Vai na Fé descarta rótulo de novela evangélica e mistura religião com funk
"Vai na Fé" estreia hoje na Globo e traz uma mocinha evangélica no centro da narrativa, mas isso não faz da trama uma "novela evangélica" como muitos podem pensar. É o que afirma a autora do folhetim, Rosane Svartman, em conversa exclusiva a Splash.
É um traço importante da personalidade da protagonista Sol (Sheron Menezzes) e de sua família, mas não é o tema central da história. Sol se tornará dançarina de Lui Lorenzo (José Loreto), um cantor de funk em decadência, para sustentar a família, mas sem perder a religiosidade.
Sendo a fé o valor número 1 do brasileiro, como dizem as pesquisas, seria natural uma personagem ter fé. Isso não faz a novela ser evangélica.
Em 2019, a autora já tinha escrito outra personagem religiosa, a Paloma de "Bom Sucesso", interpretada por Grazi Massafera. "Ela falava diariamente com a santa na praça, ela ia para a Igreja, falava com o padre Paulo — tínhamos consultoria para escrever com todo o carinho — e era uma novela católica? Não", reflete.
Mas por que a trama ganhou fama de "novela evangélica" mesmo sem ser divulgada dessa forma? A autora reflete sobre a pergunta, mas não chega a uma resposta de imediato.
"É a empresa? É uma tendência? Não sei, mas eu fiquei surpresa. Dá aquela coceira para responder, mas é melhor esperar começar a própria novela. Me pergunto: por que isso chama tanta atenção? São várias respostas, mas uma delas é ser um tema que a sociedade quer conversar. É um tema latente, ótimo para estar numa novela".
O que Rosane promete é uma trama das 7 com "um pouco de tudo": drama, aventura e comédia. Além disso, é bastante musical ao trazer José Loreto como um cantor sedutor.
"Nesse horário, as casas têm um movimento dinâmico. Gente chegando, outras saindo. A novela tem que ter ritmo... Se você parar e olhar, todas as novelas das sete ultimamente tem drama e humor como a nossa vida. A gente está rindo agora, mas depois está melancólico."
Vidas reais
A novela das 7 é uma trama contemporânea e inspirada na vida de brasileiros reais. A autora teve a ideia de escrever uma protagonista evangélica após analisar a ficha de pessoas que contribuíam com os grupos focais de "Bom Sucesso". "A cada 10 pessoas, de 4 a 6 botavam que eram evangélicas", lembra.
Não é à toa que a trama tem a palavra "fé" no título. Antes se chamaria "Segunda Chance", mas em uma reunião com a equipe, uma pessoa sugeriu o nome "Vai na Fé", o que também agradou à emissora.
Mas as inspirações para criar a Sol não pararam por aí. A cantora Negra Li, uma mulher negra, periférica e cantora, é uma das entrevistas para a criação da protagonista. Pessoas anônimas e consultores também foram ouvidos.
"O marido de Sol, o Carlão, perdeu o emprego durante a pandemia. Ela está sustentando a casa hoje, vendendo quentinha, sendo uma empreendedora. A gente está vendo as pessoas se virando de alguma forma, mas as contas não fecham. São dramas cotidianos do brasileiro. A conta de luz que vai bater três meses sem pagamento e pode ser cortada"
Assuntos contemporâneos fazem parte da história. "A família de Sol é multigeracional, tem vários olhares. A Jeni (Bella Campos) é a primeira da família a entrar para a faculdade como bolsista em uma universidade privada. Oportunidade para discutir meritocracia e privilégio, além de assuntos da juventude", diz.
Dentre outros temas, o ator Samuel de Assis vive Ben, um advogado bem-sucedido e casado com Lumiar (Carolina Dieckmann), carrega o debate do que "é justo ou não" e discute "para que e para quem serve a justiça no país".
"Além disso, ele está descobrindo o que é ser negro no Brasil. Ben é uma ilha, é um homem preto, mas criado no mundo de brancos. Agora, ele entra no conflito de não querer defender mais os colarinhos brancos. Ele vê a realidade: a gente está sempre ameaçado por ser preto", conta Samuel, em entrevista a Splash.
Já Regiane Alves interpreta Clara, uma mulher na faixa dos 40 anos que vive um relacionamento abusivo com o corrupto Theo (Emilio Dantas). "Tem muita inspiração nas próprias notícias. Vemos várias denúncias de mulheres que sofrem assédio. É uma personagem que vai representar essas mulheres", disse a atriz em recente entrevista.
Recepção do público
"Vai na Fé" estreia em um momento de crise de audiência. As duas últimas tramas, Cara e Coragem e Quanto Mais Vida Melhor, têm as menores audiências da história das novelas das 7.
"Fazer uma história para agradar é muito difícil. Se tivesse uma fórmula, um algoritmo... Tenho que contar a melhor história que eu possa e ter fé que as pessoas vão querer vê-la. Minha maior estratégia é ter escuta no momento de criação", diz Rosane.
Além disso, enfrenta a resistência de alguns evangélicos que temem a maneira que serão representados na tela e outros, aliados a um setor mais radical e ideológico politicamente, que protestam contra a emissora.
"A gente está fazendo com carinho e respeito. Não queremos ofender ninguém. É o espectador que vai olhar o conteúdo, se identificar ou não... Como contadora de história, quero que o telespectador crie uma ponte de empatia com sua própria história, curta, possa fantasiar, escapar um pouquinho da realidade, além de refletir sobre a realidade."
Quem observa quem? É o espectador que assiste à TV ou à TV, principalmente em uma obra aberta, que observa esse espectador, essa sociedade, para conversar, para trocar.
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