Miss Brasil Mundo: de jovem com 'doença do silicone' a 2ª trans na história
O Miss Brasil Mundo organizado pelo CNB (Concurso Nacional de Beleza) está em sua 62ª edição com 36 candidatas disputando a coroa em Brasília. A final será amanhã com transmissão ao vivo, após cada representante dos estados e regiões brasileiras passar por provas como talento, entrevista e apresentação de projeto social com o "Beleza Pelo Bem". A vencedora representa o Brasil no Miss Mundo.
Dentre as candidatas, além de modelos há uma jovem que relatou ter tido "doença do silicone" e também uma mulher transgênero. "Desde criança assistia concursos de beleza e ficava desfilando em casa, ficava me imaginando como miss, e ao ver outras mulheres trans ocupando esse espaço vi que era possível chegar lá", fala a Splash Alice Ridenn, servidora pública e Miss Agreste Pernambucano.
Ela enxergou a chance de disputar concursos como o Miss Brasil Mundo ao ver Angela Poncé, mulher trans eleita Miss Espanha, chegar ao Miss Universo 2018. Esta é a segunda edição consecutiva do concurso com uma mulher trans na disputa final. Em 2021, Rayka Vieira representou a região do Centro Goiano, mas não se classificou.
Conheça a seguir três candidatas pré-selecionadas pela reportagem e veja uma galeria de fotos com as representantes de 22 estados e 14 regiões brasileiras.
A miss que teve 'doença do silicone'
Neste ano, a cirurgiã-dentista e Miss Baixada Santista CNB Giovanna Coltro, de 24 anos, ganhou repercussão ao relatar ter tido "doença do silicone" — termo que ainda não tem reconhecimento científico e médico por sociedades de medicina — e expor suas cicatrizes em uma publicação no Instagram. Ela colocou implantes com apenas 18 anos e anos depois precisou retirá-los após complicações.
"Desde muito nova, eu nunca fui contente com o meu corpo, eu sempre tive muita vergonha, porque eu tinha perna muito grossa, eu tinha bumbum grande. [...] Eu não tinha nada de peito, sempre fui muito magra em cima", falou Giovanna a Splash em maio, meses antes de disputar o Miss Brasil Mundo pela segunda vez. "Precisei aceitar que eu realmente estava com essa doença. E não foi fácil o diagnóstico, porque não tem um exame específico para você descobrir a doença de silicone".
Na época, o termo foi explicado por um cirurgião-plástico: "A 'doença do silicone' é um termo com uma tradução livre do inglês do termo 'breast implant illness', utilizado pelo público leigo para se referir a um conjunto de sintomas sistêmicos e inespecíficos, na maioria das vezes auto reportados pelos próprios pacientes", informou o cirurgião-plástico Pedro Soler Coltro, doutor em Cirurgia Clínica e professor da FMRP (Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto) da USP (Universidade de São Paulo).
Pedro também afirmou que a "doença do silicone" não é reconhecida por sociedades médicas e pode ser confundida por outras enfermidades, como a Síndrome ASIA. Na mesma entrevista, Giovanna disse que se sentiu "500% melhor" após retirar os implantes.
Achei que nunca ia participar de concursos de novo. [...] Posso ser uma miss de cabelo curto, sem peito, uma miss que está em lugar de evidência para poder falar com outras mulheres para se conscientizarem com a doença do silicone, essa busca inalcançável por um padrão inatingível no qual a gente fica doente. Vamos parar de ficar doentes, padrão não existe. Padrão é ser feliz do jeito que a gente é Giovanna Coltro, Miss Baixada Santista CNB 2022
'Favela venceu'
Quando venceu o Miss Minas Gerais CNB 2022 em outubro de 2021, a modelo e instrutora de passarela Karina Almeida, 24, fez um forte relato em suas redes sociais, ressaltando sua origem humilde e periférica.
"De onde venho somos conhecidos como burros, sem cultura, sujos, bandidos, favelados. No morro quando gritamos 'favela venceu' significa que um dos nossos chegou no topo, não seguiu outro caminho, e mostrando a todos que na favela também tem talento, força, educação e muito mais. É com muito orgulho que eu grito 'favela venceu'! Essa faixa é sua, é minha, é nossa", escreveu Karina no Instagram.
