Sucesso no BBB, Rafael Portugal teve ajuda para estudar e cachê de 5 reais
"As pessoas passam batido pelo subúrbio". Essa é uma das primeiras frases de Rafael Portugal na série "Coração Suburbano", que estreia hoje na Paramount +. Acostumado a fazer rir, o humorista é o condutor do projeto que nasceu para dar visibilidade a algo que ele conhece bem: as boas histórias que o subúrbio traz.
Rafael nasceu e cresceu em Realengo, na zona oeste do Rio, a 36 quilômetros do centro da cidade. Com poucos recursos financeiros na juventude, acessou a arte por meio de um projeto cultural do bairro. Hoje, é um dos humoristas mais conhecidos do país, fazendo sucesso no teatro, na TV, no streaming e no cinema.
Em bate-papo com Splash, ele conta que aconselha turistas que vão ao seu show de humor no Rio a sair de Copacabana e conhecer bairros do subúrbio, ir à quadra de uma escola de samba, dançar em um baile charme.
"A plateia ri, até quem é do subúrbio. Para as pessoas, o lugar de se visitar está no centro ou na zona sul do Rio, mas a zona oeste e o subúrbio tem muita coisa acontecendo. E o melhor: coisa barata, com manifestação de prazer e alegria", diz.
Rafael pensa que esse imaginário é fruto da falta de visibilidade desses espaços, além deles serem conhecidos apenas pelos problemas como a violência.
"Apesar da dificuldade e não ter acesso a muita coisa, o subúrbio se resolve. [Sempre] tem um professor dando uma aula, quando não é de graça, é muito mais barata e acessível. Foi o que aconteceu comigo quando fiz parte da lona cultural de Realengo. Não tinha dinheiro para fazer um curso, a lona cultural custava R$ 20. Mesmo assim, eu pagava com dificuldade esse dinheiro que saía do salário da minha mãe", lembra.
Salvou a minha vida. Ali, eu fiz teatro. Depois, fui convidado para uma companhia. A gente fazia as apresentações nas ruas. O subúrbio do Rio é muito rico e as pessoas precisam visitar.
Rafael Portugal
"Na arte, na música, no futebol... Essa gente vem do subúrbio, né? A Anitta, que representa tão bem o Brasil lá fora, é de Honório Gurgel. A feira de Honório Gurgel é um show à parte. Você vai comprar algo para o almoço do final de semana, mas também comer pastel, tomar um caldo de cana, rir, fofocar."
Rafael recorda que seu primeiro "salário" no teatro foi apenas R$ 5. O valor do cachê foi pequeno, mas simbólico para sua trajetória.
"Eu ganhei R$ 5 fazendo espetáculo infantil na Quinta da Boa Vista (zona norte do Rio). Para mim, foi de uma importância gigantesca. Era meu primeiro salário como ator, sabe? É pouco, mas é muito grande ao mesmo tempo", conta.
No entanto, o primeiro dinheiro que ele ganhou por meio da arte não foi com o teatro, mas sim com a música. Há cerca de 15 anos, ainda jovem, ele escrevia músicas românticas em Realengo, diferente das engraçadinhas que escreve para o "Domingão com Huck".
"O primeiro dinheiro que eu ganho na arte foi com música. Eu compus uma música chamada 'João de Barro', que tive o privilégio de ser interpretada no DVD da Maria Gadú (em 2010)... Tem um tempo que eu não componho, mas compus muita música voltando de ônibus ou sentado no trem. É impressionante, ali era uma fonte de inspiração absurda. Era música romântica. Fiz as primeiras às três da manhã", diz.
Seu parceiro de composição em "João de Barro" foi Leandro Leo, ator que fez o Pesadelo do "Sítio do Picapau Amarelo" entre 2002 e 2005. Eles se conheceram em um ponto de ônibus do bairro, quando Rafael pediu o telefone emprestado para fazer uma ligação à mãe. Naquele momento, Leandro o convidou a assistir sua apresentação na zona sul.
"Chego em casa e falo: 'mãe, conheci um ator hoje, queria muito encontrar com ele'. Minha mãe arrumou um dinheiro de passagem emprestado com um vizinho. Minha vida foi muito a minha mãe pedir dinheiro emprestado, as pessoas em volta acreditarem muito em mim. O dinheiro emprestado era para passagem para encontrar o Leo e eu estar no meio, conhecer, tentar uma oportunidade", recorda.
As coisas foram acontecer comigo 10, 15 anos depois de estar no meio de muita gente legal.
"Coração Suburbano"
Idealizada por Rafael, a série tem seis episódios e mistura a linguagem de documentário e ficção para mostrar o que há de especial nos bairros do subúrbio do Rio, São Paulo e Minas Gerais. Cada episódio, ele visita um lugar e recebe convidados famosos e anônimos, como Tia Surica, L7nnon, Negra Li e Evandro Fioti.
Para ele, é o trabalho mais diferente da carreira. "Eu sou humorista e as pessoas esperam que eu seja engraçado, mas vai além da graça, do sorrir, porque vem histórias, sabe? Quando é história da vida do outro, tem algum momento triste e de superação. Também emociona... Eu chorei nesse programa", conta.
Todo subúrbio, claro, traz boas histórias. Rafael conta que não foi diferente nas gravações da série. Ele lembra de um dia de gravação em Madureira, no subúrbio do Rio, quando foi abordado por um fã usando tornozeleira eletrônica.
"Muita gente passa pelo subúrbio o tempo inteiro. Mas Madureira, em especial, tem uma passarela que trava todo ano, próximo do Natal e do Dia das Mães... Eu estava gravando nessa passarela, passou um menino por mim [e disse] 'pô, meu irmão, adoro o teu trabalho'. O moleque estava com a tornozeleira. Ele falando: 'porr*, meu irmão, vou te falar: agora tô aí, tô em liberdade graças a Deus, me amarro no teu trabalho, comé que cê tá? Tranquilão parceiro?", diz ele, aos risos.
Atualmente, além da nova série, Rafael marca presença no "Domingão com Huck" e está prestes a estrear a 12ª temporada de 'A Culpa é do Cabral". Apesar de estar consolidado, ele conta que ainda é inseguro e prefere não assistir os programas que faz.
"Se alguém filma algo do meu show, eu não gosto muito. Eu me cobro de algumas coisas... Deixo o filtro do povo falando, do que a minha empresária acha e vou colocando. O Luciano (Huck) me fala, os meninos do 'A Culpa É Do Cabral' é a mesma coisa, eles me mandam vídeos, mas tenho muita aflição de me assistir, fico me julgando", revela.
Rumos políticos
Em um ano eleitoral, falar de política se torna um assunto comum nas conversas em toda a cidade. Apesar de não abordar o tema em seus shows ou programas de TV, Rafael diz que as pessoas precisam se manifestar e acredita na força do subúrbio para mudar a realidade do país.
Quem é do subúrbio, entendeu o que precisa fazer. O que tem sido dito hoje não faz parte da nossa verdade e realidade. A gente anda de ônibus, anda a pé, não tem moto para ficar encontrando com o outro. De alguma maneira, o subúrbio sai vencendo nessa loucura que a gente tem vivido. A gente tem que manifestar.
"Mas eu não falo de política no meu show porque sinto que as pessoas tiram aquela hora para esquecer de toda a loucura, não falo da pandemia, não falo de muita coisa... Mas sinto que meu público sabe quem sou, de onde vim, qual é a minha verdade. Não tem como ser diferente", continua.
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