"Também tenho uma Fernanda aqui em casa. E eu a amo muito." Essa foi a primeira coisa que Erasmo Carlos me disse quando, em junho de 2021, liguei para sua casa, no Rio de Janeiro, para uma entrevista. O músico se referia à Fernanda Passos, sua esposa 49 anos mais nova, com quem eu tinha falado momentos antes.
A conversa entre Fernandas não se estendeu por muito tempo. Apenas o trivial: ela atendeu ao telefone, me apresentei e minha xará disse: "Claro, ele está te esperando". Ao chamá-lo, o primeiro sinal de carinho. "Vido, é a jornalista", disse se referindo ao esposo com uma espécie de neologismo de "vida" no masculino.
Mesmo com o foco em sua obra, as menções à esposa não ficaram apenas no começo da conversa. Ao longo de meia hora, Erasmo falou sobre as mais de cinco décadas de carreira, mas o assunto principal era a paixão. Sempre que podia, dizia como, mesmo aos 80 anos, vivia um grande amor.
"Fernanda me faz bem", ele disse em dado momento. "É o nome!", brinquei, esperando uma reação positiva do cantor. "Aposto que sim", respondeu simpático.
Empolgado por estar vacinado contra a covid-19, o músico não via a hora de voltar a fazer shows e poder sair para passear com a sua amada. Tudo parecia, de uma maneira ou outra, circular em volta da esposa.
Casados desde 2019, Fernanda Passos tem 32 anos e nunca pareceu se incomodar com a diferença de idade entre os dois. A pedagoga não tem vergonha de falar ser apaixonada desde pequena por Erasmo.
A conversa com o músico foi encomendada por uma empresa que me fez assinar contrato de confidencialidade, e era para falar sobre os cinquenta anos de "Carlos, Erasmo", disco lançado em 1971 e considerado um de seus álbuns mais cultuados.
À época, já trabalhava há três anos com entretenimento e falar com nomes importantes da música brasileira já tinha se tornado algo corriqueiro, por isso, não me causava mais tanto nervosismo. Até surgir a oportunidade de falar com Tremendão. A entrevista já tinha sido adiada uma vez, pois Erasmo tinha 80 anos e às vezes era difícil para ele.
Confesso que quando fui avisada de que ainda demoraria um tempo para acontecer a conversa, fiquei aliviada: poderia me preparar ainda mais. Lembro que, de artistas brasileiros, apenas Gal Costa tinha me deixado tão desestabilizada.
Estudei a vida e a obra de Erasmo, escrevi diversas perguntas, treinei em voz alta com o meu namorado. Fiz tudo o que pude, mas a calma e humildade do roqueiro me mostraram que nada daquilo era preciso.
Ao final, me disse: "Fernanda, apareça no meu show! Quem sabe as Fernandas não se conhecem?".
Não deu, Erasmo. Desculpa.
Erasmo Carlos morreu nesta terça-feira, aos 81 anos. Mesmo com a idade, Tremendão falava de amor e paixão como um adolescente. Vai ser assim que sempre lembrarei dele, como um eterno apaixonado, que não conseguia nem mesmo falar de seu trabalho sem citar o sentimento mais bonito que alguém pode ter por outra pessoa.
ID: {{comments.info.id}}
URL: {{comments.info.url}}
Ocorreu um erro ao carregar os comentários.
Por favor, tente novamente mais tarde.
{{comments.total}} Comentário
{{comments.total}} Comentários
Seja o primeiro a comentar
Essa discussão está encerrada
Não é possivel enviar novos comentários.
Essa área é exclusiva para você, assinante, ler e comentar.
Só assinantes do UOL podem comentar
Ainda não é assinante? Assine já.
Se você já é assinante do UOL, faça seu login.
O autor da mensagem, e não o UOL, é o responsável pelo comentário. Reserve um tempo para ler as Regras de Uso para comentários.