Moradora da periferia de Belo Horizonte, a mineira escolheu trabalhar neste espaço na etapa "Beleza Pelo Bem" desenvolvendo o projeto "O amor que você semeia" junto com o workshop "Passarela na Comunidade", projeto itinerante em que o foco são comunidades e regiões de periferia em Minas.
"Trabalhamos com palestras de autoconhecimento, aceitação, empoderamento e o principal que é a aula gratuita de passarela. O projeto foi algo que já tinha no meu coração devido ao alto número de crianças e jovens na comunidade que entram para a criminalidade ou acaba não chegando à juventude", explica ela em entrevista a Splash.
Se vencer o concurso, será a primeira mulher negra a ganhar a competição desde Ana Luísa Castro em 2015, que abdicou do título no dia seguinte, pois estava em processo de regularização de casamento com um europeu — pelas regras, a representante não poderia ser casada.
2ª trans na história do concurso
Alice Ridenn alimenta o sonho de ser Miss Brasil desde que participou do Miss Beleza T Brasil em 2021, voltado para mulheres trans, ficando em segundo lugar. Após a primeira experiência, ela decidiu disputar o Miss Pernambuco CNB. Não venceu, mas chegou na etapa nacional como representante do Agreste Pernambucano fazendo história sendo a 2ª mulher trans na final do concurso.
"Escolhi uma franquia voltada para mulheres trans para iniciar a minha trajetória, o que foi muito difícil. Nós não tínhamos apoio, a mídia não dá visibilidade a concursos voltados para nossa comunidade, isso é fato. Para eles é mais interessante noticiar sobre a violência dos nossos corpos, até mesmo as próprias páginas do mundo miss fingem que não existimos", desabafa.
"Hoje eu sei que tenho potencial para representar o Brasil internacionalmente, mesmo com todas as dificuldades cheguei até aqui e me orgulho disso. [...] No Miss Brasil [Mundo] enxergo uma oportunidade de ter mais visibilidade, de fazer com que outras pessoas se inspirem na minha trajetória e me identifico muito com o propósito do concurso", declara a miss.
Como parte importante do concurso, ela desenvolveu no "Beleza Pelo Bem" o projeto "Bora Transformar": "A partir das minhas vivências no meu trabalho na diretoria de direitos humanos da minha cidade vi a necessidade de fortalecimento de vínculos da comunidade LGBTQIA+ para lutarem pelos seus direitos, bem como garantir a cidadania de mulheres trans auxiliando no processo de retificação de nome e gênero".
"Com ajuda de meus amigos consegui expandir o projeto com ações de combate à fome, abuso e exploração sexual de crianças e adolescentes e campanhas de conscientização, por acreditar que a informação é um dos principais caminhos para a mudança positiva da nossa sociedade", explica a estudante de Jornalismo na UEPB (Universidade Estadual da Paraíba) aprovada no Sisu com a nota do Enem (Exame Nacional do Ensino Médio).
Sofri e sofro transfobia todos os dias, dentro e fora das redes sociais. No meio miss não é diferente. Recebo comentários ofensivos que prefiro ignorar, de pessoas que acham que podem ditar onde é o meu lugar, mas estão enganadas. E também tentativas de inviabilizar a minha existência nesse meio, mas estou aqui e irei continuar resistindo e inspirando outras pessoas a lutarem pelos seus sonhos. E prefiro me apegar às pessoas que me admiram porque é isso que importa Alice Ridenn, Miss Agreste Pernambucano CNB 2022
Caso vença o concurso, Alice será a primeira mulher trans a chegar ao Miss Mundo, mais antigo concurso do planeta, em 71 anos de história.
A final do Miss Brasil Mundo será transmitida ao vivo para todo o mundo pelo canal do YouTube do Miss Mundo (Miss World) a partir das 18 horas no horário de Brasília, e das 22 horas no fuso de Londres, onde o concurso é sediado.
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