Tico Santa Cruz rejeita salvador para país: 'Não adianta ter expectativas'

Vocalista do Detonautas, Tico Santa Cruz se afastou das redes sociais após constantes discussões sobre política nos últimos anos. O artista de 44 anos volta a falar sobre o assunto em um novo single da banda, "Não Existe Salvador da Pátria", disponível hoje nas plataformas digitais.

Em conversa com Splash, o músico afirma que a música, gravada em parceria com o grupo Herança Negra, não é uma crítica direta ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) ou ao atual presidente, Jair Bolsonaro (PL), mas sim ao modo como a polarização se desenvolveu no Brasil.

"Temos uma sociedade totalmente desigual. Um sistema político, econômico e social extremamente complexo. Essa transformação não será conduzida por ninguém. Não adianta criar expectativas, pois vão continuar se frustrando. É preciso se organizar coletivamente primeiro", avaliou.

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Pode ser que as duas militâncias interpretem como uma crítica direta. Não é para eles, mas sim para a sociedade que acredita que uma pessoa pode salvar um país com 500 anos de problemas.
Tico Santa Cruz, vocalista do Detonautas

Apesar de evitar a exposição neste momento, Tico afirma que gosta do projeto de governo apresentado por Ciro Gomes (PDT). Segundo o cantor, a discussão de projetos será importante durante o período de campanha eleitoral.

"O principal foco é defender a democracia, deixando um pouco de lado os candidatos e olhando o cenário em que existe uma ameaça real em relação às falas sistemáticas contra instituições democráticas, urna eletrônica e sistema eleitoral. [...] O ódio entre as pessoas é muito perigoso", disse sobre o atual governo.

Críticas a Ciro e Lula

Mesmo após declarar preferência pelas ideias defendidas por Ciro, o músico aponta atitudes que não aprova na postura do candidato. Entre elas, os ataques aos outros candidatos foram citados.

"Não gosto quando ele fala que pode se omitir no segundo turno caso não dispute mesmo contra o governo atual. [...] Espero que ele foque em discutir ideias", disse.

Tico Santa Cruz também comentou sobre as alianças constituídas por Lula, que terá o ex-governador de São Paulo Geraldo Alckmin (PSB) como vice em sua candidatura.

"São altamente questionáveis sobre o que representa, mas na defesa de um estado democrático é preciso entender essa composição. Sou crítico às pessoas aliadas ao Lula, mas se for preciso votar em um segundo turno, votarei nele."

Importância de Anitta

O vocalista do Detonautas afirma que o posicionamento de Anitta, que declarou apoio a Lula em julho, foi fundamental para que outros artistas se sintam seguros para falarem publicamente sobre as eleições.

"Ela dá visibilidade para temas importantes com a humildade de reconhecer que precisa aprender. Ela se coloca à disposição para aprender e falar com embasamento", afirma.

Ele diz manter uma amizade com a cantora e conta que eles já conversaram sobre questões envolvendo política em diferentes situações.

"A única ressalva que fiz foi que ela apoiasse sim um candidato, mas não se associasse a imagem aos partidos políticos. São estruturas importantes para o país, mas pode trazer problemas no futuro quando você atrela a sua imagem sem ser militante".

'Falta de escrúpulo'

Após destacar que também é importante ver os artistas sertanejos se posicionando politicamente, Tico comentou sobre os shows com altos cachês pagos por prefeituras que passaram a ser investigados pelo Ministério Público nos últimos meses.

"O Detonautas faz shows para prefeituras, mas dentro de um bom senso. Cobramos cachês compatíveis com o que a gente representa e a cidade tem a oferecer para a população. É uma total falta de escrúpulo um artista chegar em uma cidade em que está faltando educação, saneamento, moradia e cobrar um cachê estratosférico, transferindo a responsabilidade e dizendo que não sabia de nada", afirma.

Na sequência, ele fez uma referência ao cantor Zé Neto, da dupla com Cristiano. Durante uma apresentação, o sertanejo criticou artistas que se beneficiam da Lei Rouanet, que disponibiliza recursos para incentivar projetos culturais, e ironizou a tatuagem no "tororó" da cantora Anitta.

"Eles sabem da vida de todo mundo, da Lei Rouanet, de quem está aprovando projeto, quem fez tatuagem ou não, mas no momento de receber o dinheiro de uma prefeitura cheia de problemas com a cidade, dizem que não estão sabendo. Está na hora de terem mais responsabilidade com o dinheiro público".

O vocalista cita que a prática só é indevida do ponto de vista moral, pois as prefeituras também são responsáveis pelos altos cachês oferecidos aos artistas seguindo as regras estabelecidas para contratações.

Discussões nas redes sociais

A saúde mental foi um dos principais motivos que levaram Tico a se afastar das redes sociais. O tema também foi motivo de uma discussão pública do músico com Digão, do grupo Raimundos.

"Ajudar entidades e pessoas em vulnerabilidade é mais eficiente do que perder tempo em rede social. A minha vida melhorou muito do ponto de vista mental e emocional quando parei de discutir com pessoas que eu nem sei qual é o propósito."

O artista também afirma que se tornou "alvo" por conta dos constantes posicionamentos políticos. Segundo ele, o comportamento dos seguidores, que não respeitavam o diálogo, pesou na decisão de se afastar do tema.

"Durante muitos anos, fui chamado de 'artista que mamava na teta da Lei Rouanet'. Isso não me abateu, continuei lutando pelo que eu acredito. Mas foram ditas tantas coisas injustas que muitas pessoas, que não me conhecem, podem ter uma visão deturpada da minha vida, do meu trabalho", analisou.