Nova música de Paulo Ricardo foi vetada em rádios: 'É a censura da grana'
Quando compôs "Herói Made in Brazil", Paulo Ricardo sabia que estava mexendo num vespeiro. Ainda assim, ficou espantado com as reações à sua música, lançada em meio à turbulência do processo eleitoral.
Em conversa com Zeca Camargo no "Splash Entrevista" desta semana, o músico disse que a composição se impôs pelo momento atual do Brasil. A inspiração veio depois que ele assistiu, espantado, às manifestações golpistas do 7 de Setembro de 2021.
"A gente chegou num momento em que várias facetas do que é ser brasileiro estão se conflitando", disse. "A gente não tinha essa cultura de haters. Isso é muito recente."
Com essa música aconteceu comigo algo que eu ainda não tinha vivenciado: tive a música vetada em rádios. Não pelo valor artístico, mas por uma questão política.
"Havia um respeito em relação às diferenças de ideia. Esse pensamento antagônico que se transforma em ódio é que não existia", lamentou. "Me vi diante da realidade de rádios que são concessões a grupos políticos e oligárquicos. E vetaram a música."
Mas não foi uma censura como nos anos 1960 e 70. Foi uma censura política e econồmica. É a censura da grana.
'Hora de vomitar o que está engasgado'
"Herói Made In Brasil" é um rock político como há muito tempo Paulo Ricardo não compunha. "É pop, mas super atual. Acho que com ela você celebra o ciclo de uma nova inspiração", observou Zeca.
Com a música, que traz versos duros como "Somos filhos de Macunaíma / Sem caráter, sem vacina, sem vergonha e sem fuzil", o músico quis desabafar a partir do que tem visto acontecer com o Brasil nos últimos anos.
"Comecei falando de política nos anos 1980. Vínhamos de uma ditadura, vivíamos as Diretas Já, a transição para a democracia. Era inevitável falar disso", contou. "Ao longo da carreira fui mudando o foco e falando de outras coisas." O que mudou?
Agora é hora de vomitar algumas coisas que estão engasgadas. Chegamos num ponto em que olhamos para trás e vemos o legado da nossa geração [ser destruído]. Dá uma certa aflição e frustração.
Mas também vontade de mudar as coisas, como nos anos 80. "Também tem uma esperança. Porque ainda tem muito a se fazer."
'Não dá para ficar no muro agora'
Apesar das dificuldades que tem enfrentado para emplacar a música nas rádios, Paulo Ricardo não está arrependido de sua contundência. Ao contrário, acredita que o momento pede exatamente isso.
Eu sempre tento fazer letras com uma visão poética. Mas não dá pra ficar no muro agora. A gente tem que se posicionar.
O compositor reafirmou, para Zeca, o compromisso social que, em sua visão, todo artista deve ter. "Como Caetano já definiu, faz parte da beleza da visão artistica almejar o luxo para todos. A gente precisa olhar por essa enorme massa de injustiçados e famintos", disse.
A gente vê o mundo de uma forma humanista. Utopias e ideologias à parte, é uma visão de mundo poética, de amor, quase religiosa. E colocar isso de maneira pertinente numa canção, sem politicagem, é o grande trabalho.
'Mick Jagger é um péssimo exemplo'
Na década de 1980, o RPM, a banda que Paulo Ricardo montou em São Paulo se tornou um dos maiores fenômenos pop do Brasil. Lotou shows, vendeu milhões de discos e fez do músico e jornalista um ícone jovem e símbolo sexual.
Agora, aos 60 anos, ele diz ter enfim encontrado a maturidade - e não poderia estar mais feliz. "Essa maturidade é de temer ou deabraçar?", perguntou Zeca.
"É de abraçar, de beijar na boca de língua!", brincou Paulo Ricardo. "Esperei por ela ansiosamente e achei que nunca viria." A culpa é do rolling stone Mick Jagger, de 79 anos.
O rock te empurra um pouco pra essa síndrome de Peter Pan. A gente quer permanecer garoto e o Jagger é um péssimo exemplo pra isso, porque ele consegue!
Livre das garras de Mick, Paulo Ricardo só tem visto vantagens na maturidade. "Ela te traz essa tranquilidade de finalmente saber o que se tem que fazer, e fazer com prazer, com tesão, sem distrações."
Você já se distraiu, já errou, já fez gol contra. A maturidade te dá um foco que é uma coisa maravilhosa. Estou felicíssimo com isso.
Splash Entrevista
Apresentado por Zeca Camargo, o programa recebe artistas e celebridades para um papo sincero sobre vida e carreira. Os episódios são disponibilizados toda quarta, a partir das 10h, no canal de Splash no YouTube e no UOL.
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