Última peça dirigida por Jô Soares mantém estreia: 'Maior homenagem'
Antes de morrer, Jô preparava a estreia de sua nova peça de teatro. Trata-se de um texto do inglês Patrick Hamilton, adaptado para os cinemas em 1944 pelo diretor Thorold Dickinson, a partir do texto do inglês Patrick Hamilton. O projeto, que já existia desde 2018, está a cerca de um mês da estreia, e agora servirá como homenagem ao diretor.
O ator Giovani Tozi, protagonista da nova montagem, conta que Jô deu todas as diretrizes para o lançamento da obra. Os dois se conheceram em 2012, nos bastidores da peça "Atreva-se" e estavam indo para a terceira montagem juntos dirigidas por Jô. Na história do próximo lançamento, Tozi interpreta um homem que mantém o controle sobre sua mulher ao diminuir as luzes da casa e negar ter percebido qualquer alteração, fazendo com que ela duvide de si mesma.
"Chama-se 'Gaslight', e íamos usar o termo em inglês, com um subtítulo que o Jô mesmo criou, chamado 'Uma Relação Tóxica'. Estávamos namorando o projeto desde 2018, e surgiu de uma sessão de cinema", explica Tozi, em entrevista a Splash.
"O Jô gostava muito de chamar os amigos para um filme, um papo, e em uma dessas noites assistimos a este filme de 1944 e me surgiu a ideia de levá-lo para o palco. Jô, um homem de teatro que adora desafios, topou fazer. E estávamos neste processo", diz o ator, que também faz a direção de arte gráfica dos espetáculos de Jô e trabalhou como seu assistente de direção.
"Ele estava muito animado e já havia passado todos os conceitos de cenografia, seguia trabalhando com a equipe criativa bastante empolgado", recorda.
Sua morte foi um choque muito grande e uma perda gigante para o país. Um cara com a educação, a cultura e a generosidade do Jô, eu acho que vai demorar [a vermos novamente].
Antes do surgimento da pandemia da covid-19, os planos eram de lançar "Gaslight - Uma Relação Tóxica" ainda em 2020. Durante os períodos de isolamento, houve um período de desânimo, mas o ator ressalta que o projeto era muito querido pelo diretor.
"Acho que esse desânimo, se teve, é muito comum para o que todos sentimos durante a pandemia. O Jô viveu muito para o trabalho, um cara do teatro, da comunicação, de escrever. Isso o movimentava muito", reflete. "Imagino que a pandemia trouxe essa imobilidade para todos, mas não é uma característica que reconheço dele. Fiz meu mestrado e faço meu doutorado sobre o Jô, e uma característica forte dele é que ele é um cara extremamente bem-humorado, em tudo o que faz na vida."
Para ele, o humor e a sabedoria serão o legado do amigo.
"Se ele está dirigindo uma tragédia de Shakespeare, ele vai fazer isso com humor, por incrível que pareça", afirma o ator, que foi dirigido por Jô em uma montagem da tragédia shakespeariana "Troilo e Créssida".
"E ele consegue fazer o humor aparecer sempre. Esse clima também está na convivência com ele", continua. " Você pode imaginar o que é se sentar em uma mesa, jantar com o Jô e ouvi-lo contar histórias de pessoas que ajudaram a fundar o teatro brasileiro. É uma pessoa que conviveu com Ruth Escobar, Cacilda Becker, Nelson Rodrigues. Todo contato com o Jô sempre foi, além de uma riqueza inimaginável, muito prazeroso", elogia.
A vida continua
Com a peça pronta para estrear no Teatro Procópio Ferreira, em São Paulo, Tozi diz que não há outra alternativa: o show continua.
"A estreia está marcada para o dia 9 de setembro, e seguimos com esse plano. Mais do que nunca, eu quero estrear essa peça porque é a maior homenagem que podemos fazer a ele, que sempre viu no trabalho árduo a maior dignificação que podemos ter. Ele deu a direção decisiva na condução do trabalho, e agora vamos estrear a peça com a direção que ele já deu."
Mesmo com tantas lembranças boas, o ator diz que sente dificuldade para ter uma memória triste relacionada a uma pessoa como Jô Soares.
Ele sempre teve prazer em fazer o outro rir. Isso é uma memória muito fraterna para mim. E o mais difícil é associar uma pessoa tão alegre a um dia tão triste.
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