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Programa que lançou Roberto Jefferson exibia de charlatanismo a bebê morto

Roberto Jefferson (direita) e a equipe de "O Povo na TV". Sérgio Mallandro e Chistina Rocha aparecem ao lado do ex-deputado federal - Reprodução
Roberto Jefferson (direita) e a equipe de "O Povo na TV". Sérgio Mallandro e Chistina Rocha aparecem ao lado do ex-deputado federal Imagem: Reprodução

De Splash, em São Paulo

25/10/2022 04h00

O ex-deputado federal Roberto Jefferson (PTB), indiciado pela Polícia Federal por quatro tentativas de homicídio durante operação realizada no último domingo (23), foi apresentador de TV no início dos anos 1980, antes de assumir mandatos na política.

O apoiador do presidente Jair Bolsonaro (PL) foi um dos comandantes do programa "O Povo na TV", da então TVS, emissora fundada por Silvio Santos que é o atual SBT.

O político apresentou a atração, que permaneceu no ar entre 1981 e 1984, ao lado de outros nomes famosos, como Sérgio Mallandro, Wagner Montes — que morreu em 2019 — e Christina Rocha, destaque no comando do programa "Casos de Família" (SBT) quase três décadas depois.

Inspirado no "Aqui e Agora" (1979) — atração da TV Tupi que também contava com participações de Roberto Jefferson —, o programa "O Povo na TV" se destacava por trazer casos polêmicos, mas ficou marcado pela morte de uma bebê nos estúdios e acusações de charlatanismo.

'O Povo na TV' (1982) com Sérgio Mallandro - Francisco Rosa / SBT - Francisco Rosa / SBT
'O Povo na TV' (1982) com Sérgio Mallandro
Imagem: Francisco Rosa / SBT

A história de Danúbia

O jornal Folha de S.Paulo relatou, em dezembro de 1982, que uma mãe procurou "O Povo na TV" após sua filha Danúbia, de nove meses, ser diagnosticada com um câncer nos olhos. Ela não conseguiu tratamento mesmo após procurar dezenas de hospitais do Rio de Janeiro.

A mãe e o bebê, que nasceu prematuro após sete meses de gestação, esperaram por duas horas nos bastidores até serem chamadas ao palco.

A atração mostrava imagens da criança, que sangrava pelos olhos devido a um inchaço grave. Ao lado de figuras que iniciavam a carreira, Wagner Montes, principal nome da atração, pedia a ajuda das autoridades para conseguir um tratamento.

Danúbia morreu após permanecer no palco por 40 minutos. O corpo da criança foi levado ao IML (Instituto Médico Legal), mas o programa não foi interrompido mesmo após a confirmação da morte.

Wagner Montes no programa "O Povo na TV", no SBT - Erasmo Dias - Erasmo Dias
Wagner Montes no programa "O Povo na TV", no SBT
Imagem: Erasmo Dias

'Cirurgia espiritual' ao vivo

O programa enfrentou acusações de charlatanismo em 1983, relatou o jornal O Globo na época. Roberto Lengruber, que se apresentava como "curandeiro", mantinha um quadro no programa e prometia a cura para pessoas que acompanhavam a atração na plateia.

O programa também mostrava o curandeiro realizando "cirurgias espirituais" e oferecendo orientações, o que chamou a atenção de associações ligadas à medicina.

Roberto Lengruber e Wilton Franco, que passou a integrar o time de apresentadores, foram indiciados na Justiça por "lesar grande número de pessoas", mas responderam ao processo em liberdade.

Segundo o relato, o "curandeiro" atendia às pessoas que o procuravam nos estúdios em uma ordem definida pela produção. Os casos mais graves identificados por Roberto Lengruber eram levados ao programa com orientações prévias sobre o que o participante deveria dizer.

Depois da TV

O sucesso de "O Povo na TV" ajudou Roberto Jefferson a se eleger deputado federal pela primeira vez em 1982. Ele se tornou o mais votado do PTB (Partido Trabalhista Brasileiro) com 84 mil votos, segundo dados do CPDOC (Centro de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea do Brasil), da Fundação Getúlio Vargas.

O ex-apresentador foi eleito para o cargo em outras seis oportunidades. Ele também concorreu ao posto de prefeito do Rio de Janeiro em 1988, mas obteve menos de 3% dos votos e perdeu a disputa para Marcello Alencar (PDT).

Com quase quatro décadas de carreira política, Roberto Jefferson também foi presidente do PTB e um dos 38 deputados que não concordaram com o impeachment de Fernando Collor de Mello em 1992.

Ele se tornou famoso por ser um dos delatores do "Mensalão" em 2005. Após admitir ter recebido R$ 4 milhões, Jefferson foi condenado a sete anos de prisão em 2012 por participar do esquema de corrupção.

Nos últimos anos, o ex-deputado federal defendeu pautas de extrema-direita, sendo acusado de atacar o STF (Supremo Tribunal Federal) e disseminar notícias falsas.