo de show já não pode ser feito depois de iniciada oficialmente a campanha eleitoral", completa Lenio Streck, pós-doutor em Direito e professor de Direito Constitucional.